Ao desconcerto humanamente aberto
Jorge de Sena
Ao desconcerto humanamente aberto
entendo e sinto: as coisas são reais
como meus olhos que as olharam tais
a luz ou treva que há no tempo certo.
De olhá-las muito não as vejo mais
que a luz mutável com que a treva perto
sempre outras as confunde: entreaberto,
menos que humano, só verei sinais.
E sinta que as pensei, ou que as senti
eu pense, ou julgue nos sinais que vi
ler a harmonia, como ali surpresa,
oculta que era para eu vê-la agora,
meu desconcerto é o desconcerto fora,
e Deus um só pudor da Natureza.
Fonte: Melo e Castro, E. M. 1973. O próprio poético. SP, Quíron. Poema publicado em livro em 1955.
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