28 dezembro 2020

A depender da campanha de vacinação, o país irá contabilizar entre 14 e 24 milhões de casos e entre 282 e 396 mil mortes

Felipe A. P. L. Costa [*].

RESUMO. Vários países já deram início a campanhas de vacinação em massa contra a Covid-19. De acordo com o Ministério da Saúde, teríamos chegado ontem (27) a um total de 7.484.285 casos e 191.139 mortes. Presumindo que também haverá uma campanha de vacinação entre nós, cabe a pergunta: Quantos casos e quantas mortes serão contabilizados até o fim da campanha? Duas das minhas projeções mais otimistas são as seguintes: (1) Cenário RÁPIDO – Até 27/6/2021, o país irá contabilizar um total de 13.907.892 casos e 282.043 mortes; e (2) Cenário LENTO – Até 26/12/2021, o país irá contabilizar um total de 23.709.058 casos e 395.708 mortes.

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Um.

Ao menos 43 países já deram início a campanhas de vacinação em massa contra a Covid-19 (ver aqui). O pontapé inicial foi dado pelo Reino Unido, em 8/12 [1]. Nos Estados Unidos, o país que ostenta as piores estatísticas (ver aqui), a campanha teve início em 14/12 [2].

Os brasileiros, infelizmente, ainda não sabem quando uma campanha semelhante terá início por aqui.

Dois.

Não há dúvida de que é uma boa notícia saber que a vacinação em massa já começou em outros lugares. Mas a boa nova não nos autoriza a acreditar que estaríamos a presenciar os momentos derradeiros da pandemia. Nem justificaria o entusiasmo ingênuo e apressado que alguns brasileiros (jornalistas, inclusive) estão a manifestar.

Fechar os olhos e abrir mão do senso crítico é uma combinação perigosa cujos frutos costumam ser duros e amargos.

Três.

Devemos manter os olhos abertos.

Em primeiro lugar, devemos atentar para o seguinte: vacinar a população de um país não é um processo instantâneo. Leva tempo.

Veja o caso da Austrália. O governo australiano anunciou que 80% da população (~26 milhões de habitantes) deverão estar vacinados até outubro de 2021 (ver aqui). O nosso Ministério da Saúde, que até outro dia usufruía de uma reconhecida tradição em campanhas de vacinação, seria capaz de vacinar a população brasileira a um ritmo bem superior ao que está subentendido na estimativa do governo australiano. O governo brasileiro, no entanto, prevê que a campanha por aqui deva demorar mais de 1 ano (ver aqui).

Quatro.

Em segundo lugar, devemos atentar para o seguinte: os frutos da vacinação não brotam da noite para o dia [3]. No caso da Covid-19, a pandemia só será interrompida quando a cobertura mínima (60-70% da população) vier a ser atingida.

É a tal imunidade de rebanho.

Veja: após ter sido vacinado ou vacinada [4], você até pode se sentir protegido(a) e seguro(a). A pandemia, no entanto, só será interrompida depois que algo entre 60 e 70% dos seus vizinhos também tiver sido vacinado.

Em resumo, mesmo após o início da vacinação, muitos brasileiros (até duas dezenas de milhões; ver adiante) ainda serão infectados. Muitos dos quais (entre dezenas e centenas de milhares; ver adiante), infelizmente, irão sucumbir.

A julgar pelo que tem sido observado nas últimas semanas, o pior ainda pode estar por vir. Em outras palavras, as estatísticas podem ser ainda mais terríveis e assustadoras em 2021.

Cinco.

De acordo com o Ministério da Saúde, foram registrados ontem (27) mais 18.479 casos e 344 mortes. Teríamos chegado assim a um total de 7.484.285 casos e 191.139 mortes.

Contrariando o que foi observado nas semanas anteriores (ver artigo Nada é tão ruim que não possa piorar: As taxas de crescimento seguem a escalar), houve um declínio nas taxas de crescimento (casos e mortes) ao longo da última semana [5].

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FIGURA. O ‘V’ da pandemia. A figura que acompanha este artigo ilustra o comportamento das médias semanais das taxas de crescimento no número de casos (pontos em azul escuro) e no número de óbitos (pontos em vermelho escuro) em todo o país (valores expressos em porcentagem), entre 28/6 e 27/12. (Valores acima de 2% não são mostrados.) Note como as duas nuvens de pontos experimentaram rupturas e mudaram de rumo a partir do início de novembro.

*

Levando em conta as estatísticas da semana encerrada ontem (21-27/12), as médias semanais estão agora em 0,48% (casos) e 0,33% (mortes) [6].

Em condições normais, esta seria uma notícia auspiciosa. Mas não foi uma semana normal. A julgar pela rotina de trabalho das autoridades sanitárias (e.g., municipais e estaduais), o feriado de Natal atrapalhou a computação dos registros, puxando as estatísticas para baixo. As quedas, portanto, são artificiais. Algo semelhante deve ocorrer ao longo desta semana (28/12-3/1). As nuvens que ora turvam a nossa visão do que se passa no país só deverão se dissipar na outra semana (4-10/1) [7].

Seis.

