A vida sem princípio
Henry David Thoreau
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Vamos pensar sobre a maneira como vivemos nossas vidas.
Esse mundo é um império dos negócios. Que agitação interminável! Quase toda noite sou acordado pelo chiado da locomotiva. Meus sonhos são interrompidos. Os dias de descanso simplesmente não existem. Seria glorioso ver uma única vez a humanidade desocupada. Só há trabalho, trabalho, trabalho. É difícil conseguir um caderno de folhas lisas para registrar meus pensamentos, quase todos são pautados para facilitar a contabilidade de dólares e centavos. Certa vez estava tomando notas no campo, e um irlandês imaginou que eu estava calculando meu pagamento. Se um homem fica aleijado para toda a vida por ter sido jogado de uma janela quando ainda criança, ou se um outro enlouquece de medo dos indígenas, lamenta-se a sorte de ambos principalmente por terem ficado incapazes... para os negócios! Creio que nada, nem mesmo o crime, se opõe mais à poesia, à filosofia e, acima de tudo, à vida, do que essa incessante movimentação dos negócios.
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A maioria dos homens se consideraria insultada se recebesse uma proposta para se ocupar de atirar pedras por cima de um muro e, depois, atirá-las de volta ao lugar de origem, apenas para ganhar seu salário. No entanto, há muitos homens que atualmente não têm empregos mais úteis do que esse.
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Com pouquíssimas exceções, as formas de ganhar dinheiro são todas degradantes. Se você fez alguma coisa pela qual recebeu apenas dinheiro, aí então você foi vadio de verdade, ou algo pior ainda. [...] A comunidade está mais ansiosa por remunerar os serviços que são mais desagradáveis de executar. Você acaba sendo pago para ser algo menos que um homem. O Estado, em geral, é também incapaz de premiar mais sabiamente o trabalho de qualidade. Até mesmo o poeta laureado prefere cantar outras coisas que não as crônicas da realeza. É preciso suborná-lo com uma pipa de vinho, e pode ser que um outro poeta abandone sua musa para disputar essa mesma pipa.
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Fonte: Thoreau, H. 1986. Desobedecendo: a desobediência civil & outros ensaios, 2a edição. RJ, Rocco. Artigo originalmente publicado em 1863.
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