10 dezembro 2025

Palpite futebolístico

F. Ponce de León

Está prevista para hoje à noite (10/12), no Mineirão, às 21h30, a primeira das duas partidas entre Cruzeiro e Corinthians pelas semifinais da Copa do Brasil. A julgar pelos elencos, pelos técnicos, pelas teorias de jogo, pelas campanhas e, sobretudo, pelas exibições recentes, o time mineiro leva uma ampla vantagem. Se conseguir concretizá-la, é partida para quatro ou cinco golos, como diriam os portugueses. A julgar pelos burburinhos de última hora, porém, o Corinthians pode endurecer. O motivo do meu temor é mais ou menos evidente: há um cheiro do fumaça no ar.

É uma fumaça antiga e conhecida: o time paulista vai entrar em campo com a equipe completa, incluindo o juiz e o VAR. Nessas circunstâncias, o destino do jogo tende a escapar da mão dos jogadores. Ao menos três fatores contribuem para isso. Em primeiro lugar, o VAR costuma anular – mais de uma vez, às vezes! – um gol legítimo feito pela equipe lesada. Como justificativa, pode-se até mesmo buscar alguma (suposta) irregularidade nos três minutos anteriores ao lance do gol. Em segundo lugar, o juiz pode distribuir cartões amarelos para os jogadores do time lesado, culminando então com a expulsão de ao menos um deles. Por fim, o juiz costuma inventar um ou mais pênaltis a favor do time dos favorecidos.

08 dezembro 2025

When I see you again

Stevie Nicks

When I see you again
Will it be the same
When I see you again
Will it be over
When I see you again
Will your great eyes still say

What’s the matter, baby

So she walks slowly down the hall
There are many doors in the hallway
And she stares at the stairs
There are many things to stare at these days
If she sees him again
Will your very best friend (2×)
Have been replaced by some other

What’s the matter, baby

And the dream says I want you
And the dream is gone
So she stays up nights on end
Well, at least there is a dream left

If I see you again
Will it be over
If I see you again
Will it be the same
If I see you again
Will it be over
Again and again
Over and over

Fonte: álbum Tango in the Night (1987), do Fleetwood Mac.

05 dezembro 2025

A ética da crença

William K. Clifford

Um proprietário de navios estava prestes a mandar para o mar um navio de emigrantes. Ele sabia que o navio estava velho, e nem fora muito bem construído; que vira muitos mares e climas, e com frequência necessitava de reparos. Dúvidas de que possivelmente não estivesse em condições de navegar lhe haviam sido sugeridas. Essas dúvidas lhe oprimiam a mente e o deixavam infeliz. Ele chegou a pensar que o navio talvez tivesse de ser totalmente examinado e reequipado, ainda que isso lhe custasse grandes despesas. No entanto, antes que a embarcação partisse, conseguiu superar essas reflexões melancólicas. Disse para si mesmo que o navio passara por muitas viagens e resistira a muitas tempestades em segurança, que era infundado supor que não voltaria a salvo também dessa viagem. Ele confiaria na Providência, que não poderia deixar de proteger todas essas famílias infelizes que estavam abandonando a sua terra natal em busca de dias melhores em outro lugar. Tiraria de sua cabeça todas as suspeitas mesquinhas sobre a honestidade dos construtores e empreiteiros. Dessa forma, ele adquiriu uma convicção sincera e confortável de que o seu navio era totalmente seguro e capaz de resistir às intempéries; assistiu à sua partida de coração leve e cheio de votos bondosos para o sucesso dos exilados naquele que seria o seu estranho novo lar; e embolsou o dinheiro do seguro, quando o navio afundou no meio do oceano, sem contar histórias a ninguém.

O que devemos dizer desse homem? Sem dúvida, o seguinte: que ele foi de fato culpado da morte desses homens. Admite-se que ele acreditava sinceramente nas boas condições de seu navio; mas a sinceridade de sua convicção não o ajuda de modo algum, porque ele não tinha o direito de acreditar na evidência que estava diante de si. Não adquirira a sua opinião conquistando-a honestamente pela investigação paciente, mas reprimindo as suas dúvidas...

Fonte: Sagan, C. 1998 [1996]. O mundo assombrado pelos demônios. SP, Companhia das Letras. Trecho de artigo publicado em 1877.

