Partitas para teclado de Bach
Lothar Hoffmann-Erbrecht
Johann Sebastian Bach só veio a defrontar-se com a suíte para teclado num estágio relativamente tardio, por volta de 1720, quando encontrava-se em Cöthen. A razão superficial para lançar-se ao empreendimento pode ter sido o ensino de cravo que ministrava aos seus dois filhos mais velhos, Wilhelm Friedemann e Carl Philipp Emanuel. Os primeiros frutos do seu trabalho nesse campo foram as suítes denominadas “inglesas” e “francesas”, que foram provavelmente concluídas em 1723. Bach pode ter começado a trabalhar nas partitas logo em seguida, sofrendo sem dúvida muitas interrupções. Apesar de elas não estarem absolutamente completas, se comparadas às versões definitivas, e de trazerem algumas vezes denominações diferentes nos movimentos, ele incluiu pessoalmente as Partitas Nos. 3 e 6 como Nos. 1 e 2 no segundo caderno de música de sua esposa Anna Magdalena, de 1725. A composição de todas as seis partitas foi concluída no máximo em 1730, se não antes. Como bom pai de família e administrador prudente, ele as fez publicar isoladamente, às suas próprias expensas, com intervalo de um ano entre uma e outra. A Partita No. 1 foi ao mesmo tempo a primeira composição que o músico, então com quarenta e um anos, liberou para publicação. Verificando que a edição em fascículos isolados havia conquistado o favor do público, Bach reuniu, em 1731, todas as seis sob o título Exercícios para teclado (Klavierübung) consistindo de Prelúdios, Allemandes, Courantes, Sarabandes, Gigues, Minuets, e outras galanterias..., Opus I. Publicado pelo compositor. (...)
As Seis Partitas BWV 825-830, a terceira e última compilação de suítes, são seguramente o produto mais maduro de Bach nesse campo. Sua energia estrutural, riqueza de idéias e a beleza sonora da sua escritura para teclado são de uma perfeição quase insuperável. Apesar de manterem o esquema fundamental da suíte alemã, na base dos quatro movimentos habituais – Allemande, Courante, Sarabande e Gigue – elas assumem liberdades espantosas na forma. Bach não somente introduz cada Partita com um movimento de abertura de caráter sempre diversificado – nas Suítes Inglesas ele ainda denominava esses movimentos uniformemente de Prelúdios –, mas também incorpora, juntamente com as “galanterias”, tão apreciadas então, peças características que não seguem nenhum ritmo de dança. (...)
No catálogo de Breitkopf, de 1790, o “Klavierübung” de Bach aparece sob o título 6 Partite Tedesche (6 Partitas Alemãs). Em sua grandiosa síntese estilística, essas suítes são indubitavelmente “alemãs”. Da mesma forma, “Partita” – o nome italiano para suíte – também não deixa de ter fundamento, já que nessa obra Bach declara-se claramente a favor de uma escrita de tipo italiano. Na Partita No. 1, por exemplo, a viva Giga (assim na denominação original) emprega a técnica das mãos cruzadas e superpostas, da qual valeu-se muitas vezes anteriormente Domenico Scarlatti, e chega a incluir as oitavas de baixo, que Bach costuma cuidadosamente evitar. (...)
Construídas com suprema arte, as Partitas de Bach marcam o ponto culminante e final de um longo processo de desenvolvimento. Nelas, a história das suítes para teclado alemãs encontra seu termo. Somente Johann Ludwig Krebs, um talentoso discípulo de Bach, arriscou-se uma vez com uma série de Exercícios para teclado, constituído de 6 Partitas – com algumas indiscutíveis reminiscências. Dos filhos de Bach, apenas Friedemann escreveu uma suíte, no início da carreira, enquanto Carl Philipp Emanuel consagrava-se inteiramente às sonatas. A suíte ficou fora de moda. Foi prerrogativa do seu pai a honra de dignificar uma última vez, com toda a sua originalidade, uma forma que já havia perdido a popularidade.
Fonte: capa do álbum duplo The 6 Partitas BWV 825-830 (1986), com Jean Louis Steuerman.
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