08 dezembro 2008

Alma

Boris Pasternak

Pêsames, alma, sentes
por meus muitos amigos!
Agora és, de inocentes
e vítimas, jazigo.

Devoto à sua memória
(e os embalsamo) o canto,
a minha lira chora
quebrada de quebranto.

Em nossa era soturna,
tens consciência, medo
e guardas-lhes, qual urna,
as cinzas em segredo.

O seu sofrer conjunto
dobrou-te por inteiro,
cheiras a pó defunto,
a morgue e a cemitério.

Alma, que viste atenta
as mais cruéis agruras,
por fim, feito moenda,
moeste essa mistura.

Moeste, remoeste
e móis tanto de insano
num miasma podre nestes
quase quarenta anos.

Fonte: Campos, H.; Schnaiderman, B. & Archer, N. 1991. “Glasnost” e poesia. Revista USP 10: 104-8. Poema originalmente publicado em 1956.

0 Comentários:

Postar um comentário

<< Home

eXTReMe Tracker