24 abril 2025

Eos


Thomas Musgrave Joy (1812-1866). Eos. 1843 (?).

Fonte da foto: Wikipedia.

20 abril 2025

A maior vitória do esporte brasileiro

F. Ponce de León

Este 20/4/2025 ficará marcado como um grande dia na história do esporte brasileiro. A vitória de hoje de Hugo [Marinho Borges] Calderano (nascido em 1996) no campeonato mundial da ITTF (Federação Internacional de Tênis de Mesa, na sigla em inglês) foi um feito e tanto. Para mim foi de longe a vitória mais difícil e, por isso mesmo, a mais valiosa de toda a história das modalidades esportivas individuais.

Pense em qualquer modalidade olímpica ou em qualquer negócio que é erroneamente vendido como esporte – tipo corrida de automóvel – e você não encontrará montanha mais alta do que a montanha que o mesa-tenista brasileiro acaba de escalar lá em Macau. Sim, ele hoje chegou ao cume do Sagarmatha.

Para fins de argumentação, bastaria dizer que nenhum outro esporte ou modalidade olímpica (e.g., basquetebol ou a maratona) é tão monopolizado como o tênis de mesa. Trata-se de um esporte lindo e quase perfeito, e que é dominado por atletas chineses há décadas. (Apesar da beleza plástica e de tudo o mais, o esporte sempre foi desprezado pela TV brasileira. O máximo que a TV às vezes mostrava eram os 10 segundos finais da decisão de algum torneio pan-americano ou sul-americano vencido pelo Hugo Hoyama [nascido em 1969], um bom mesa-tenista e um grande medalhista, mas que nunca foi o ‘shaolin ninja’ que o Calderano dá mostras de ser.)

UM SHAOLIN NINJA BRASILEIRO?

Ao longo dos anos, qualquer atleta de outra nacionalidade que tentasse desafiar os maravilhosos chineses (e.g., o carismático e saudoso Ma Lin [nascido em 1980]) sempre me pareceu um intruso indesejável. Vira e mexe aparece algum europeu estranho e desajeitado, mas o meu exemplo favorito de peixe fora d’água seria o alemão Timo Boll (nascido em 1981). Por sua vez, Calderano tem um jeito de ‘shaolin ninja’ que eu ainda não havia visto em nenhum outro atleta não chinês. (O que me leva a dizer que, com alguma inteligência administrativa e doses de trabalho duro por parte dos gestores, o futuro do esporte em terras brasileiras poderá tomar um novo rumo.)

Em tempo: ao que parece, a popularização do esporte na China, a partir de meados do século passado, foi fruto de um feliz casamento entre demografia (população numerosa) e espaço (em uma quadra de basquete, por exemplo, cabem de 8 a 10 mesas de tênis de mesa, talvez mais).

Seja como for, espero que o novo campeão mundial tenha maturidade e apoio suficientes para resistir à máquina de moer carne que irá se voltar contra ele. Estou a me referir à mídia brasileira (veículos de imprensa, agências de publicidade etc.). Que ele esteja preparado, pois é absolutamente certo que essa turma vai querer sugar sangue.

Sim, não faltarão produtores de TV querendo colocá-lo diante de uma mesa para fazer demonstrações infantilizadas do jogo, assim como não faltarão perguntas sobre a diferença entre tênis de mesa e pingue-pongue... Enfim, não faltarão as idiotices habituais de sempre. (Não estranharia se ainda hoje ele fosse um dos ‘entrevistados com exclusividade’ do Fantástico, da TV Globo.)

Assim como também não faltarão agências de publicidade querendo associar a figura e as habilidades físicas dele aos produtos que essa turma vende – e.g., automóveis, bancos, celulares, cervejarias, mineradoras, petroleiras, casas de apostas, casas de prostituição, enfim, todos os negócios maravilhosos que patrocinam os clubes de futebol em Pindorama.

CODA.

52 anos depois, eis que enfim eu pude vibrar com uma jornada ainda mais épica do que a minha. Estou a me referir aqui à medalha de ouro que eu ganhei no início da minha adolescência, em 1973, no Torneio de Tênis de Mesa do Colégio Marista de Brasília. Não sei quais eram as posições dos meus adversários no ranking da ITTF, mas lembro da partida final e posso assegurar que foi bem difícil...

* * *

Pequena elegia de Setembro

Eugénio de Andrade

Não sei como vieste,
mas deve haver um caminho
para regressar da morte.

Estás sentada no jardim,
as mãos no regaço cheias de doçura,
os olhos pousados nas últimas rosas
dos grandes e calmos dias de setembro.

Que música escutas tão atentamente
que não dás por mim?
Que bosque, ou rio, ou mar?
Ou é dentro de ti
que tudo canta ainda?

Queria falar contigo,
dizer-te apenas que estou aqui,
mas tenho medo,
medo que toda a música cesse
e tu não possas mais olhar as rosas.
Medo de quebrar o fio
com que teces os dias sem memória.

Com que palavras
ou beijos ou lágrimas
se acordam os mortos sem os ferir,
sem os trazer a esta espuma negra
onde corpos e corpos se repetem,
parcimoniosamente, no meio de sombras?

Deixa-te estar assim,
ó cheia de doçura,
sentada, olhando as rosas,
e tão alheia
que nem dás por mim.

Fonte: Silva, A. C. & Bueno, A., orgs. 1999. Antologia da poesia portuguesa contemporânea. RJ, Lacerda Editores. Poema publicado em livro em 1958.

