Frente a frente
Paul R. Ehrlich
A palavra ‘predador’ causa um arrepio na espinha na maioria das pessoas. Talvez provoque a visão de um tubarão gigantesco engolindo uma mulher nua num mergulho à meia-noite, como na cena de abertura do filme Tubarão – ou uma cena qualquer igualmente apavorante. Os encontros com predadores grandes são, com freqüência, emocionantes também para os [ecólogos]. Constituem algumas de minhas recordações mais vivas de quatro décadas de biologia de campo. Por exemplo, numa clara noite subártica, em 1955, alguns amigos colecionadores de borboletas e eu íamos lentamente de carro por uma estrada no Parque Nacional de Monte McKinley, no Alasca, esperando tirar fotos de um urso cinzento, o maior predador terrestre da América do Norte. Era fim de primavera e o parque estava quase deserto de turistas. Deixamos que uma caminhonete nos ultrapassasse e então, de repente, vimos bem à frente do nosso veículo um grande Toklat cinzento fêmea e seu filhote.
Em lugar de parar, o outro carro imediatamente avançou sobre os ursos e depois os perseguiu pela estrada, irritando-nos e, desconfio, irritando também a ursa. Depois de serem perseguidos por uns cem metros, os ursos se separaram, a fêmea subindo a encosta e o filhote descendo morro abaixo. O motorista da caminhonete imediatamente freou e saltou com seu companheiro, e (sem nenhuma razão evidente para nós) correu sacudindo os braços para o filhote, que tinha parado a cerca de 10 metros da estrada. Preparei minha câmera, enquanto a fêmea observava a cena também a uns 10 metros, mas do outro lado da estrada – achei que uma foto de dois idiotas sendo despedaçados pela mamãe ursa teria certo valor comercial. Não tive tanta sorte, porém. A ursa não atacou, e depois de alguns momentos de espanto, o filhote simplesmente passou ao largo do homem que agitava os braços, para juntar-se à mãe, e foram embora.
[…]
Fonte: Ehrlich, P. R. 1993 [1986]. O mecanismo da natureza. RJ, Campus.
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