11 janeiro 2022

O nitrogênio sintético

Michael Pollan

Tudo mudou com a descoberta do nitrogênio sintético – não apenas para o pé de milho e a fazenda, não apenas para o sistema de produção de alimentos, mas também para a maneira como a vida se desenvolve na Terra. Toda vida depende de nitrogênio; é ele o elemento essencial a partir do qual a natureza monta aminoácidos, proteínas e ácido nucleico; a informação genética que organiza e perpetua a vida está inscrita no nitrogênio. [...] Mas o estoque de nitrogênio da Terra em condições de ser usado é limitado. Apesar de a atmosfera da Terra ser composta de nitrogênio em quase 80%, todos esses átomos são estreitamente emparelhados, não reativos e, portanto, inúteis. [...] Para ser de alguma utilidade para plantas e animais, esses átomos de nitrogênio voltados para si mesmos precisam ser cindidos e em seguida unidos a átomos de hidrogênio. [...] Até que [...] Fritz Haber descobrisse como realizar esse truque em 1909, todo o nitrogênio utilizável na Terra tinha sido em algum momento fixado por bactérias existentes no solo [...] ou, mais raramente, pelo choque elétrico de um relâmpago [...].

Menos de um século se passou desde o advento da invenção de Fritz Harber, e mesmo assim ela já mudou a ecologia da Terra. Mais da metade do suprimento mundial de nitrogênio utilizável é atualmente produzido pelo homem. [...] “Perturbamos o ciclo global do nitrogênio”, escreveu Vaclav Smil, “mais do que qualquer outro, mesmo o do carbono”. As consequências podem ser mais difíceis de prever do que os efeitos do aquecimento global provocado pela nossa interferência no ciclo do carbono, mas podem ser não menos graves. O dilúvio de nitrogênio sintético fertilizou não apenas os campos de cultivo, mas também as florestas e os oceanos, beneficiando algumas espécies (o milho e as algas estão entre os dois maiores beneficiários) e em detrimento de várias outras. [...] Ao fertilizar o mundo, alteramos a composição das espécies do planeta e fazemos encolher sua biodiversidade.

Fonte: Pollan, M. 2007. O dilema do onívoro. RJ, Intrínseca.

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