17 setembro 2009

Contemplação

Henriqueta Lisboa

Ânfora, tuas formas inúteis.
(Serão inúteis – tão belas?)

Quedas a um canto, vazia
de conteúdo, vazia
de néctar, de água.
Jamais serviste. E exiges
com ar de orgulho que te sirvam
– há séculos – o ambiente, a luz.

Mas ó donaire,
caçoila rara, flor de lua,
que segrego insuflou
teu assomo, que sonho
nas tuas curvas paira,
que invisível abraço
anelas, a que deus
enigmático és fiel
na tua contenção, que suspiro
de nuvens exalas, que aura
de madrugada exorna
teu sangue azul, que estirpe
fugidia restauras, que éter
de nostalgia te transforma
em espírito, em música
– para além da matéria –,
ó infecunda, ó eterna?

Fonte: Lisboa, H. 2001. Melhores poemas. SP, Global. Poema originalmente publicado em 1958.

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