Para uns, negro
Rosalía de Castro
Para uns, negro;
para outros, branco;
e para todos,
deslocado.
Rosalía de Castro
1.
– Sê astuto, se é que
sabes;
Vinga-te das ofensas, se
é que podes;
A quem te sirva, paga-lhe;
Mas a quem não te dá,
nunca dês;
Porque a moral dos santos
Não reza sempre com a
moral dos homens.
Isto um galego montanhês
e rude,
Farto de humilhações e de
rancores,
Ao agonizar aconselhava a
um filho,
Herdeiro dos seus males e
do seu nome.
2.
– Sé ingênuo e leal sempre,
Perdoa a quem te ofenda,
Faze sempre o bem a
amigos e inimigos
E, com a porta aberta, sem
temor, espera:
Não há mais do que um Deus
e uma moral que salve
Os tristes filhos de Eva.
Isto a pobre viúva
Do montanhês, morrendo na
miséria,
Resignada a seu filho dizia...
E a Deus a alma entregou
serena.
3.
E fez-lhe ele as honras,
Mas só com gemidos e com
lágrimas;
Padre não houve ao redor,
que à pobre
O enterro de esmola lhe
cantasse.
Num canto do átrio,
Juntos às ásperas hortelãs
que medravam,
Sem cruz, sinal ou lousa,
Ali ficou perdida e
sepultada;
E triste e só o filho
Tornou, sanhoso, à solitária
casa.
– Meu pai deu-me um conselho
– ia pensando –
E minha mãe deu-me outro;
E se ela tinha santidade e
consciência,
Experiência e saber tinha
ele bastante.
Sou filho dele e dela...
Partirei, pois, a herança
em duas partes.
Minha mãe, farei o bem a
quem te fez...
Meu pai, vingança pedem teus
ossos.
Fonte: Freire, C. 2004. Babel de poemas: uma antologia multilíngüe.
Porto Alegre, L&PM. Poema publicado em livro em 1880.
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