04 novembro 2017

Maré vasa


Expulsos do governo da cidade,
Descalços, pela noite, vimos todos
Restituir-Te, à flor dos nossos lodos,
A dádiva suprema da verdade.

Nós, o amor, ou antes: a pureza.
Nós, a virtude, ou antes: o sorriso.
Expulsos do terreno paraíso
E com a carne, para sempre, acesa.

E não foi mais que sonho o nosso crime!
E não foi mais que sopro o nosso abraço!
Mas todos Te seguimos, passo a passo,
À espera do remorso que redime...

Expiação de quê? De que pecados,
Se demos rumo eterno a tantas vidas?

Ó capitão das tropas esquecidas
Que, assim, deixas morrer os teus soldados!

Fonte: Silva, A. C. & Bueno, A., orgs. 1999. Antologia da poesia portuguesa contemporânea. RJ, Lacerda Editores. Poema publicado em livro em 1961.

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