18 abril 2025

Igreja e sociedade no Brasil

Luiz Eduardo Wanderley

1. Pode-se afirmar que a Igreja católica detém o monopólio da religião no país, como religião oficialmente dominante e realmente vivida? Não está ela cindida em práticas pastorais conflitantes, originadas em bases teológicas e eclesias divergentes? A expansão do capitalismo no campo e [a expansão] do processo de urbanização estão contribuindo para um afastamento da religião? [...]

6. Como interpretar um certo recrudescimento de alguns fenômenos religiosos em formações sociais capitalistas, tidas como utilitárias, racionalizadas e secularizadas? Há novas funções para a religião nas experiências de desenvolvimento que se concretizam em países da África e da América Latina? Que aproximações podem existir nas relações entre a teologia da libertação e as ciências sociais, a nível latino americano?

Fonte: Wanderley, L. E. 1978. In: Religião e Sociedade, v. 3. RJ, Civilização Brasileira.

16 abril 2025

O roteiro de Kant

Hans Küng

Para o ateu continuam sem resposta aquelas últimas e, ao mesmo tempo, primeiras perguntas eternas sobre a vida humana, as quais não se abafam por nenhuma proibição, perguntas que se fazem não só nas fronteiras da vida, mas no bojo da vida individual e social. Se seguirmos o roteiro de Kant:

O que podemos saber? Por que existe algo? Por que não há o nada? Donde vem o homem e para onde vai? Por que o mundo é como é? Qual é a razão última e sentido de toda a realidade?

O que podemos fazer? Por que fazemos o que fazemos? Por que e a quem somos responsáveis? Qual é o sentido da fidelidade e amizade, e também do sofrimento e da culpa? O que é decisivo para o homem?

O que podemos esperar? Para que existimos? Qual é o sentido do conjunto? O que nos resta: a morte que, no fim, torna tudo absurdo? O que nos deve infundir coragem para viver e para morrer?

Portanto, perguntas, todas elas, a apontarem para a totalidade: perguntas não só reservadas a agonizantes, mas aos vivos. Não só para fracalhões e desinformados, mas precisamente para informados e engajados. Não desculpas para não agir, mas incentivos para a ação. Existirá algo que, em tudo, nos sustente, que jamais nos deixe desesperar? Um algo contínuo dentro de todas as mudanças, um incondicional em todo o relativo, um absoluto de permeio com o condicionado presente por toda parte? São perguntas a que o ateísmo não sabe responder.

Fonte: Küng, H. 1976. Ser cristão. RJ, Imago.

14 abril 2025

O escriba de Sevilha


John Phillip (1817-1867). The letter writer of Seville. 1854.

Fonte da foto: Wikipedia.

13 abril 2025

Olha em volta de ti!

Eugène Ionesco

Os homens andam em círculo na jaula do seu planeta, porque esqueceram que se pode olhar para o céu... Porque apenas queremos viver, tornou-se impossível a vida. Olha em volta de ti!

Fonte: Küng, H. 1976. Ser cristão. RJ, Imago. Comentário originalmente publicado em 1972.

12 abril 2025

18 anos e meio no ar

F. Ponce de León

Neste sábado, 12/4, o Poesia Contra a Guerra está a completar 222 meses (18 anos e seis meses) no ar.

Desde o balanço anterior – ‘221 meses no ar’ – foram publicados aqui pela primeira vez textos dos seguintes autores: Alex Comfort, Flávia Rebelo Mochel, G. Ainsworth Harrison, Joseph Ben-David, Luís Carlos de Menezes, Paul Colinvaux, Pratap Singh, Rodolpho von Ihering e William Osler. Além de material de autores que já haviam sido publicados antes.

Cabe ainda registrar a publicação de imagens de obras dos seguintes artistas: Edwin Long e Frederick Brown.

10 abril 2025

Hierarquias de dominação

Richard Conniff

A dominação é uma ideia espantosamente nova na biologia, exposta pela primeira vez no início do século XX por um obscuro pesquisador norueguês que estudava o comportamento das galinhas. Thorleif Schjelderup-Ebbe cunhou a expressão ‘ordem de bicada’ e definiu a ideia de hierarquia de dominação. Como recompensa por seus esforços, foi completamente esmagado pela hierarquia biológica escandinava e nunca chegou a obter um emprego acadêmico. Mas suas ideias vingaram. Na década de 1930, outros pesquisadores cunharam a expressão ‘macho alfa’ para descrever o líder de uma alcateia. Os biólogos começaram a ver hierarquias de dominação em quase toda parte.

Fonte: Conniff, R. 2004. História natural dos ricos. RJ, Zahar.

08 abril 2025

Um paroxismo de bronquite

William Osler

Estou passando um período dos diabos – seis semanas de cama! – um paroxismo de bronquite, que não figura em nenhum dos seus livros! praticamente nenhum sinal físico; tosse constante, assomos rápidos e depois fortes acessos, ruins como coqueluche... Então, outra noite, uma pleurisia aguda às 11 horas. Uma pontada e depois estrelas, dor ao tossir e respirar fundo, mas 12 horas depois chegou um ataque que deixou em pandarecos todas as ligações pleurais, e com elas a dor... Todo tratamento para bronquite é fútil: não há nada que meus bons doutores não me tenham feito tentar, mas as únicas coisas de alguma ajuda para parar a tosse foram – um bom gole de elixir paregórico ou uma hipodérmica de morfina.

Fonte: Nuland, S. B. 1995. Como morremos. RJ, Rocco. Excerto de carta que o autor enviou ao seu ex-secretário, B. O. Humpton, datada de 9/11/1919. O canadense William Osler (1849-1919) é tido como um dos pais da medicina moderna.

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