23 fevereiro 2014

Efemeridade, efemeridade

Lindolf Bell

A palavra não é nebulosa estrela.
Sequer desarticulada ilha de afinidades.

Estopim aceso, sim, águas de inquietação,
a palavra não é jogo de dados.
Jogo de dúvidas, sim, dádivas,
dardos envenenados de selvagem silêncio.

Por um fio a palavra é prata.
Por um fio a palavra é pata de cavalo.
Por um fio, ato de injustiça.

Não há nenhuma pressa na palavra
em seu destino de lesma.
A palavra, flor justa se for bem usada.
A palavra de fogo-fátuo feita.
A palavra que não faz acordos em vão.

A palavra
é não dar com a língua nos dentes.
Ainda que arranquem a língua.
E cortem a palavra em pedaços
e a exponham em postes públicos da degradação.

Não é sempre a palavra
só tiro de festim.
Pode ser fim de linha.
Quimera, exato fingimento de vôo.
Nada, tudo, nunca e ninguém.
Assentimento, delicada práxis de afetos,
que somente se adivinha.

A palavra
que em breve
será a palavra dentro em breve.
A palavra
que se reveste de linho real
na linha real da vida:
efemeridade,
efemeridade.

Fonte (seis versos): Nejar, C. 2011. História da literaturabrasileira. SP, Leya. Poema publicado em livro em 1984.

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