14 setembro 2024

Mutilação genital

Desmond Morris

A razão médica dada em favor da remoção do prepúcio é que tal operação elimina certos perigos (extremamente raros) de doença. Estes só ocorrem, porém, se o adulto não mutilado deixa de manter o pênis razoavelmente limpo pelo simples ato de puxar para trás o prepúcio e lavar a ponta do membro. Se isso é feito regularmente, não há, de acordo com as autoridades médicas, maior risco para um circunciso do que para um não circunciso. Já que a grande maioria das remoções de prepúcio não é realizada por motivos religiosos, e já que quase não vale a pena considerar os fundamentos médicos, a verdadeira razão dos milhares de mutilações sexuais causadas em bebês a cada ano continua sendo um mistério. Considerada recentemente por um médico norte-americano como ‘o estupro do falo’, parece ser um remanescente do nosso distante passado cultural. Desde tempos remotos é um hábito comum na maioria das tribos africanas e foi adotado pelos antigos egípcios, cujos sacerdotes-médicos faziam questão que nenhum macho de respeito retivesse seu prepúcio. Por causa do estigma social ligado ao prepúcio, os judeus adotaram dos egípcios o ritual da circuncisão e o fizeram ainda mais obrigatório para os fiéis da sua religião. Ao tornar-se uma ‘lei’ religiosa ou social, a significação original da operação já tinha sido esquecida, e não é fácil hoje em dia remontar à fonte. Mesmo entre as tribos africanas, onde faz parte das complexas cerimônias de iniciação, é conhecida como ‘o costume’, porém várias explicações foram dadas por modernos pesquisadores. Uma hipótese diz que o prepúcio era considerado um atributo feminino, presumivelmente porque cobria a cabeça do órgão masculino da mesma forma que os lábios vulvares cobrem a abertura genital feminina. Pelo mesmo argumento, o clitóris da fêmea era considerado um órgão masculino, de modo que quando meninos e meninas chegavam à maturidade sexual ficavam mais conformes seu sexo quando se lhes extraíam os ofensivos atributos do sexo oposto.

Fonte: Morris, D. 1974. Comportamento íntimo. RJ, José Olympio.

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