Da individualidade racional à irracionalidade social
Elmar Altvater
A externalização (por exemplo, as emissões de rejeitos gasosos, líquidos e sólidos na atmosfera, nas águas e no solo) é bastante comum nas sociedades de mercado, pois por essa via os agentes do mercado, sobretudo as empresas, evitam seus custos privados e podem transferi-los como custos sociais da sociedade como um todo. Assim, com palavras, poder-se-ia descrever uma situação que, no entanto, é bastante problemática. Em primeiro lugar, é preciso esclarecer que só muito raramente trata-se de alguma patifaria, de alguma estratégia consciente de eliminação secreta de custos. O ‘despejo da meia-noite’, o descarregamento noturno e ilegal de lixo tóxico, ou até mesmo o ‘despejo de velhos’, o abandono ilegal e desumano de doentes para economizar os custos que representam, são muito mais exceções do que regra. Um dos princípios da sociedade de economia privada e, portanto, individualista e que cada um precisa se ocupar de seus negócios, sem consideração com os negócios dos outros e, muito menos ainda sem respeitar especificamente aquilo que constitui um bem comum a todos os homens. Isto tem sido chamado de ‘tragédia dos bens públicos’(Hardin, 1968): o que pertence a todos, e, portanto, a ninguém, encontra-se excluído do enfoque do cálculo econômico privado. [...] A individualidade racional inverte-se em irracionalidade social e, por fim, em irracionalidade microeconômica. Não poderia ser maior a mudança de paradigma entre a confiança otimista burguesa inicial nos efeitos virtuosos (beneficentes) da concorrência e o conhecimento atual dos efeitos danosos (maleficientes) do múltiplo assalto privado a recursos naturais limitados.
Fonte: Altvater, E. 1995 [1992]. O preço da riqueza. SP, Editora Unesp.
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