31 outubro 2021

O negro


João António Correia (1822-1896). O negro. 1869.

Fonte da foto: Wikipedia.

29 outubro 2021

Ciência e simplicidade

Nelson Goodman

Deve a ciência ser simples? Ou complexa, como é complexo o mundo? É a simplicidade uma necessidade, um luxo ou um vício? E o grau de simplicidade é determinável por medida objetiva, ou apenas por concepção pessoal?

Phillip Frank afirmou que sem simplicidade não há ciência. Se acrescentarmos, na mesma ordem de ideias, que sem ciência não há simplicidade, estaremos a caminho de entender muito do que diz respeito à ciência, à simplicidade e à relação entre elas.

Fonte: Goodman, N. 1979 [1967]. In: Morgenbesser, S. org. Filosofia da ciência. SP, Cultrix.

27 outubro 2021

Espaço e lugar no Grande Sertão: Veredas

Solange Terezinha de Lima

Em nosso estudo que originou o presente ensaio, desenvolvemos uma leitura e análise geográfica do romance Grande Sertão: Veredas, de João Guimarães Rosa, onde estabelecemos uma verdadeira travessia pelas paisagens dos Gerais, que influencia e reestrutura nossa percepção e apreensão das imagens desta unidade paisagística regional do estado de Minas Gerais. [...]

Finalmente, a análise geográfica de uma obra literária, a exemplo do Grande Sertão: Veredas, nos conduz a uma visão renovada da paisagem regional. Numa perspectiva holística que revela a sensibilidade e o valor da razão e do coração, a interpretação da paisagem real ou fictícia, porém vivida, nos permite a apreensão das mais diversas percepções e experiências ambientais, porque associa outras dimensões próprias da vida dos seres humanos e dos lugares a que pertencem, interações valorizadas em conformidade com a significância das diferentes transformações na própria forma de perceber, experienciar e criar seus lugares e suas raízes, enquanto símbolos de uma paisagem vivida.

Fonte: Lima, S. T. 1996. In: Del Rio, V. & Oliveira, L., orgs. Percepção ambiental: A experiência brasileira. São Carlos, Studio Nobel & Editora UFSCar.

25 outubro 2021

Brincando com fogo: Aumentou o risco de que um novo pesadelo venha a nos assombrar

Felipe A. P. L. Costa [*].

RESUMO. – Este artigo atualiza as estatísticas mundiais a respeito da pandemia da Covid-19 divulgadas em artigo anterior (aqui). No caso específico do Brasil, o artigo também atualiza os valores das taxas de crescimento (casos e mortes). Entre 18 e 24/10, as taxas ficaram em 0,0562% (casos) e 0,0558% (mortes). Em relação à semana anterior, ambas as taxas subiram. É uma notícia ruim e preocupante. Se não retomarmos a trajetória declinante de antes, corremos o risco de vivenciar o mesmo pesadelo que outros países estão a viver. É imperioso manter as medidas de proteção (e.g., uso generalizado de máscaras) e, sobretudo, acelerar o ritmo da campanha de vacinação.

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1. UM BALANÇO DA SITUAÇÃO MUNDIAL.

Levando em conta as estatísticas obtidas na manhã desta segunda-feira (25/10) [1], eis um balanço da situação mundial.

(A) Em números absolutos, os 20 países [2] mais afetados estão a concentrar 76% dos casos (de um total de 243.805.577) e 76% das mortes (de um total de 4.951.264) [3].

(B) Entre esses 20 países, a taxa de letalidade segue em 2%. A taxa brasileira segue em 2,8%. (Outros dois países da América do Sul que seguem no topo da lista têm taxas menores: Argentina, 2,2%; e Colômbia, 2,5%.)

(C) Nesses 20 países, receberam alta 168,2 milhões de indivíduos, o que corresponde a 90% dos casos. Em escala global, 221,6 milhões de indivíduos já receberam alta [4].

2. O RITMO DA PANDEMIA NO PAÍS.

Ontem (24/10), de acordo com o Ministério da Saúde, foram registrados em todo o país mais 6.204 casos e 187 mortes. Teríamos chegado assim a um total de 21.729.763 casos e 605.644 mortes.

Na semana encerrada ontem (18-24/10), foram registrados 85.299 novos casos – um aumento de 24% em relação ao total (68.644) da semana anterior.

E o pior: foram registradas 2.362 mortes – um aumento de 4% em relação ao total (2.271) da semana anterior.

3. TAXAS DE CRESCIMENTO.

Os percentuais e os números absolutos referidos acima ajudam a descrever a situação. Todavia, para monitorar o ritmo e o rumo da pandemia [5], sigo a usar as taxas de crescimento no número de casos e de mortes.