03 dezembro 2025

Garota no espelho


Paulus Moreelse (1571-1638). Meisje bij een spiegel. 1632.

Fonte da foto: Wikipedia.

02 dezembro 2025

Semente

Célia Massa Beltrati & Adelita Aparecida Sartori Paoli

O termo semente é usado, em geral, para designar o conjunto formado por um esporófito jovem – o embrião (em algum estágio de desenvolvimento) –, um tecido de reserva alimentar – o endosperma (algumas vezes, o perisperma ou parte do próprio embrião) – e um envoltório protetor.

Fonte: Beltrati, C. M. & Paoli, A. A. S. 2003. In: Appezzato-da-Glória, B. & Carmello-Guerreiro, S. M., eds. Anatomia vegetal. Viçosa, Editora UFV.

30 novembro 2025

A hora íntima

Vinícius de Moraes

Quem pagará o enterro e as flores
Se eu me morrer de amores?
Quem, dentre amigos, tão amigo
Para estar no caixão comigo?
Quem, em meio ao funeral
Dirá de mim: – Nunca fez mal...
Quem, bêbedo, chorará em voz alta
De não me ter trazido nada?
Quem virá despetalar pétalas
No meu túmulo de poeta?
Quem jogará timidamente
Na terra um grão de semente?
Quem elevará o olhar covarde
Até a estrela da tarde?
Quem me dirá palavras mágicas
Capazes de empalidecer o mármore?
Quem, oculta em véus escuros
Se crucificará nos muros?
Quem, macerada de desgosto
Sorrirá: – Rei morto, rei posto...
Quantas, debruçadas sobre o báratro
Sentirão as dores do parto?
Qual a que, branca de receio
Tocará o botão do seio?
Quem, louca, se jogará de bruços
A soluçar tantos soluços
Que há de despertar receios?
Quantos, os maxilares contraídos
O sangue a pulsar nas cicatrizes
Dirão: – Foi um doido amigo...
Quem, criança, olhando a terra
Ao ver movimentar-se um verme
Observará um ar de critério?
Quem, em circunstância oficial
Há de propor meu pedestal?
Quais os que, vindos da montanha
Terão circunspecção tamanha
Que eu hei de rir branco de cal?
Qual a que, o rosto sulcado de vento
Lançará um punhado de sal
Na minha cova de cimento?
Quem cantará canções de amigo
No dia do meu funeral?
Qual a que não estará presente
Por motivo circunstancial?
Quem cravará no seio duro
Uma lâmina enferrujada?
Quem, em seu verbo inconsútil
Há de orar: – Deus o tenha em sua guarda.
Qual o amigo que a sós consigo
Pensará: – Não há de ser nada...
Quem será a estranha figura
A um tronco de árvore encostada
Com um olhar frio e um ar de dúvida?
Quem se abraçará comigo
Que terá de ser arrancada?

Quem vai pagar o enterro e as flores
Se eu me morrer de amores?

Fonte (v. 1 e 2): Cunha, C. 1976. Gramática do português contemporâneo, 6ª ed. BH, Bernardo Álvares. Poema publicado em livro em 1959.

29 novembro 2025

Afiliação

Stanley Schachter

[Evans] Dr. Schachter, embora o seu trabalho mais recente tenha seguido outras direções, seus primeiros esforços no campo da psicologia social são ainda largamente discutidos nos compêndios introdutórios e de psicologia social. Uma área de particular interesse é a do seu trabalho sobre afiliação. O que o levou a esta linha de pesquisa? Como foi que começou a se interessar pela necessidade de afiliação?

[Schachter] Eu havia trabalhado com Leon Festinger e Kurt Lewin em todo esse assunto de influência social, comparação social, como as pessoas avaliam suas opiniões, os determinantes sociais das opiniões e assim por diante. Simplesmente impressionou-me o fato de prestarmos muita atenção às consequências de estarmos com outras pessoas, e quase nenhuma ao fato de elas se darem ao trabalho de se associar, de modo geral. A psicologia social partiu da premissa de que as pessoas efetivamente se afiliam; elas se associam, elas realmente querem estar umas com as outras – e continuou desse ponto a examinar o que acontece quando elas estão juntas. Passei a ter muita curiosidade quanto ao porque, o motivo não óbvio, das pessoas quererem estar juntas, em geral.

