A informação internacional
Newton Carlos
A comparação entre o que
se fazia ontem e o que se faz hoje, em matéria de noticiário internacional,
assume importância maior na medida em que encolhe o espaço aberto a informações
de fora. A América Latina, por exemplo, se torna ilustre desconhecida. Diz-se
que o fenômeno não é nacional, é universal. A Foreing Affairs, um dos porta-vozes
do establishment diplomático dos
Estados Unidos, que tratou dessa questão, confirmou a tendência à contração e
citou, talvez como razões maiores, da parte de lá, o fim da Guerra Fria e o consequente
desinteresse dos americanos pelo que se passa no resto do mundo. Constatação
tomada como paradigma.
Mas o que nós, leitores
brasileiros, temos a ver com o comportamento americano diante do fim da Guerra
Fria? Claro, Estados Unidos e a ex-União Soviética pararam de trocar murros em
países miseráveis do Terceiro Mundo. Era o link
enunciado por Kissinger, tudo passando pelo eixo Washington-Moscou. Sem isso,
sem Guerra Fria, é o raciocínio, reduz-se o appeal
das notícias que colocam o universo ao nosso alcance. A varrida entre nós, que
é fato, basta olhar jornais e televisão para constatá-lo, teria aí suas origens.
O noticiário internacional se encolhe e adota o fait divers como forma, diz-se, de atrair leitores. “Um escândalo
sexual na monarquia inglesa me interessa mais do que a matança na Colômbia”, me
avisou certa vez um editor da área.
Relembrar o trabalho no Binômio dá mais vida ao contraponto,
porque mostra ênfases distantes do link
que procurava encaixotar-nos antes mesmo do advento de Kissinger. Os tempos
eram ricos. Fim do colonialismo, nascimento de um terceiro-mundismo, erupção de
neutralismos, reivindicações de comércio e não ajuda, revolução cubana, a
América Latina tentando desgarrar-se da condição de parte da bancada dos
Estados Unidos na ONU etc. O Brasil afinal despertava para ebulições que
pressionavam a rígida alternativa ou Washington ou Moscou. No Binômio, os assuntos de fora não se
apresentavam estanques. Foi dada a mim a oportunidade de colocar o Brasil num
contexto mais amplo.
Coisas distantes,
aparentemente insignificantes para nós, como os desdobramentos da reunião de
Bandung, lá na Indonésia, no outro lado do mundo, de repente podiam ser
tratadas como algo do nosso interesse direto. O Brasil virou a cara ao
colonialismo português, abraçou o neutralismo, por meio de afagos, nem sempre
de pulso forte, ensaiou a criação com a Argentina de um eixo continental de
autonomia etc. Tudo isso, visto hoje como velharias,
estava no Binômio, com enfoques
próprios, além do que informavam os antigos telegramas e à margem da influência
de publicações europeias, extremamente intelectualizadas. Temas nacionais eram
acoplados às suas projeções externas, quase uma novidade na época. Não havia
uma ‘seção internacional’.
Fico pensando como seria
o Binômio atualmente, sobretudo num
campo, o da informação internacional, que se submete cada vez mais aos padrões
e gostos da mídia eletrônica de longo alcance. Reportagens muito bem feitas,
mas sem o travo das implicações e anseios nacionais e regionais. Esse travo,
essa visão ‘de dentro’, as matérias do Binômio
tinham. O link imaginado por Kissinger
afinal se impõe, adaptado ao pós-Guerra Fria, já sem Moscou, por meio de
padrões e gostos de uma mídia imperial em seus recursos, alcances e
centralização das decisões estratégicas. Se vivo, o Binômio certamente procuraria rompê-lo.
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