Palavras mágicas
Camara Laye
Embora meu pai não
dissesse palavra em voz alta, sei muito bem que ele estava a pensar nelas, para
dentro. Eu lia isso pelos lábios que não paravam de se mover enquanto ele se
curvava sobre o recipiente. Ia mexendo o ouro e o carvão com um pau de madeira
que acabava por arder de vez em quando e que estava sempre a ter [de] ser
substituído. Que espécies de palavras eram essas que meu pai ia em silêncio
pronunciando? Não sei – pelo menos não sei exatamente. Nunca nada me foi dito
sobre isso. Mas que podiam
elas ser senão palavras mágicas? [...]
Durante todo o processo o
seu discurso tornou-se cada vez mais rápido, os ritmos mais acelerados, e, à
medida que a peça de ornamentação ia tomando forma, os seus louvores e
exaltações ganhavam mais veemência e transportavam aos céus a habilidade de meu
pai. Numa maneira especial, quase diria imediata e efetiva, o feiticeiro
participava na obra. Ele era também levado pelo prazer da criação, e em voz
alta proclamava esse prazer: arrebatava as cordas com entusiasmo, inflamava-se
como se ele próprio fosse o artífice, como se ele próprio fosse meu pai, como
se o ornamento surgisse das suas próprias mãos.
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