O quarto estágio da vida
Gordon Allport
[Evans] O senhor estaria inclinado a concordar então com a discussão de Jung [...] do processo de individuação. Ele achava que a individuação é um processo importante, mesmo na meia idade, e suas ideias são coerentes com a emergência do movimento existencial, em que um indivíduo começa a levantar questões de ‘quem sou eu?’, ‘para que estou aqui?’ e assim por diante. O senhor acha que é uma coisa saudável o indivíduo ficar cada vez mais preocupado com pensamentos sobre sua própria existência?
[Allport] Quando você levanta questões sobre o envelhecimento, você quase me convida a falar introspectivamente, mas entendo que você está chegando a um período da vida que concede a um homem mais tempo para tais questões. Eu diria que há provavelmente tantas maneiras de envelhecer quanto existe de indivíduos, porque defendo a singularidade em cada estágio do ser. Os psicólogos hindus nos contam que é muito característico das pessoas mais velhas procurarem um quarto estágio da vida que é chamado de significação ou liberação, mas que representa um desengajamento das atividades dos primeiros estágios, em que se procura maior prazer e sucesso, e o cumprimento das obrigações de cada um. O quarto estágio é aquele a que você aludiu, onde se levantam questões do tipo ‘quem sou eu?’, ‘o que é isso tudo afinal?’, ‘o que vem depois’ e assim por diante. Esta é uma preocupação natural de alguém que envelhece, mas não é peculiar só aos velhos. Talvez seja característico da nossa época que as perguntas tenham uma maior subjetividade, tons mais pessoais. Os aristotélicos fizeram a pergunta ‘O que é o homem?’, e isto levou-os a todas as ciências humanas, mas hoje estamos perguntando de modo mais pessoal: ‘Quem sou eu?’ Esta mudança de ênfase faz parte da tendência chamada existencial do nosso tempo, e não acho que seja bom ou ruim, embora provavelmente seja bom, porque nós temos o direito de saber as respostas das duas questões ‘o que é o homem’ e ‘quem sou eu’. Minha única crítica ao movimento existencial é que ele tende a ser muito intelectual e filosófico, e atribui a todo ser humano o mesmo vácuo existencial. Os intelectuais e a elite atribuiriam a todos os homens sua própria ansiedade, tédio e alienação. Só não acho que seja verdade que todo homem passe por essa ansiedade, angústia e alienação, no seu esforço de descobrir um significado. Contudo, uma vez que o nível educacional aumenta, mais pessoas leem livros e ponderam sobre as questões que encontram e imagino que seja natural ter cada vez mais este tipo de preocupação.
Fonte: Evans, R. I. 1979 [1976]. Construtores da psicologia. SP, Summus & Edusp.
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