10 janeiro 2017

A crença

Jean Lacroix

Das análises precedentes resulta que o que se denomina, desde Kant, a teoria do conhecimento deveria tornar-se mais exatamente uma teoria da crença. O problema essencial do personalismo, o teste pelo qual se pode e se deve julgá-lo é o da natureza e valor da crença. O que eu não sei, costumava repetir Goblot, eu o ignoro. E por saber compreendia ele unicamente o conhecimento científico: tudo o que não é ciência é não saber, não conhecimento. Somente a razão é racional, somente a inteligência é inteligente, a condição para a certeza é defender-se contra a parcialidade do sentimento e a arbitrariedade da vontade. A crença pode, pois, ser boa, isto é, útil, pois a ciência é imperfeita e as ações da vida não sofrem retardamento; mas ela não poderia ser verdadeira. Portanto, deve-se recusar-lhe todo valor de conhecimento. Ela é puramente subjetiva e a insinceridade intelectual consiste exatamente em tomar como conhecimento o que não o é. “Na noção de crença há qualquer coisa de equívoco: a crença é aquilo que, sem ser um ato de conhecimento, pretende fazer-se passar por tal”. Admite-se que o racionalismo possa ser desdobrado de fato em uma espécie de fideísmo, mas com a condição de que seus domínios permaneçam inteiramente separados, que o primeiro comande do juízo e o segundo a prática: é preciso saber que se crê e não crer que se sabe. O essencial, na ordem do conhecimento, é rejeitar implacavelmente tudo que não for certo: toda vontade de crer deve se transformar em vontade de duvidar.
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Fonte: Lacroix, J. 1972 [1962]. Marxismo, existencialismo, personalismo. RJ, Paz e Terra.

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