01 junho 2025

O zoo humano. I. Incesto, aborto, a falsa luta pró-vida e os perigos da consanguinidade

Felipe A. P. L. Costa.

APRESENTAÇÃO. – O incesto, o aborto e o filicídio são fenômenos naturais. São também problemas que atormentam e assombram mentes e corações. Tormentos e assombros esses que costumam ser explorados por gente oportunista. São explorados também por organizações criminosas, sobretudo seitas obscurantistas e partidos políticos de extrema direita. Em todos esses casos, o tripé tolerar o incesto, criminalizar o aborto e ignorar o filicídio é benquisto, seja como ideário pessoal, seja como agenda política. Este artigo adota a premissa de que o incesto, o aborto e o filicídio são problemas graves e sensíveis, diante dos quais todo e qualquer observador deve manter uma postura séria e crítica. O artigo tem dois objetivos: (i) expor algumas conexões (efetivas ou suspeitas) entre os problemas abordados; e (ii) chamar a atenção para certas inconsistências ou incongruências argumentativas que povoam o debate público sobre o aborto, mesmo quando o debate conta com a participação de renomados especialistas (e.g., médicos, psicólogos, juristas e autoridades religiosas). Para fins de publicação, o artigo foi dividido em dois. Esta é a parte I. O filicídio, entendido como o ato de alguém matar os próprios filhos, será o tema da parte II.

[PDF com o artigo completo pode ser lido ou capturado aqui.]

29 maio 2025

Lendo uma carta à janela


Federico Zandomeneghi (1841-1917). Palazzo Pretorio. 1865

Fonte da foto: Wikipedia.

27 maio 2025

Horas ígneas

Pedro Kilkerry

I.
Eu sorvo o haxixe do estio...
E evolve um cheiro, bestial,
Ao solo quente, como o cio
De um chacal.

Distensas, rebrilham sobre
Um verdor, flamâncias de asa...
Circula um vapor de cobre
Os montes – de cinza e brasa.

Sombras de voz hei no ouvido
– De amores ruivos, protervos –
E anda no céu, sacudido,
Um pó vibrante de nervos.

O mar faz medo... que espanca
A redondez sensual
Da praia, como uma anca
De animal.

II.
O Sol, de bárbaro, estangue,
Olho, em volúpia de cisma,
Por uma cor só do prisma,
Veleiras, as naus – de sangue...

III.
Tão longe levadas, pelas
Mãos de fluido ou braços de ar!
Cinge uma flora solar
– Grandes Rainhas – as velas.

Onda por onda ébria, erguida,
As ondas – povo do mar –
Tremem, nest’hora a sangrar,
Morrem – desejos da Vida!

IV.
Nem ondas de sangue... e sangue
Nem de uma nau – Morre a cisma.
Doiram-me as faces do prisma
Mulheres – flores – num mangue...

Fonte: Ricieri, F., org. 2008. Antologia da poesia simbolista e decadente brasileira. SP, Ibep. Poema publicado em livro póstumo em 1971.

26 maio 2025

Imaginando o fim

Edward Glover

A primeira promessa da era atômica é que ela pode fazer com que alguns de nossos pesadelos se tornem realidade. A capacidade dolorosamente adquirida pelos homens comuns de discernir entre o sono, a ilusão, a alucinação e a realidade objetiva da vida, foi, pela primeira vez na história da humanidade, seriamente abalada.

Fonte: Lifton, RJ. 1989 [1987]. O futuro da imortalidade. SP, Trajetória Cultural. Excerto de livro originalmente publicado em 1946.

24 maio 2025

Meu desejo

Álvares de Azevedo

Meu desejo? era ser a luva branca
Que essa tua gentil mãozinha aperta:
A camélia que murcha no teu seio,
O anjo que por te ver do céu deserta...

Meu desejo? era ser o sapatinho
Que teu mimoso pé no baile encerra...
A esperança que sonhas no futuro,
As saudades que tens aqui na terra...

Meu desejo? era ser o cortinado
Que não conta os mistérios do teu leito;
Era de teu colar de negra seda
Ser a cruz com que dormes sobre o peito.

Meu desejo? era ser o teu espelho
Que mais bela te vê quando deslaças
Do baile as roupas de escomilha e flores
E mira-te amoroso as nuas graças!

Meu desejo? era ser desse teu leito
De cambraia o lençol, o travesseiro
Com que velas o seio, onde repousas,
Solto o cabelo, o rosto feiticeiro...

