Vida e evolução
Theodosius Dobzhansky
Um homem é constituído
por aproximadamente sete octilhões (7 x 1027) de átomos, agrupados
em cerca de dez trilhões (1013) de células. Essa aglomeração de
células e átomos tem algumas propriedades assombrosas: é viva, experimenta
alegria e sofrimento, discrimina entre belo e feio, distingue o bem do mal. Há
muitas outras aglomerações vivas de átomos que pertencem a pelos menos dois ou talvez
quatro milhões de espécies biológicas. O mais notável é que os indivíduos de
cada uma dessas espécies são construídos de tal modo que são capazes de viver e
de se reproduzir em ambientes determinados. Em outras palavras, cada espécie é
adaptada a um certo modo de vida. Como isso aconteceu? Como é possível que
aglomerações de átomos realizem todas essas coisas?
Dois tipos de respostas
têm sido propostos. Os vitalistas admitem que os corpos vivos são formados por
intervenções de forças ocultas, que têm recebido variados nomes: enteléquia
(Aristóteles, Driesch), vis essentialis
(C. F. Wolff), psiquê ou direcionalidade inerente (Sinnott). Os mecanicistas,
por outro lado, alegam que todas as estruturas e processos biológicos são
configurações altamente elaboradas de fenômenos físicos e químicos. A vida pode
ser compreendida sem que seja necessário admitir poderes transcendentais.
Muitas vezes, porém nem
sempre, o vitalismo concorda com o criacionismo, i.e., com a crença de que o
mundo, como um todo, e as espécies vivas em particular, foram criados há alguns
milhares de anos atrás [sic] e, desde então, permanecem essencialmente
inalterados. Lamarck, Darwin e outros depois deles expuseram uma concepção
diferente: o mundo vivo que hoje observamos foi modelado durante bilhões de
anos de história evolutiva. Os organismos que vivem hoje evoluíram gradualmente
de antepassados que, em geral, eram cada vez mais diferentes de seus
descendentes à medida que remontamos a um passado cada vez mais remoto. Alguns
vitalistas não negam a evolução, mas querem crer que ela seja guiada na direção
de fins predestinados, por forças inescrutáveis. Darwin pensou de outro modo.
Ele postulou a seleção natural como um processo que impele e dirige as mudanças
evolutivas. As pesquisas posteriores justificaram, no conjunto, sua opinião. A
seleção natural é um fenômeno estritamente biológico, no sentido de que é uma
conseqüência da vida, e existe exclusivamente no mundo vivo. [...] A seleção
natural é uma configuração de eventos físicos, dependente da vida e restrita à
vida. Corpos vivos que evoluíram sob o controle da seleção natural podem ser
descritos como máquinas, embora máquinas de um tipo muito especial. (Para um
ponto de vista contrário, veja Polanyi 1968.)
[...]
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