Monólogo de um bisturi
Henrique Castriciano
“Primeiro o coração.
Rasguemo-lo. Suponho
Que esta mulher amou:
tudo está indicando
Que morreu por alguém
este ser miserando,
Misto de Treva e Sol, de
Maldade e de Sonho.
Isso não me comove:
adiante! Risonho
Fere, nevado gume! e,
ferindo e cortando,
Aço, mostra que tudo é
lama e nada, quando
Sobre os homens desaba o
Destino medonho...
Fere este braço grego! E
as pomas cor de neve!
E as linhas senhoris que
a pena não descreve!
E as delicadas mãos que o
pó vai dissolver!
Mas poupa o ventre nu,
onde repousa um feto:
Por que hás de macular o
sono fundo e quieto
Desse verme feliz que
morreu sem nascer?”
Fonte: Martins, W. 1978. História da inteligência brasileira,
vol. 5. SP, Cultrix & Edusp. Poema – com a dedicatória ‘A Papi Junior’ – publicado
em livro em 1903.
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