E ambas as taxas imbicaram, em um preocupante prenúncio de que uma nova trajetória ascendente poderia estar por vir (ver a figura que acompanha este artigo).

Vejamos os resultados mais recentes.

A taxa de crescimento no número de casos subiu muito, saltando do 0,0454% (11-17/10) para 0,0562% (18-24/10) [6]. (O resultado esperado para a semana passada era que esse valor ficasse em torno ou abaixo de 0,04% – ver aqui.)

A taxa de crescimento no número de mortes, por sua vez, subiu de 0,0539% (11-17/10) para 0,0558% (18-24/10) [6, 7].

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FIGURA. A figura que acompanha este artigo ilustra o comportamento das médias semanais das taxas de crescimento no número de casos (pontos em azul escuro) e no número de óbitos (pontos em vermelho escuro) em todo o país (valores expressos em porcentagem), entre 11/7 e 24/10/2021. (Para resultados anteriores, ver aqui.) Note que alguns pares de pontos são coincidentes ou quase isso. As retas expressam a trajetória média de cada uma das taxas, além de projetar o comportamento esperado delas nos próximos dias.

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4. CODA.

Contrariando o que era esperado, os valores das duas taxas (casos e mortes) subiram.

É uma notícia ruim e preocupante. Pois é como se estivéssemos a brincar com fogo.

Se não retomarmos a trajetória declinante da semana anterior, correremos o risco de vivenciar o mesmo pesadelo (i.e., ressurgências expressivas nas estatísticas) que outros países estão a viver ou viveram recentemente (e.g., EUA, Rússia, Reino Unido, diversos países do leste europeu [ver nota 2] e alguns dos nossos vizinhos, como Colômbia e Chile).

Para tornarmos a vislumbrar o ‘fim da pandemia’, é imperioso (1) manter as medidas de proteção (e.g., uso generalizado de máscaras) e, sobretudo, (2) acelerar o ritmo da campanha de vacinação [8].

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NOTAS.

[*] Há uma campanha de comercialização em curso envolvendo os livros do autor – ver o artigo Ciência e poesia em quatro volumes. Para mais informações ou para adquirir (por via postal) os quatro volumes (ou algum volume específico), faça contato pelo endereço meiterer@hotmail.com. Para conhecer outros artigos e livros, ver aqui.

[1] Vale notar que certos países atualizam suas estatísticas uma única vez ao longo do dia; outros atualizam duas vezes ou mais; e há uns poucos que estão a fazê-lo de modo mais ou menos errático. Acompanho as estatísticas mundiais em dois painéis, Mapping 2019-nCov (Johns Hopkins University, EUA) e Worldometer: Coronavirus (Dadax, EUA).

[2] Os 20 primeiros países da lista podem ser arranjados em sete grupos: (a) Entre 44 e 46 milhões de casos – Estados Unidos; (b) Entre 34 e 36 milhões – Índia; (c) Entre 20 e 22 milhões – Brasil; (d) Entre 8 e 10 milhões – Reino Unido e Rússia; (e) Entre 6 e 8 milhões – Turquia e França; (f) Entre 4 e 6 milhões – Irã, Argentina, Espanha, Colômbia, Itália, Alemanha e Indonésia; e (g) Entre 2 e 4 milhões – México, Polônia, África do Sul, Ucrânia, Filipinas e Malásia.

Analisando as estatísticas (casos e mortes) das últimas quatro semanas, eis como está a situação mundial: (i) em números absolutos, os EUA seguem na liderança, com 2,512 milhões de novos casos; (ii) a lista dos cinco primeiros tem ainda os seguintes países: Reino Unido (1,114 milhão de casos), Turquia (812 mil), Rússia (799 mil) e Índia (511 mil). O Brasil (378 mil) agora está em sétimo lugar; e (iii) a lista dos países com mais mortes segue sendo encabeçada pelos EUA (47 mil); em seguida aparecem Rússia (26,2 mil), Brasil (11,2 mil), México (10,8 mil) e Ucrânia (8,7 mil).

Em termos macrogeográficos, a região que mais preocupa hoje é o leste europeu. Ali, além da Rússia, as estatísticas de ao menos outros 13 países (Ucrânia, Romênia, Sérvia, Geórgia, Bulgária, Polônia, Eslováquia, Croácia, Tchéquia, Moldávia, Armênia, Estônia e Hungria) estão a escalar, notadamente o número de novos casos.

