24 março 2011

As palavras

Wlademir Dias-Pino

Essas palavras são poemas,
Poemas que se repetem
Sobre si mesmas

Palavras e números;
Números de letras,
Número de sílabas.

Essas palavras são poemas
Em que a vida se repete
Sobre si mesma.

Palavras que descansam, gentilmente,
Mil idéias de viagens
– Folhas e para cima, arco-íris,
Principalmente,
Caminhos sobre todos os muros.

Palavras coloridas
Como esse pássaro
Que canta agora,
– Escama de todos os mares,
Cantando em luz
A música das Sereias nadando,
– Pedaço de todos os crepúsculos.
Palavras que ficam, assim, tão perto
– Escama de todos os mares,
De todas as idéias que ainda nadam.

Palavras Suplicadas a esmo?

Palavras... Palavras... Palavras...
Abertas e despetaladas em esquinas,
Mãos pousadas,
Após o gesto

Palavras que Servirão amanhã,
Equilibrando,
Que-nem mastro,
A flâmula da imagem

Palavras pousadas,
Que-nem praia
Sobre as ondas das idéias.

Palavras-pálpebras abertas
Em portas,
Pontes no silêncio de quem espera algo e
No destino do que tem de atravessar
Acontece logo.

... também.
Palavras coloridas
Sorrindo como conchas flutuando,
Eclodidas em desejos.

Palavras aos pares
– Mudos olhos –
Janelas-cais de espelhos
Prendendo pés prontos
Para uma dança que nunca se realizará.
Palavras-grades de ferro de sacadas.

Boca de poços salgada, de sombras
Taças em filas de estradas de vidro,
Raízes arrancadas e flutuando em lagos

Palavras-túnicas vestindo pedras
Teias disfarçando degraus
Peixes – gravado, em folhas verde mar.

Palavras-curvas de montanhas,
(A MORTE está tão perto de nós
Que as coisas vistas de longe
Têm um ar infantil)
Tatuagens pautando cicatrizes,
Línguas inaugurando figuras geométricas,
Pontes de espumas.

– o –

Madrugadas pintadas em máscaras.

– o –

Esfinges de sombras,
E transformadas em pianos,
Chuva e chafariz,
Sombras de distâncias sobre desertos

Fotografia de torres,
De anjos, de sapatos, de parentes
Crucificando outras direções.

Cabelos da amada cantando
Dentro das flautas abandonados.

Fechaduras prendendo mapas sob o vento
Ponteiros feitos de rugas,
Riscos de vinho completando corações,
Violinos descansando,
Separados por dedos arrancados.

Jarras partidas por âncoras,
Velhice das coisas que estão voando,
Caveiras irisadas de sinos silenciosos.

Como o espelho da lança
Refletindo a vítima antes de atingi-la.

Fonte: Pinto, J. N. 2004. Os cem melhores poetas brasileiros do século, 2ª edição. SP, Geração Editorial. O trecho acima corresponde à primeira parte do poema, originalmente publicado em 1951.


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