27 janeiro 2014

O mau humor do riso

Cyro Siqueira

Naqueles tempos, mais ou menos 40 anos atrás, também mais ou menos heróicos, meus contatos com Celius Aulicus – Gomes Jardim – eram muito rápidos e superficiais, mas sempre cordiais. Fui conhecê-lo melhor durante uma dessas viagens doidas que, na época, jornalistas faziam. Estimulado pelos ventos amáveis da Época JK, um grupo de jornalistas mineiros arranjou recursos para participar de um encontro da classe, que seria realizado na Finlândia, especificamente em Helsinque, capital daquele país, mais especificamente em Otaniemi, um balneário à margem do Mar Báltico. Corria o ano de 1956, éramos cinco ou seis jornalistas mineiros. Geraldo Ribas, Juraceí de Barros Gomes, Wander Moreira, Celius Aulicus, Délcio Monteiro de Lima – e o degas aqui.

O dinheiro de cada um de nós era pouco. O dinheiro do Celius era pouquíssimo. O avião da travessia atlântica, naturalmente Panair, naturalmente de hélice, barulhento. Na travessia atlântica, Celius, que já era meio surdo, ficou mais surdo. Sua situação se complicou porque o avião da Panair iria nos deixar, como nos deixou, em Roma, onde passamos todo um dia à espera da conexão, avião escandinavo, para Helsinque. Em Roma, Celius teve, no que eu percebi das coisas, duas decepções. A primeira, de natureza pragmática, monetária. Uma de suas irmãs estava morando temporariamente em Roma, casada com um político brasileiro em missão comercial. Celius achou que ela iria melhorar seu caixa, quer dizer, suas parcas reservas de dinheiro. De fato ela ajudou, mas, mineiramente, com muito pouco.

A segunda decepção de Celius foi de ordem ideológica. Ao sairmos do Brasil, o Diário de Notícias havia publicado o hoje famoso Relatório Kruchov sobre os crimes de Stalin, o famoso relatório do 20º Congresso do Partido Comunista. Aqui na pátria, o relatório foi logo impugnado pelo Partido Comunista Brasileiro – ao qual Celius era afiliado – e por sua ‘linha auxiliar’, como embuste montado pelo imperialismo ianque.

Em Roma, até as livrarias mais radicalmente socialistas vendiam avulsos do referido relatório.
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Fonte: Rabêlo, J. M. 1997. Binômio: edição histórica. BH, Armazém de Idéias & Barlavento Grupo Editorial.

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