Proclamação decadente
Medeiros e Albuquerque
A Olavo Bilac
(Carta escrita por um
poeta
a 20 de Floreal,
sendo Verlaine profeta
e Mallarmé – deus real.)
Poetas,
são tempos malditos
os tempos em que vivemos...
Em vez de estrofes, há
gritos
de desalentos supremos.
Se algum d’entre vós,
cantando
nos banquetes ergue a
taça,
sente, convulsa, pesando
a mão fria da Desgraça!
O Sorriso é tredo aborto
de algum soluço contido,
à beira dos lábios morto,
pelo Escárnio repelido.
E o Pranto – se o Pranto
ardente
banha uma face sombria –
vem do excesso do
pungente
riso mordaz de Ironia.
Que resta? Todas as crenças...
todas as crenças morreram!
Ficaram sombras imensas,
onde lumes esplenderam...
Que resta? A Dúvida
horrível
os sonhos todos
crestou-nos...
A Natureza impassível
só conta invernos e
outonos.
Se, pois, na Glória inda
crerdes,
há de enganar-vos a
Glória!
Murcham-se os louros mais
verdes
na folhas éreas da
História...
Os Poetas do Sentimento,
que pintam a sua idade,
vão morrer do Esquecimento
na profunda soledade.
E neste tempo em que o
Homem
se altera e diferencia,
breves, os cantos se
somem
na indiferença sombria.
Pode a Música somente
do Verso nas finas teias
conservar no tom fluente
tênue fantasma de ideias;
porque é preciso que
todos
no vago dessa moldura
sintam os estos mais
doudos
da emoção sincera e pura;
creiam achar no que
apenas
é tom incerto e indeciso
dos seus sorrisos e penas
o anseio exato e preciso.
Que importa a Ideia,
contanto
que vibre a Forma sonora,
se da Harmonia do canto
vaga alusão se evapora?
*
Poetas,
eu sei que, sorrindo,
zombam de nós os
descrentes.
– Deixai! Ao pé deste
infindo
ruir de Ilusões ardentes,
nós, entre os cantos
sagrados,
que só tu, Poesia!
animas,
passaremos embuçados
em áureos ramos de rimas.
Fonte: Horta, A. B. 2007.
Criadores de mantras. Brasília,
Thesaurus. Poema publicado em livro em 1899.
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