[3] Para detalhes e discussões a respeito do comportamento da pandemia desde março de 2020, tanto em escala mundial como nacional, ver qualquer um dos três primeiros volumes da coletânea A pandemia e a lenta agonia de um país desgovernado, vols. 1-5 (aqui, aqui, aqui, aqui e aqui).

[4] Como comentei em ocasiões anteriores, fui levado a promover a seguinte mudança metodológica: as estatísticas de casos e mortes continuam a seguir o painel Mapping 2019-nCov, enquanto as de altas estão agora a seguir o painel Worldometer: Coronavirus.

[5] Ouso dizer que a pandemia chegará ao fim sem que a imprensa brasileira se dê conta de que está a monitorar a pandemia de um jeito, digamos, desfocado – além de burocrático e superficial. Para capturar e antever a dinâmica de processos populacionais, como é o caso da disseminação de uma doença contagiosa, devemos recorrer a um parâmetro que tenha algum poder preditivo. Não é o caso da média móvel. Mas é o caso da taxa de crescimento – seja do número de casos, seja do número de mortes. Para detalhes e discussões a respeito do comportamento da pandemia desde março de 2020, em escala mundial e nacional, ver a referência citada na nota 3.

[6] Entre 19/10/2020 e 24/10/2021, as médias semanais exibiram os seguintes valores: (1) casos: 0,43% (19-25/10), 0,40% (26/10-1/11), 0,30% (2-8/11), 0,49% (9-15/11), 0,50% (16-22/11), 0,56% (23-29/11), 0,64% (30-6/12), 0,63% (7-13/12), 0,68% (14-20/12), 0,48% (21-27/12), 0,47% (28/12-3/1), 0,67% (4-10/1), 0,66% (11-17/1), 0,59% (18-24/1), 0,57% (25-31/1), 0,49%(1-7/2), 0,46% (8-14/2), 0,48% (15-21/2), 0,53% (22-28/2), 0,62% (1-7/3), 0,59% (8-14/3), 0,63% (15-21/3), 0,63% (22-28/3), 0,50% (29/3-4/4), 0,54% (5-11/4), 0,48% (12-18/4), 0,4026% (19-25/4), 0,4075% (26/4-2/5), 0,4111% (3-9/5), 0,4114% (10-16/5), 0,4115% (17-23/5), 0,38% (24-30/5), 0,37% (31/5-6/6), 0,39% (7-13/6), 0,4174% (14-20/6), 0,39% (21-27/6), 0,27% (28/6-4/7), 0,2419% (5-11/7), 0,21% (12-18/7), 0,23% (19-25/7), 0,1802% (26/7-1/8), 0,1621% (2-8/8), 0,14% (9-15/8), 0,1444% (16-22/8), 0,1183% (23-29/8), 0,1023% (30/8-5/9), 0,0744% (6-12/9), 0,1625% (13-19/9), 0,0753% (20-26/9), 0,0775% (27/9-3/10), 0,0715% (4-10/10), 0,0454% (11-17/10) e 0,0562% (18-24/10); e (2) mortes: 0,3% (19-25/10), 0,26% (26/10-1/11), 0,21% (2-8/11), 0,3% (9-15/11), 0,29% (16-22/11), 0,3% (23-29/11), 0,34% (30-6/12), 0,36% (7-13/12), 0,42% (14-20/12), 0,33% (21-27/12), 0,36% (28/12-3/1), 0,51% (4-10/1), 0,47% (11-17/1), 0,48% (18-24/1), 0,48% (25-31/1), 0,44%(1-7/2), 0,47% (8-14/2), 0,43% (15-21/2), 0,48% (22-28/2), 0,58% (1-7/3), 0,68% (8-14/3), 0,79% (15-21/3), 0,86% (22-28/3), 0,86% (29/3-4/4), 0,91% (5-11/4), 0,80% (12-18/4), 0,66% (19-25/4), 0,60% (26/4-2/5), 0,51% (3-9/5), 0,45% (10-16/5), 0,43% (17-23/5), 0,40% (24-30/5), 0,35% (31/5-6/6), 0,4171% (7-13/6), 0,4175% (14-20/6), 0,33% (21-27/6), 0,30% (28/6-4/7), 0,23% (5-11/7), 0,23% (12-18/7), 0,20% (19-25/7), 0,1785% (26/7-1/8), 0,1613% (2-8/8), 0,1492% (9-15/8), 0,1367% (16-22/8), 0,1185% (23-29/8), 0,1062% (30/8-5/9), 0,07870% (6-12/9), 0,0947% (13-19/9), 0,0890% (20-26/9), 0,0840% (27/9-3/10), 0,0730% (4-10/10), 0,0539% (11-17/10) e 0,0558% (18-24/10).

