Alma
Boris Pasternak
Pêsames, alma, sentes
por meus muitos amigos!
Agora és, de inocentes
e vítimas, jazigo.
Devoto à sua memória
(e os embalsamo) o canto,
a minha lira chora
quebrada de quebranto.
Em nossa era soturna,
tens consciência, medo
e guardas-lhes, qual urna,
as cinzas em segredo.
O seu sofrer conjunto
dobrou-te por inteiro,
cheiras a pó defunto,
a morgue e a cemitério.
Alma, que viste atenta
as mais cruéis agruras,
por fim, feito moenda,
moeste essa mistura.
Moeste, remoeste
e móis tanto de insano
num miasma podre nestes
quase quarenta anos.
Fonte: Campos, H.; Schnaiderman, B. & Archer, N. 1991. “Glasnost” e poesia. Revista USP 10: 104-8. Poema originalmente publicado em 1956.
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