O ponto avesso
Piero Pasolini
Paul A. M. Dirac era um dos jovens físicos teóricos, artífices da nova física quântica, derivada da grande descoberta de Planck, ou seja, do quantum de ação. Dirac era um gênio, do ponto de vista teórico. Manifestava uma aptidão especial para descobrir as mais profundas relações de qualquer situação física, mesmo das mais simples. Gostava mais de teorizar sobre todos os problemas da vida quotidiana, que de solucioná-los pela ação direta. Geralmente acertava em cheio. Em virtude de sua originalidade e de sua maneira de observar todas as coisas sob o prisma científico, chegava até a envolver-se em situações extremamente cômicas. Seus colegas, todos notáveis físicos deste século e, como ele, prêmios Nobel de Física dos anos 30, costumavam contar a seu respeito estorietas ‘científicas’ realmente curiosas. Como aquela de sua visita a um casal amigo, quando passou a reparar no modo como a senhora movimentava as agulhas para a confecção de uma peça de lã. Interrompendo repentinamente a conversa, dirigiu-se à mulher: “Observando o modo como você faz seu trabalho, passei a refletir sobre o aspecto topológico do problema. Existe somente um outro modo de fazê-lo: é assim”. E acompanhou suas últimas palavras com gestos apropriados dos seus longos dedos. “É verdade – respondeu a mulher – é o ponto avesso, que nós mulheres conhecemos muito bem”.
De um gênio desse tipo, tudo se poderia esperar. Mas talvez ninguém imaginasse que, com a mesma facilidade demonstrada na descoberta do ‘ponto avesso’, viesse a descobrir também o ‘avesso’ da matéria.
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Fonte: Pasolini, P. s/d [1976]. As grandes idéias que revolucionaram a ciência nos últimos cem anos. SP, Cidade Nova.
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