Não custa lembrar: Os valores acima são as médias semanais de uma taxa que, por razões metodológicas, está a oscilar ao longo da semana. Para fins de monitoramento, é importante ficar de olho nas taxas de crescimento (casos e mortes), não em valores absolutos. Considere uma taxa de crescimento de 0,5%. Se o total de casos no dia 1 está em 100.000, no dia 2 estará em 100.500 (= 100.000 x 1,005) e no dia 8 (sete dias depois), em 103.553 (= 100.000 x 1,0057; um acréscimo de 3.553 casos em relação ao dia 1); se o total no dia 1 está em 4.000.000, no dia 2 estará em 4.020.000 e no dia 8, em 4.142.118 (acréscimo de 142.118); se o no dia 1 o total está em 10.000.000, no dia 2 estará em 10.050.000 e no dia 8, em 10.355.294 (acréscimo de 355.294). Como se vê, embora os valores absolutos dos acréscimos referidos acima sejam muito desiguais (3.553, 142.118 e 355.294), todos equivalem ao mesmo percentual de aumento (~3,55%) em relação aos respectivos valores iniciais.

[7] Sobre o cálculo das taxas de crescimento, ver referência citada na nota 3.

[8] O ritmo da campanha de vacinação caiu muitíssimo. Levamos 34 dias (24/8-27/9) para ir de 60% a 70% da população com ao menos uma dose da vacina. (E hoje, 25/10, não chegamos sequer aos 75%!) Antes disso, porém, levamos 25 dias (9/7-3/8) para ir de 40% a 50% e apenas 21 dias (3-24/8) para ir de 50% a 60%. Sobre os percentuais, ver ‘Coronavirus (COVID-19) Vaccinations’ (Our World in Data, Oxford, Inglaterra).

Como escrevi em ocasiões anteriores, uma saída rápida para a crise (minimizando o número de novos casos e, sobretudo, o de mortes) dependeria de dois fatores: (i) a adoção de medidas efetivas de proteção e confinamento; e (ii) uma massiva e acelerada campanha de vacinação.

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23 outubro 2021

Rochas, minerais e minérios

Pedro W. Gonçalves & Roberto Perez Xavier

As rochas compõem-se de um agregado de minerais que são constituídos por um ou mais elementos químicos que se combinam de forma organizada na sua estrutura interna. 
Todos os metais que utilizamos, como o ferro, o manganês, o alumínio, o cobre, o ouro, o chumbo, e muitos outros, são extraídos dos minerais. Porém, o mais interessante é que os metais úteis não são abundantes na crosta terrestre e, geralmente, ocorrem em quantidades muito pequenas na estrutura dos minerais mais comuns das rochas. Por exemplo, o cobre ocorre na crosta em uma concentração de 0,005% e o ouro de 0,0000005%. Para se ter uma ideia, imagine que de cada um bilhão (1.000.000.000) de átomos na crosta, apenas 50.000 são de cobre e 5 são de ouro. Se não são abundantes, como estes metais podem ser extraídos dos minerais das rochas para fazer parte dos materiais que nós utilizamos?

Grandes concentrações de minerais contendo metais importantes não são encontradas facilmente na superfície terrestre, pois dependem de raros fenômenos geológicos. Eles são encontrados apenas em certos locais, chamados depósitos minerais, cujas condições favoreceram o seu acúmulo nas rochas em quantidades muito superiores à sua concentração média. Logo, depósitos minerais são concentrações de minerais na crosta terrestre a partir dos quais é possível a extração de metais ou compostos úteis para a sociedade. Por exemplo, o chumbo, o zinco e o cobre podem ser extraídos dos seguintes minerais: galena (sulfeto de chumbo), esfalerita (sulfeto de zinco) e a calcopirita (sulfeto de ferro e cobre). Se a extração do metal destes minerais for viável economicamente, ou seja, se houver lucro, a concentração de minerais nas rochas é considerada minério. Na realidade, então, o minério é uma rocha, pois é formado de minerais, mas é uma rocha que tem valor econômico.

Fonte: Gonçalves, P. W. & Xavier, R. P. 2000. O que você sempre quis saber sobre as pedras e nunca teve a quem perguntar... In: SBPC, org. Ciência Hoje na Escola, vol. 10. Geologia. RJ, SBPC.

21 outubro 2021

Esperando o sucesso


Henrique [César de Araújo] Pousão (1859-1884). Esperando o sucesso. 1882.