Meu desejo? era ser a voz da terra
Que da estrela do céu ouvisse amor!
Ser o amante que sonhas, que desejas
Nas cismas encantadas de languor!

Fonte: Azevedo, A. 2006. Lira dos vinte anos. SP, Martin Claret. Poema publicado em livro em 1853.

23 maio 2025

Poliploidia

Gerhard Bandel

A poliploidia refere-se, de um modo geral, a todas as variações naturais ou induzidas no número de cromossomos. As variações surgem no número de genomas (conjuntos cromossômicos) e no número de cromossomos individuais, fenômenos comuns entre espécies vegetais e animais.

A evolução das plantas superiores deve muito ao aumento do número de cromossomos decorrentes da poliploidia, pois ela está espalhada entre musgos, samambaias e plantas superiores. Aproximadamente a metade das plantas cultivadas importantes é poliplóide; muitas destas são euplóides (tetraplóides, hexaplóides, etc.), possuindo número de cromossomso múltiplos do conjunto básico. Os novos poliplóides criados pelos geneticistas e melhoristas assumiram importância crescente na agricultura.

Em contraste com as plantas, nenhum dos animais comercialmente importantes são totalmente poliplóides, embora, esporadicamente, possam ser encontrados células e tecidos dessa natureza em todos os animais.

Fonte: Azevedo, J. L. & Costa, S. O. P., orgs. 1973. Exercícios práticos de genética. SP, Nacional & Edusp.

22 maio 2025

De quem é o tempo afinal?

Hermann Bondi

O tempo nunca deve ser imaginado como preexistente em qualquer sentido; ele é uma quantidade inventada.

Fonte: Davies, P. 1999. O enigma do tempo. RJ, Ediouro.

20 maio 2025

A expropriação das terras indígenas

Octavio Ianni

Na Amazônia, as terras tribais são importantes, pela extensão, qualidade ou localização. São numerosos os grupos tribais existentes na Amazônia; mais concentrados aqui, mais dispersos ali. Coletores, caçadores, agricultores, pescadores, sedentários, nômades. Espalham-se por muitas terras, matas, rios, igarapés. Vivem e trabalham a natureza como se ela fosse sua e dos seus deuses, nos seus trabalhos e dias. É verdade que alguns ou muitos grupos indígenas [se acham] em extinção; outros [se encontram] em contato permanente com a ‘comunhão nacional’ ou a ‘sociedade nacional’; outros, ainda, estão em contato intermitente com essa sociedade; e, outros, por fim, acham-se isolados, arredios ou hostis. Há índios que ainda guardam o seu modo de ser índio porque também guardam o seu modo de trabalhar a natureza; guardam o seu hábitat mais ou menos intacto, a seu modo. Mas a maioria já se acha em contato om a ‘comunhão’ ou ‘sociedade nacional’. Isto é, já se acha em um estágio preliminar, ou avançado, do processo de expropriação pelos ‘nacionais’, brasileiros e estrangeiros. A maioria está sendo expropriada da sua terra, força de trabalho, cultura. São muitos os índios que estão sendo proletarizados, acamponesados, lumpenizados ou pura e simplesmente dizimados. Em todos os casos, no entanto, o que está em causa é uma progressiva ou drástica expropriação das suas terras; do modo pelo qual trabalham a terra, as coisas, a sua existência e o próprio trabalho.

Fonte: Ianni, O. 1979. Ditadura e agricultura. RJ, Civilização.

18 maio 2025

Eros e Psiquê


Gaspare Landi (1756-1830). Amore e Psique. 1787-94.

Fonte da foto: Wikipedia.

16 maio 2025

O poder e a glória

Graham Greene

Sem pensar no que fazia, ele bebeu mais um gole de conhaque. Quando o líquido lhe tocou a língua lembrou-se da filha, entrando com a luz às suas costas: o rosto embirrado, triste, inteligente. Exclamou: “Meu Deus, ajude-a. Condene-me, eu mereço, mas deixe-a viver para sempre.” Este era o amor que deveria ter sentido por todas as criaturas do mundo: todo o amor e o desejo de salvar concentrados injustamente naquela única criança. Começou a chorar; era como se tivesse que observá-la da praia se afogando lentamente porque ele se esquecera como nadar. Pensou: Isto é o que eu deveria sentir todo o tempo por todo o mundo...

Fonte: Wright, R. 1996 [1994]. O animal moral. RJ, Campus. Excerto de livro publicado em 1940.

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