25 outubro 2018

As cidades e os micróbios


No ano 6000 a.C., havia menos pessoas na Terra do que as que hoje habitam Nova York ou Tóquio. Os habitantes pré-históricos, aproximadamente 30 milhões, espalhavam-se pelas enormes extensões do planeta, sempre procurando as áreas mais quentes. Poucos se arriscavam a sair do local em que nasciam. [...]

Nos 4 000 anos seguintes, a população humana cresceu lentamente. As pessoas se congregavam em torno de rios, portos de mar e lugares onde existiam ricas fontes de alimentos. Surgiram rotas comerciais ligando os incipientes centros urbanos, e os habitantes das cidades prosperaram em parte como resultado de atividades comerciais e em parte com os tributos que impunham aos moradores mais pobres da zona rural. [...]

No ano 5 a.C., os habitantes de Roma, cerca de 1 milhão, consumiam 6 000 toneladas de cereais por semana. Após a queda do Império Romano, durante 1 800 anos nenhuma cidade voltaria a ter uma população tão grande, a não ser quando Londres tornou-se a maior metrópole da história até aquela época.

As cidades proporcionavam aos micro-organismos um grande número de oportunidades não encontradas na zona rural. Quanto mais Homo sapiens por quilômetro quadrado, mais facilmente um micro-organismo passava de um ser humano desafortunado para outro. As pessoas transmitiam agentes responsáveis por doenças de mil maneiras, a cada minuto do dia, quando se tocavam ou respiravam uns próximos aos outros, ao preparar alimentos, ao defecar ou urinar nos depósitos de água que serviam a outros propósitos, ao viajar para lugares distantes levando junto os micro-organismos, ao construir centros para atividade sexual que permitiam aos micróbios explorar outro meio de transmissão, ao produzir imensas quantidades de resíduos que podiam servir de alimento para vetores roedores e insetos, ao represar cursos-d’água e inadvertidamente deixar cisternas de água de chuva se transformarem em locais de reprodução de mosquitos transmissores de doenças [...].

Em resumo, as cidades eram paraísos para os micróbios ou, como dizia o bioquímico inglês John Cairns, ‘sepulturas da humanidade’. Os flagelos mais devastadores do passado atingiam dimensões alarmantes apenas quando os micróbios alcançam os centros urbanos, onde a densidade demográfica instantaneamente ampliava qualquer doença contagiosa de pequena proporção, originada nas províncias, e os micróbios conseguiam explorar as novas ecologias urbanas e criavam doenças inteiramente novas.

Fonte: Garrett, L. 1995. A próxima peste. RJ, Nova Fronteira.

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