A mágoa é um vício, a ele volto
Helder Moura Pereira
A mágoa é um vício, a ele volto
pelas madeiras desta casa, as memórias
são mais que os sinais pendurados
ao longo das paredes, não descrevo
o que vejo. O que sinto quase
está no silêncio, deixa de ser tempo
o tempo da noite, nos papéis
há desenhos que o matam, pontos
ganhos, contas de somar, fáceis
artimanhas evitando as palavras. Nada
difere de como ponho a mão na testa,
de como se afasta o sol para trás
dos castanheiros. Tento dizer
que sou como vós, leves amantes
de suaves lazeres, contradigo, desminto,
nada acontece. Para o dia de hoje
um pequeno esboço de tristeza, derrota
de cumprir, tarefa de vencer, antes
da noite os ombros, as rugas, terão
significado preciso. Só o recomeço
será tempo de sorrisos.
Fonte: Silva, A. C. & Bueno, A., orgs. 1999. Antologia da poesia portuguesa contemporânea. RJ, Lacerda Editores. Poema publicado em livro em 1984.
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