Um pioneiro no estudo da Terra pré-biótica
Felipe A. P. L. Costa
O químico norte-americano Stanley Lloyd Miller (1930-2007), falecido em maio último, aos 77 anos, foi um pioneiro no estudo experimental das origens da vida. [...]
O ponto de partida para o experimento – hoje amplamente citado nos livros-texto como experimento de Miller-Urey, embora a autoria do artigo original seja apenas de Miller, como se verá a seguir – seria a construção de um microcosmo que pudesse, até certo ponto, mimetizar em laboratório as condições da Terra pré-biótica. O aparato construído era relativamente simples, sendo formado por duas esferas de vidro (uma menor, capaz de armazenar cerca de 0,5 litro de água, e a outra maior, com capacidade para 5 litros) conectadas entre si por um sistema de tubos.
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O aparato foi então posto para funcionar ininterruptamente durante uma semana. Ao fim desse período, o líquido acumulado na esfera menor foi examinado. Para surpresa geral, os testes revelaram a presença de mais de uma dúzia de substâncias orgânicas relativamente complexas, incluindo aminoácidos (glicina e alanina), matéria-prima para a construção de proteínas.
Química pré-biótica
O impacto e a importância desses resultados foram enormes. A razão para isso tem a ver com o seguinte: o líquido obtido não era simplesmente uma mistura aleatória de compostos químicos simples – e milhares desses compostos poderiam ter sido formados a partir da matéria-prima utilizada. O fato de que foram encontrados aminoácidos – e outras moléculas orgânicas complexas – em quantidades expressivas sustenta a hipótese de que a síntese desses compostos seria possível a partir dos gases presentes na atmosfera pré-biótica (rica supostamente em metano, amônia, hidrogênio e água, ao invés de dióxido de carbono, nitrogênio, oxigênio e água, como ocorre com a atmosfera atual), mas também levanta a suspeita de que eles seriam relativamente abundantes nos oceanos primitivos.
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O experimento de Miller-Urey despertou a imaginação e estimulou o trabalho de outros pesquisadores mundo afora, a ponto de ser referido hoje como um marco no estudo experimental das origens da vida. Ao longo dos anos, o experimento foi refeito inúmeras vezes, usando-se variadas combinações de gases e fontes de energia. Os resultados com freqüência incluíam a síntese de substâncias orgânicas, como aminoácidos, açúcares e bases nitrogenadas, em quantidades expressivas. Mesmo tendo recebido críticas importantes (por exemplo, ao invés de redutora, como Miller supunha, a atmosfera primitiva seria mais neutra que a atual), a principal mensagem do seu experimento ainda está de pé: moléculas orgânicas complexas podem ser obtidas a partir de condições inteiramente abióticas.
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Fonte: Costa, F. A. P. L. 2007. Um pioneiro no estudo da Terra pré-biótica. Ciência Hoje 242: 64-65.
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