04 março 2016

Tempestade

Medeiros e Albuquerque

Andam por certo na floresta escura
sátiros ébrios sacudindo os troncos...
Há pavorosos e terríveis roncos
na goela estéril da montanha dura...

Chove... Desabam catadupas brutas
no dorso negro e funeral da terra...
Chispas rebrilham de medonhas lutas
de mil titãs em temerosa guerra...

A luz estende pelo ar funéreas
mortalhas brancas de esmaiada tinta;
dos astros louros e gentis – extinta,
não brilha a chama nas soidões etéreas.

O mar... o mar alucinado, doudo,
urra, empolando os vagalhões irados,
que sobre as praias arremessa a rodo,
com lastimosos, com plangentes brados...

E há quem agora a tiritar, medroso,
trema e, de prantos rorejando a prece,
a Deus implore que a bonança apresse,
que se desfaça o temporal iroso!

Oh! não!... Há sempre sob o firmamento
muito rugido! muita dor profunda!
Ninguém abafa o perenal lamento
que em vão de prantos a miséria inunda!

Tu, pois, Tormenta – p’ra que enfim acabe
da Dor o negro pesadelo infando –
vê se, em teus braços colossais o alçando,
fazes que o Cosmos com fragor desabe!

Vê se do Nada à solidão sombria
arrojas tudo com furor insano!
– Bem pode ser que na amplidão vazia
então se apague o sofrimento humano...

Fonte: Martins, W. 1977. História da inteligência brasileira, vol. 5. SP, Cultrix & Edusp. Poema – com a dedicatória ‘A Guimarães Passos’ – publicado em livro em 1889.

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