Fonte: Evans, R. I. 1979 [1976]. Construtores da psicologia. SP, Summus & Edusp.

28 novembro 2025

Chave para a determinação de famílias botânicas

Alfreda William Thames

Para se fazer a determinação da família de um vegetal, o estudioso de Botânica deverá conhecer muito bem a ‘organografia’.

Para entrar na chave, a primeira preocupação do naturalista é ver a que secção pertence o material em exame, determinando em seguida a subsecção e a classe. Encontrada esta, verificar em que subgrupo se enquadra, pelos seus caracteres, o exemplar em estudo e seguir a chave.

Fonte: Thames, A. W. 1977. Botânica sistemática, 9ª ed. Ribeirão Preto, Edição do Autor.

25 novembro 2025

O Álbum

Shirley Ferreira

Ao longo do século XX, a literatura brasileira ganhou em densidade e sofisticação. Seus meandros, claro, se multiplicaram. Sempre foi, no entanto, um território contestado. Dos seus primórdios, em que era usada como instrumento de definição da identidade nacional, aos dias de hoje, quando diferentes grupos sociais reivindicam sua alteridade. Nos últimos anos, aumentou a heterogeneidade, visto que a prática literária passou a atrair e a abrigar a presença de várias minorias – e.g., mulheres (brancas e não brancas), negros (homens e mulheres), indígenas e integrantes do espectro LGBT+, segmentos outrora ignorados ou marginalizados. [...]

A literatura negro-brasileira e/ou afro-brasileira ganhou força e adentrou de vez no cenário literário. Cabe ressaltar que a trajetória dessa vertente foi marcada de dois modos: primeiro, com o sujeito negro sendo usado como matéria-prima ou tema e, segundo, no momento em que o sujeito negro passa a ser ele próprio autor dos seus textos.

Em minha pesquisa de mestrado conheci a obra de Luiz Gama (1830-1882), um dos precursores da poética negra. Autor de versos satíricos, reunidos no livro Primeiras Trovas Burlescas de Getulino (1859), que ironizava, entre outras coisas, a ideologia do branqueamento cultural dos mulatos. Ironizava também certos comportamentos das camadas sociais dominantes (política e economicamente) ainda às voltas com a monarquia. A ousadia de sua obra despertou admiração e respeito por parte de muita gente – notadamente abolicionistas – que compartilhava dos mesmos ideais. [...]

No decorrer dos estudos sobre Luiz Gama, descobri e entrei em contato com os escritos de Maria Firmina dos Reis (1825-1917). Logo me dei conta de certas semelhanças, apesar das diferenças na carreira literária – Gama, a rigor, foi autor de um único livro. Percebi, por exemplo, que ambos usaram o texto literário para expressar o desconforto e o descontentamento que sentiam diante de um sistema escravocrata. Ainda que tenham seguido trajetórias diferentes, deixaram um legado valioso que passou a servir de inspiração paraas gerações de escritores negros que vieram em seguida.

Nascida na capital da província do Maranhão, com 22 anos de idade Maria Firmina foi morar na Vila São José de Guimarães (atual município de Guimarães), onde se estabeleceria como professora e escritora. Ali, produziu uma rica obra literária também publicada em vários jornais de São Luís.

Fonte: Ferreira, S. 2025. O Álbum: Conjecturas e refutações aobre a vida e obra de Maria Firmina dos Reis. Curitiba, Appris.

22 novembro 2025

A teoria do QI hereditário

Lewis Terman

Afinal de contas, a observação corrente não nos ensina que, em geral, não são as oportunidades, mas as qualidades do intelecto e do caráter, que determinam a classe social a que pertence uma família? O que já se conhece sobre a hereditariedade não nos autoriza a pensar que os filhos de pais prósperos, cultos e com boas perspectivas têm uma bagagem hereditária superior aos dos que foram criados nos bairros pobres? Quase todas as provas científicas disponíveis sugerem uma resposta afirmativa à pergunta que acabamos de formular.

Fonte: Gould, S. J. 1991 [1981]. A falsa medida do homem. SP, Martins Fontes. Excerto de livro originalmente publicado em 1917.

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