13 março 2020

Estrofes do solitário


Basta de covardia! A hora soa...
Voz ignota e fatídica revoa,
     Que vem... D’onde? De Deus.
A nova geração rompe da terra,
E, qual Minerva armada para a guerra,
     Pega a espada... olha os céus.

Sim, de longe, das raias do futuro,
Parte um grito, pr’a – os homens surdo, obscuro
     Mas para – os moços, não!
É que, em meio das lutas da cidade,
Não ouvis o clarim da Eternidade,
     Que troa n’amplidão!

Quando as praias se ocultam na neblina,
E como a garça, abrindo a asa latina,
     Corre a barca no mar,
Se então sem freios se despenha o norte,
É impossível – parar... volver – é morte...
     Só lhe resta marchar.

E o povo é como – a barca em plenas vagas,
A tirania – é o tremendal das plagas,
     O porvir – a amplidão.
Homens! Esta lufada que rebenta
É o furor da mais lôbrega tormenta...
     – Ruge a revolução!

E vós cruzais os braços... Covardia!
E murmurais com fera hipocrisia:
     – É preciso esperar...
Esperar? Mas o quê? Que a populaça
Este vento que os tronos despedaça,
     Venha abismos cavar?

Ou quereis, como o sátrapa arrogante,
Que o porvir, n’antessala, espere o instante
     Em que o deixeis subir?!
Oh! parai a avalanche, o sol, os ventos,
O oceano, o condor, os elementos...
     Porém nunca o porvir!

Meu Deus! Da negra lenda que se inscreve
Co’o sangue de um Luís, no chão da Gréve,
     Não resta mais um som!...
Em vão nos deste, p’ra maior lembrança,
Do mundo – a Europa, mas d’Europa – a França.
     Mas da França – um Bourbon!

Desvario das frontes coroadas!
Na página das púrpuras rasgadas
     Ninguém mais estudou!
E no sulco do tempo, embalde dorme
A cabeça dos reis – semente enorme
     Que a multidão plantou!...

No entanto fora belo nesta idade
Desfraldar o estandarte da igualdade,
     De Byron ser o irmão...
E pródigo – a esta Grécia brasileira,
Legar no testamento – uma bandeira,
     E ao mundo – uma nação.

Soltar ao vento a inspiração de Graco
Envolver-se no manto de ’Spartaco,
     Dos servos entre a grei;
Lincoln – o Lázaro acordar de novo,
E da tumba da ignomínia erguer um povo,
     Fazer de um verme – um rei!

Depois morrer... que a vida está completa,
– Rei ou tribuno, César ou poeta,
     Que mais quereis depois?
Basta escutar, do fundo lá da cova,
Dançar em vossa lousa a raça nova
     Libertada por vós ...

Fonte: Alves, C. 1990. Poemas, 8ª edição. RJ, Agir. Poema publicado em livro em 1883.

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