Saudade dos aviões da Panair (Conversando no bar)
Fernando Brant
Lá vinha o bonde no sobe-e-desce ladeira
e o motorneiro parava a orquestra um minuto
para me contar casos da campanha da Itália
e do tiro que ele não levou
levei um susto imenso nas asas da Panair
descobri que as coisas mudam e que tudo é pequeno nas asas da Panair
E lá vai menino xingando padre e pedra
e lá vai menino lambendo podre delícia
e lá vai menino senhor de todo o fruto
sem nenhum pecado, sem pavor
o medo em minha vida nasceu muito depois
descobri que minha arma é o que a memória guarda dos tempos da Panair
Nada de triste existe que não se esqueça
alguém insiste e fala ao coração
tudo de triste existe e não se esquece
alguém insiste e fere no coração
nada de novo existe nesse planeta
que não se fale aqui na mesa de bar
E aquela briga e aquela fome de bola
e aquele tango e aquela dama da noite
e aquela mancha e a fala oculta
que no fundo do quintal morreu
morria a cada dia dos dias que eu vivi
cerveja que tomo hoje é apenas em memória dos tempos da Panair
a primeira Coca-Cola foi me lembro bem agora, nas asas da Panair
a maior das maravilhas foi voando sobre o mundo nas asas da Panair
Em volta dessa mesa velhos e moços
lembrando o que já foi
em volta dessa mesa existem outras falando tão igual
em volta dessas mesas existe a rua
vivendo seu normal
em volta dessa rua uma cidade sonhando seus metais
em volta da cidade
Fonte: encarte que acompanha o LP do álbum Minas (1975), de Milton Nascimento
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