25 janeiro 2016

Sobre um poema de Matthew Rohrer

F. Ponce de León

O filósofo e poeta Antônio Cícero mantém um blogue literário, ‘Acontecimentos’, no qual reproduz obras suas e de outrem. Em visita ao blogue, na última sexta-feira (22/1), encontrei o seguinte poema (postagem ‘Matthew Rohrer: ‘Poem’/’Poema’: trad. de Sylvio Fraga’, de 17/1):

Poem

Matthew Rohrer

You called, you’re on the train, on Sunday,
I have just taken a shower and await
you. Clouds are slipping in off the ocean,
but the room is gently lit by the green
shirt you gave me. I have been practicing
a new way to say hello and it is fantastic.
You were so sad: goodbye. I was so sad.
All the shops were closed but the sky
was high and blue. I tried to walk it off
but I must have walked in the wrong direction.

O autor, como o título da postagem já indica, é o poeta estadunidense Matthew Rohrer. Na postagem, o original vem acompanhado da seguinte versão em português:

Poema

Matthew Rohrer

Você ligou, está no ônibus, no domingo,
acabei de tomar banho e espero você
chegar. Nuvens vêm deslizando do mar,
mas o quarto é delicadamente aceso pela camisa
verde que você me deu. Tenho praticado
uma nova forma de dizer oi e é fantástica.
Você estava tão triste: tchau: eu estava tão triste.
Todas as lojas estavam fechadas mas o céu
era alto e azul. Fui dar uma volta para ver se passava,
mas devo ter andado na direção errada.

Esta versão, do poeta e compositor Sylvio Fraga Neto, está no livro O andar ao lado: Três novos poetas norte-americanos [sic] – Matthew Rohrer, Jon Woodward, Matthew Zapruder, publicado pela editora 7Letras, em 2013. (Assim como Rohrer, Woodward e Zapruder nasceram nos Estados Unidos – os três, portanto, são estadunidenses.) Além da tradução, Fraga foi responsável pela seleção dos poemas que integram a obra.

Uma versão alternativa

Confesso que eu ainda não conhecia o autor nem a sua obra – a qual, a rigor, continuo desconhecendo, excetuando um ou outro poema que li nos últimos dias. O restante deste artigo, portanto, pode vir a se revelar um grande equívoco.

O ponto de partida do poema é o iminente reencontro de um casal (homem/mulher ou qualquer outro). Há uma única estrofe, mas os seus 10 versos podem ser divididos em três partes, a saber: “o reencontro e a esperança de um futuro melhor” (v. 1-5), “a mudança de comportamento do narrador” (v. 5-6) e o “passado doloroso e frustrante” (v. 7-10).

Na primeira parte, o narrador descreve as suas expectativas. O mundo é grande e não faltam problemas (Clouds are slipping in off the ocean), mas há motivos para ter esperança (gently lit by the green shirt). Na segunda, o narrador dá a entender que está empenhado em mudar (a new way to say hello), algo que parece empolgá-lo (it is fantastic). Na parte final, ele relembra a separação, triste e dolorosa. As promessas de felicidade (the sky was high and blue) não se realizaram – o narrador não foi feliz após a separação (in the wrong direction). O reencontro, portanto, seria uma renovada oportunidade de um futuro melhor.

A versão em português parece preocupada em realçar o coloquialismo presente no original (oi, v. 6, e tchau, v. 7), a ponto de tomar algumas liberdades (ônibus, v. 1, e dar uma volta para ver se passava, v. 9). Penso que certas escolhas do tradutor subverteram o significado original, a ponto de atrapalhar a compreensão do poema. Entre os ruídos que me chamaram a atenção, citaria ainda os trechos “o quarto é delicadamente aceso” (v. 4) e “o céu era alto e azul” (v. 8 e 9).

Não pretendo ensinar o Pai-Nosso ao vigário, mas resolvi preparar uma versão alternativa. Eis a minha sugestão:

Poema

Matthew Rohrer

Você telefonou, do trem onde está – é domingo;
acabei de tomar um banho e aguardo
você. Nuvens chegam do oceano,
a sala, porém, está vagamente iluminada pelo verde
da camisa que você me deu. Tenho exercitado
um novo modo de dizer olá – é fantástico.
Você estava tão triste: adeus. Eu estava tão triste.
Todas as lojas estavam fechadas, o céu, porém,
era alegre e azul. Tentei ir embora,
mas eu devo ter ido na direção errada.

Comentários adicionais em português sobre a vida e obra de Rohrer podem ser encontrados no artigo ‘Caseiro e estranho’, de Eucanãa Ferraz, publicado na revista piauí, em fevereiro de 2013.

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