27 maio 2025

Horas ígneas

Pedro Kilkerry

I.
Eu sorvo o haxixe do estio...
E evolve um cheiro, bestial,
Ao solo quente, como o cio
De um chacal.

Distensas, rebrilham sobre
Um verdor, flamâncias de asa...
Circula um vapor de cobre
Os montes – de cinza e brasa.

Sombras de voz hei no ouvido
– De amores ruivos, protervos –
E anda no céu, sacudido,
Um pó vibrante de nervos.

O mar faz medo... que espanca
A redondez sensual
Da praia, como uma anca
De animal.

II.
O Sol, de bárbaro, estangue,
Olho, em volúpia de cisma,
Por uma cor só do prisma,
Veleiras, as naus – de sangue...

III.
Tão longe levadas, pelas
Mãos de fluido ou braços de ar!
Cinge uma flora solar
– Grandes Rainhas – as velas.

Onda por onda ébria, erguida,
As ondas – povo do mar –
Tremem, nest’hora a sangrar,
Morrem – desejos da Vida!

IV.
Nem ondas de sangue... e sangue
Nem de uma nau – Morre a cisma.
Doiram-me as faces do prisma
Mulheres – flores – num mangue...

Fonte: Ricieri, F., org. 2008. Antologia da poesia simbolista e decadente brasileira. SP, Ibep. Poema publicado em livro póstumo em 1971.

2 Comentários:

Anonymous Anônimo disse...

Mais uma bela poesia

27/5/25 12:34  
Anonymous Anônimo disse...

Como disse um nativo piauiense " mais arte menos violência!"

27/5/25 13:32  

Postar um comentário

<< Home

eXTReMe Tracker