Em estilo amável
Eugénio de Andrade
Chega ao fim o verão,
resta-me agora
a poesia a caminho da
prosa.
Pelo lado matinal
um gato pé ante pé
aproxima-se
de um pardal saltitando
entre as folhas amarelas.
“É o meu coração,
a luz é o meu coração”,
diz ele, e salta,
voa na tarde. O mar
recua, uma criança, vem
vindo pelo molhe,
canta canta,
não sabe ainda que o pai
não voltará
a casa. Um velho traz o
céu
azul pela mão, olha de
soslaio
os rapazes ao passar, ri
da praga humana
empurrando
as suas bolas de esterco.
Deus deve ser assim: afável,
simples de espírito,
distraído –
sem esterco que empurrar,
de tão velho.
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