13 julho 2015

Arúspice

Fernando Guimarães

Meu amor, as entranhas das vítimas conservaram o seu enigma,
o fogo nos altares apagou-se lentamente,
talvez como outrora já não venham as pombas
alimentar-se de palavras em nossas mãos erguidas.

Pelo céu os cometas passaram mas a memória esquece
o vestígio de sangue que nos deixa o seu brilho.
A areia secou os rios, as nascentes,
enquanto só o tempo prolonga a nossa esperança.

Junto de nós, a rosa foi apenas o seu desenho de cinza,
uma criança nasce para sempre coroada de espinhos,
tornaram-se finalmente os nossos braços extensos e mais puros
para erguermos, amor, em cada cruz um homem.

Fonte: Silva, A. C. & Bueno, A., orgs. 1999. Antologia da poesia portuguesa contemporânea. RJ, Lacerda Editores. Poema publicado em livro em 1956.

0 Comentários:

Postar um comentário

<< Home

eXTReMe Tracker