Horas ígneas
Pedro Kilkerry
I.
Eu sorvo o haxixe do estio...
E evolve um cheiro, bestial,
Ao solo quente, como o cio
De um chacal.
Distensas, rebrilham sobre
Um verdor, flamâncias de asa...
Circula um vapor de cobre
Os montes – de cinza e brasa.
Sombras de voz hei no ouvido
– De amores ruivos, protervos –
E anda no céu, sacudido,
Um pó vibrante de nervos.
O mar faz medo... que espanca
A redondez sensual
Da praia, como uma anca
De animal.
II.
O Sol, de bárbaro, estangue,
Olho, em volúpia de cisma,
Por uma cor só do prisma,
Veleiras, as naus – de sangue...
III.
Tão longe levadas, pelas
Mãos de fluido ou braços de ar!
Cinge uma flora solar
– Grandes Rainhas – as velas.
Onda por onda ébria, erguida,
As ondas – povo do mar –
Tremem, nest’hora a sangrar,
Morrem – desejos da Vida!
IV.
Nem ondas de sangue... e sangue
Nem de uma nau – Morre a cisma.
Doiram-me as faces do prisma
Mulheres – flores – num mangue...
Fonte: Ricieri, F., org. 2008. Antologia da poesia simbolista e decadente brasileira. SP, Ibep. Poema publicado em livro póstumo em 1971.

2 Comentários:
Mais uma bela poesia
Como disse um nativo piauiense " mais arte menos violência!"
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