A riqueza de um poeta
Correia Garção
Nas despidas paredes, que
me abrigam
No
tormentoso Inverno,
A passagem do Grânico não
vejo
Em
fina lã tecida.
Nem mármores, nem pórfidos
luzentes
Nos
alizares brilham:
Não tine do Japão na
parca mesa
A rara
porcelana.
O dourado saleiro não me
cega
C’os
trêmulos reflexos
De prata. Não se acendem
mil bugias
Em
tortas serpentinas.
Porém Virgílio, Sófocles,
Homero,
O venusino
Horácio,
São as ricas alfaias, que
me adornam
A sala
majestosa,
Os soberbos escudos, em
que pinto
A
geração ilustre.
Eles fazem que Ansberto
generoso
Seu
amigo me chame;
Que o Souza marcial com
puro estilo
Gracejando
me escreva.
Guarde a terra avarenta
nas entranhas
O ouro
refulgente.
O Mineiro na roça aflito
cave
C’os
sórdidos escravos:
Por ignotos sertões
exponha a vida
Do
bárbaro Tapuia
À seta venenosa, à veloz
garra
Do Tigre
mosqueado.
Sofra na Linha podre
calmaria,
Relâmpagos,
e raios:
Para n’Aldeia entrar
acompanhado
De
descalços Trombetas,
De purpúreas Araras,
inquietos
Petulantes
Bugios,
Gaste pródiga a mão, em
poucas Luas,
O
ganho de dois lustros;
Para a vermelha Cruz a
brilhar no peito,
Que os
fardos encurvaram.
No tegurio paterno não
cabendo,
Palácios
edifica
Alastrado com pedras o caminho.
Do Guindaste
as roldanas
C’o peso do venal Escudo
gcmem,
Que o
Pórtico remata.
Estúpido não sabe, que
apressada
A
pálida Doença
Atrás dele caminha: que
já chega
Envolta
em parda névoa,
A Morte inexorável, derramando
Co’ a
fria mão angústias;
Que o leito de cruéis
fantasmas cerca,
E que
lhe arranca as chaves
Do guardado tesouro; que
o reparte
Pelos
rotos herdeiros.
E qual sangrado rio
enfraquecido
Torna
a gastar-se em sogas!
Com ouro não se compra um
nome digno
Da póstuma
memória.
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