Homo sapiens?
Dennis Fry
O rótulo Homo sapiens foi colado ao homem por Lineu em sua classificação do reino animal, há mais de 200 anos. Esse reino inclui agora mais de 750.000 espécies, e muitas outras podem ainda ser descobertas, mas é pouco provável que algo venha a abalar seriamente nossa convicção de que pertencemos a uma classe muito especial, convicção essa hoje não menos forte do que no século 18. Os critérios sobre os quais o sistema de Lineu foi construído eram, naturalmente, de caráter físico, mas é na esfera da inteligência que a superioridade do homem é geralmente reconhecida, quaisquer que sejam as dúvidas que se possam ter, ocasionalmente, sobre a exatidão do adjetivo sapiens.
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O homem é, acima de tudo, o animal falante – Homo loquens. A esmagadora maioria dos seres humanos passa grande parte de seu tempo falando e ouvindo falar. Eles aprenderam a fazer isso durante seus primeiros anos de vida – e sem prestar muita atenção ao processo – e em conseqüência toda a atividade da comunicação verbal se realiza num nível em que nem o falante nem o ouvinte têm muita consciência da mecânica do processo. Todos nós temos, é claro, a ilusão de que sabemos o que estamos fazendo quando falamos, tal como temos a ilusão de escolhermos entre falar e calar, embora dois minutos num vagão ferroviário razoavelmente cheio sejam suficientes para acabar com essa ilusão. Por falarmos e ouvirmos, imaginamos que sabemos como funciona a fala, mas a grande maioria das pessoas não diria que compreendemos a circulação do sangue unicamente porque ele corre em nossas veias, ou que o oxigênio se renova em nossos pulmões porque inspiramos e expiramos. A situação relativa à fala não é muito diferente, e, mesmo do ponto de vista técnico, estamos longe de saber tudo sobre o funcionamento da fala e da linguagem. A pesquisa sobre o assunto se vem processando há muitas décadas, e levou ao estabelecimento de certos fatos físicos e certos princípios gerais. Este livro é uma tentativa de colocar parte dessas informações à disposição do leitor comum, julgando serem elas de interesse, e mesmo de certa importância, para que se aprecie melhor o que significa pertencer à família do Homo loquens.
Fonte: Fry, D. 1978. Homo loquens: O homem como animal falante. RJ, Zahar.
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