10 setembro 2018

As vacas tresmalhadas

Alexandre O’Neill

As vacas tresmalhadas pelo asfalto
da cidade, fazem fugir quem passa.
Amarelo... Vermelho! Uma atravessa.
É apanhada, seco, dá um salto,

desentranha um mugido e, abatida,
põe nos olhos mansíssimos a vida.
Que pascigo escolheste, amável bicho?
Se não fora o olhar, já eras lixo.

Vaca malhada tresmalhada, vaca
de leite em sangue, atormentado nó
pulsando no asfalto, agora saca
dos misérrimos bofes o seu muuuu

derradeiro. Já sem dor ou protesto,
é da cidade a vaca mais um resto.

Fonte: Silva, A. C. & Bueno, A., orgs. 1999. Antologia da poesia portuguesa contemporânea. RJ, Lacerda Editores. Poema publicado em livro em 1969.

0 Comentários:

Postar um comentário

<< Home

eXTReMe Tracker