O subcontinente indiano
Marq de Villiers
O rio Ganges, o rio mais sagrado para os hindus, a dádiva de Deus à humanidade civilizada, doador de bênçãos e purificador de pecados, nasce nas encostas do sul do Himalaia, na Índia, a 2.510 quilômetros da sua desembocadura na baía de Bengala. Bem, é isto o que afirma o texto indiano, mas a situação não é assim tão clara: uma consulta a qualquer mapa da região vai mostrar que a maior parte da água do Ganges vem da China e do Nepal, antes de correr para a Índia. Cerca de 40% do fluxo total e quase três quartos do fluxo durante a estação seca vêm de fora do país, fatos que tantos os chineses como os nepaleses vêm reafirmando à Índia nas últimas décadas. O rio serpenteia pela várzea de Ganges, forma durante um breve trecho a fronteira entre a Índia e Bangladesh, onde ele assume o nome de Bhadma, e depois se junta ao Jamuna-Brahmaputra, que por seu lado nasce na China, e corre num grande círculo em torno do Butão, antes de passar pela Índia em direção a Bangladesh. Ali ele desemboca na baía de Bengala.
É de uma ironia atroz que uma das mais altas concentrações da população muito pobre no mundo viva nas planícies férteis de uma das maiores bacias fluviais do globo. Os sistemas fluviais do Ganges e do Brahmaputra ocupam menos de um quinto de 1% da massa de terra do mundo, mas as suas bacias abrigam 10% de toda população mundial. Toda área é propensa a enchentes, secas e ciclones; às vezes, necessita desesperadamente de água; outras vezes, parece que todo o lugar está se afogando. Por mais de quarenta anos os governos nacionais da área vêm lutando com a distribuição e administração da água disponível. As questões ambientais estão irremediavelmente enredadas numa confusão técnico-política, enquanto a demanda e o abastecimento são alinhavados num difícil emaranhado de questões políticas, étnicas e nacionalistas.
Fonte: Villiers, M. 2002. Água. RJ, Ediouro.
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