Ressurreição de Leopoldo Panero
António Osório
vendados sus ojos,
espera la resurrección de la
carne
aqui, bajo esta piedra.
Leopoldo Panero,
‘Epitáfio’
A José Bento
1.
Não, Panero, não creio
na ressurreição da carne.
Não esperes debaixo dessa
pedra:
Deus teve sempre a face
de um homem incorruptível
lutando contra os seus
demónios.
Lázaro, que tudo soube e
nada
disse, jaz a teu lado.
É melhor restituir aos
outros
os nossos quinze anos,
a esperança de que sejam
luminosos
e sobrevivam como
sementes de luzerna,
e escrever, como tu,
versos
que detinham o fogo e a
neve divinas,
e amá-los como se neles
resplandecessem ainda os
teus olhos
e a fé que os abrasava,
limpos de cinza.
2.
E contudo, Panero,
desejaria
matar-te a sede com um
favo de mel,
com hortelã e funcho
despertar-te o olfacto,
a vista com os olhos que
amavas, azuis,
o tacto com a própria
pele, recém-nascida.
Desejaria, sim, pudesses
dizer
que presenciaste a
transfiguração
do Deus dos mortos em
Deus dos vivos
e que Ele sofreu mais que
o Filho
para sair do sepulcro, e
te ungiu
os ossos purificando a
íntima lepra,
e que a tua alma penetrou
no corpo
como a primavera dentro
de um ninho.
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