04 maio 2018

Hiroshima

John Hersey

Quase à meia noite, na noite anterior ao lançamento da bomba, um locutor de uma estação de rádio da cidade dizia que cerca de duzentos B-29 estavam se aproximando ao sul de Honshu, e aconselhava à população de Hiroshima que se recolhesse a suas ‘áreas de segurança’. A sra. Hatsuyo Nakamura, a viúva do alfaiate, que vivia no bairro chamado Nobori-cho, e que há muito tinha o hábito de fazer o que lhe mandavam, tirou da cama seus três filhos – um menino de dez anos, Toshio, uma menina de oito anos, Yaeko, e uma menina de cinco anos, Myeko –, vestiu-os e dirigiu-se com eles para a área militar conhecida como Campo do Nascente, localizada no limite norte da cidade. Lá desenrolou algumas esteiras, sobre as quais as crianças se deitaram. Dormiram até cerca de duas horas, quando foram despertadas pelo ronco dos aviões que sobrevoavam Hiroshima.

Assim que os aviões acabaram de passar, a sra. Nakamura voltou com as crianças para casa. Chegaram em casa um pouco depois das duas e trinta, e ela imediatamente ligou o rádio, que, para sua tristeza, estava começando a divulgar um novo aviso. Quando olhou para as crianças, e as viu tão cansadas, e quando se lembrou do número de viagens que haviam feito nas últimas semanas, todas sem propósito, ao Campo do Nascente, decidiu que, apesar das instruções dadas pelo rádio, simplesmente não poderia começar tudo outra vez. Colocou as crianças nas esteiras, sobre o assoalho, e deitou-se também, às três horas, dormindo logo em seguida, e tão pesadamente que não acordou quando os aviões passaram novamente mais tarde.
[...]

Fonte: Wallace, B. 1979 [1972]. Biologia social, v. 2. SP, EPU & Edusp. Trecho de livro publicado originalmente em 1946.

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