Caprichos vasculares do SNC
Roberto Lent
Como todos os órgãos do corpo, o sistema nervoso precisa de oxigênio e nutrientes, e os retira basicamente do sangue arterial. Ocorre, entretanto, que as células nervosas são acentuadamente aeróbicas e, portanto, muito dependentes do aporte de oxigênio. Para se ter uma ideia, basta considerar que o encéfalo humano absorve cerca de 20% do oxigênio disponível na circulação e, para isso, recebe cerca de 15% do fluxo sanguíneo do corpo, embora represente apenas 2% da massa corporal. Alguns segundos de interrupção do fluxo sanguíneo cerebral já produzem sintomas, e alguns minutos já podem provocar lesões neuronais irreversíveis.
Para sustentar esse delicado e exigente equilíbrio metabólico, a vasculatura do SNC [sistema nervoso central] apresenta algumas importantes características, morfológicas e fisiológicas. (1) A entrada das artérias cerebrais e medulares não se dá por um único ponto (um hilo), como é o caso do fígado e dos rins, o que propicia alternativas de aporte sanguíneo em casos de obstrução. (2) O trajeto das artérias e arteríolas não é retilíneo mas tortuoso, e isso possibilita que se dissipe a energia mecânica proveniente do batimento cardíaco, que provoca um pico de pressão a cada sístole, o qual teria um provável impacto negativo sobre os neurônios se fosse transmitido a eles. (3) O diâmetro das arteríolas – e, portanto, o fluxo sanguíneo que penetra no tecido nervoso – é fina e dinamicamente regulado pela atividade neural, permitindo que as regiões mais ativas recebam mais sangue a cada momento da vida da pessoa. (4) A rede capilar apresenta uma barreira (a famosa barreira hematencefálica) que seleciona quais substâncias podem e quais não podem transitar entre o sangue e o tecido nervoso. Esse é um recurso importante para proteger o SNC de perigos externos (toxinas, drogas tóxicas) e internos (neurotransmissores como a epinefrina, por exemplo, que são secretados em massa pela medula supra-renal em certas situações, podendo causar grande interferência na função neural se fossem ‘autorizados’ a passar do sangue diretamente ao tecido nervoso). (5) A vasculatura venosa apresenta a contribuição das meninges, que formam os chamados seios nervosos e drenam não apenas o sangue utilizado pelo tecido, mas também o líquor que circulou pelas cavidades do SNC.
Fonte: Lent, R. 2008. A estrutura do sistema nervoso. In: Lent, R., org. Neurociência da mente e do comportamento. RJ, Guanabara Koogan.
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