Dito isso, resta dar uma resposta numérica à pergunta central deste artigo: Quantos casos e quantas mortes serão contabilizados em todo o país até o fim da campanha de vacinação?

Há vários modos de se estimar esses números.

No que segue, vou apresentar apenas duas das minhas projeções mais otimistas. As duas, como o leitor irá notar, foram obtidas de modo relativamente simples. São aproximações e estão sujeitas a ajustes e correções.

Sete.

Minhas projeções estão assentadas em três premissas. (a) Haverá campanha de vacinação e esta terá início imediatamente. (b) No cenário RÁPIDO, a campanha estará concluída daqui a 26 semanas (em 27/6); no cenário LENTO, daqui a 52 semanas (em 26/12). (c) Durante a campanha de vacinação, as taxas de crescimento (casos e mortes) exibirão tendências declinantes [8].

Respeitadas estas premissas, eis as duas projeções: (1) No cenário RÁPIDO – Até 27/6/2021, o país irá contabilizar um total de 13.907.892 casos e 282.043 mortes; e (2) No cenário LENTO –Até 26/12/2021, o país irá contabilizar um total de 23.709.058 casos e 395.708 mortes.

*

Notas.

[*] Para detalhes e informações sobre o livro mais recente do autor, O que é darwinismo (2019), inclusive sobre o modo de aquisição por via postal, faça contato pelo endereço meiterer@hotmail.com. Para conhecer outros livros e artigos, ver aqui.

[1] Uma cidadã britânica de 90 anos de idade foi a primeira pessoa a receber uma dose da vacina da Pfizer/BioNTech (ver aqui).

[2] A campanha estadunidense também começou com a vacina da Pfizer/BioNTech. Na semana seguinte, as autoridades liberaram uma segunda vacina, a da Moderna (ver aqui), também em circunstâncias emergenciais. Nessas circunstâncias, os fabricantes não podem ser responsabilizados por eventuais problemas decorrentes da vacinação.

[3] Para fins de ilustração, considere as estatísticas dos EUA, antes e após o início da campanha de vacinação. Em 2/12 (12 dias antes), eram 14.360.467 casos e 279.839 mortes. No dia 14, quando a campanha teve início, 16.950.546 casos e 308.298 mortes. Em 26/12 (12 dias depois), 19.441.964 casos e 339.923 mortes. Comparando esses dois intervalos de 12 dias, as taxas de crescimento diário (casos e mortes) pouco se alteraram. Veja: (1) casos: 1,39% (2-14/12) e 1,15% (14-26/12); e (2) mortes: 0,81% (2-14/12) e 0,82% (14-26/12). (Fonte das estatísticas dos EUA: Worldometer: Coronavirus.)

[4] As vacinas que já estão sendo usadas, assim como as que virão a ser usadas logo a seguir, devem ser administradas em duas doses. A eficácia média dessas vacinas gira em torno de 90% – i.e., nove em cada 10 indivíduos vacinados adquirem imunidade e ficam protegidos contra a doença. Assim, para imunizar 70% da população, ao menos 78% dos indivíduos devem ser vacinados.

[5] Da qual a imprensa brasileira só se dará conta amanha (29), quando e se o Imperial College de Londres (Inglaterra) vier a soltar um novo boletim sobre a situação brasileira.

[6] Para detalhes metodológicos, ver qualquer um dos quatro volumes da coletânea A pandemia e a lenta agonia de um país desgovernado (aqui, aqui, aqui e aqui).

[7] Entre 25/10 e 27/12, as médias semanais exibiram as seguintes trajetórias: (1) casos: 0,43% (19-25/10), 0,4% (26/10-1/11), 0,3% (2-8/11), 0,49% (9-15/11), 0,5% (16-22/11), 0,56% (23-29/11), 0,64% (30-6/12), 0,63% (7-13/12), 0,68% (14-20/12) e 0,48% (21-27/12); e (2) mortes: 0,3% (19-25/10), 0,26% (26/10-1/11), 0,21% (2-8/11), 0,3% (9-15/11), 0,29% (16-22/11), 0,3% (23-29/11), 0,34% (30-6/12), 0,36% (7-13/12), 0,42% (14-20/12) e 0,33% (21-27/12).

[8] No cenário RÁPIDO, as trajetórias passam pelos seguintes pontos (casos e mortes): 0,57% e 0,33%, em 27/12; 0,3% e 0,21%, em 28/3; e 0% e 0%, em 27/6. No cenário LENTO, as trajetórias passam pelos pontos (casos e mortes): 0,57% e 0,33%, em 27/12; 0,3% e 0,21%, em 27/6; e 0% e 0%, em 26/12. Cabe esclarecer o seguinte: os valores 0,57% e 0,3% (casos) e 0,33% e 0,21% (mortes) foram escolhidos de modo algo arbitrário, mas são valores conservadores, eu acrescentaria. Os valores para o dia 27/12 (0,57% e 0,33%) são as médias (casos e mortes) das últimas sete semanas (8/11-27/12); os valores intermediários (0,3% e 0,21%) são as médias da semana 2-8/11 e são os valores mais baixos desde o início da pandemia.

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