Fonte da foto: Wikipedia.

19 outubro 2021

Com 80% da população vacinados, a expansão da pandemia poderá ser ‘zerada’ até 7/11

Felipe A. P. L. Costa [*].

RESUMO. – Este artigo atualiza as estatísticas mundiais a respeito da pandemia da Covid-19 divulgadas em artigo anterior (aqui). No caso específico do Brasil, o artigo também atualiza os valores das taxas de crescimento (casos e mortes). Entre 11 e 17/10, essas taxas ficaram em 0,0454% (casos) e 0,0539% (mortes). São os valores mais baixos desde o início da pandemia. As duas taxas parecem ter retomado o ritmo de queda observado antes do ‘descarrego de setembro’ (ver aqui). No ritmo atual de queda, poderemos alcançar valores próximos ou inferiores a 0,01% ainda na primeira semana de novembro (1-7/11). Tal conquista, no entanto, dependerá da manutenção das medidas de proteção (e.g., uso generalizado de máscaras) e, sobretudo, do ritmo da campanha de vacinação.

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1. UM BALANÇO DA SITUAÇÃO MUNDIAL.

Levando em conta as estatísticas obtidas na manhã desta segunda-feira (18/10) [1], eis um balanço da situação mundial.

(A) Em números absolutos, os 20 países [2] mais afetados estão a concentrar 76% dos casos (de um total de 240.754.836) e 76% das mortes (de um total de 4.900.140) [3].

(B) Entre esses 20 países, a taxa de letalidade segue em 2%. A taxa brasileira segue em 2,8%. (Outros dois países da América do Sul que seguem no topo da lista têm taxas menores: Argentina, 2,2%; e Colômbia, 2,5%.)

(C) Nesses 20 países, receberam alta 166 milhões de indivíduos, o que corresponde a 90% dos casos. Em escala global, 219 milhões de indivíduos já receberam alta [4].

2. O RITMO DA PANDEMIA NO PAÍS.

Ontem (17/10), de acordo com o Ministério da Saúde, foram registrados em todo o país mais 5.738 casos e 130 mortes. Teríamos chegado assim a um total de 21.644.464 casos e 603.282 mortes.

Na semana encerrada ontem (11-17/10), foram registrados 68.644 novos casos – uma queda de 36% em relação ao total (107.699) da semana anterior.

Desgraçadamente, porém, ainda foram registradas 2.271 mortes – uma queda de quase 26% em relação ao total (3.063) da semana anterior.

3. TAXAS DE CRESCIMENTO.

Os percentuais e os números absolutos referidos acima ajudam a descrever a situação. Todavia, para monitorar o ritmo e o rumo da pandemia [5], sigo a usar as taxas de crescimento no número de casos e de mortes.

E ambas as taxas permanecem na trajetória descendente que reassumiram após o ‘descarrego de setembro’ (ver a figura que acompanha este artigo).

Vejamos os resultados mais recentes.

A taxa de crescimento no número de casos caiu de 0,0715% (4-10/10) para 0,0454% (11-17/10) [6].

A taxa de crescimento no número de mortes, por sua vez, caiu de 0,0730% (4-10/10) para 0,0539% (11-17/10) [6, 7].

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FIGURA. Comportamento das médias semanais das taxas de crescimento no número de casos (pontos em azul escuro) e no número de óbitos (pontos em vermelho escuro) em todo o país (valores expressos em porcentagem), entre 11/7 e 17/10/2021. (Para resultados anteriores, ver aqui.) Note que alguns pares de pontos são coincidentes ou quase isso. As retas expressam a trajetória média de cada uma das taxas, além de projetar o comportamento esperado delas nos próximos dias.

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4. CODA.

Os valores referidos acima são os mais baixos desde o início da pandemia. As duas taxas parecem ter retomado o ritmo de queda observado antes do ‘descarrego de setembro’ (ver aqui). No ritmo atual de queda, poderemos alcançar valores próximos ou inferiores a 0,01% ainda na primeira semana de novembro (1-7/11).

Tal conquista, no entanto, não será espontânea nem depende de mágica. O ‘fim da pandemia’ depende da manutenção das medidas de proteção (e.g., uso generalizado de máscaras) e, sobretudo, do ritmo da campanha de vacinação. A campanha precisa ser acelerada, de sorte que 80% da população estejam vacinados com ao menos uma dose até 29/10 [8].

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NOTAS.

[*] Há uma campanha de comercialização em curso envolvendo os livros do autor – ver o artigo Ciência e poesia em quatro volumes. Para mais informações ou para adquirir (por via postal) os quatro volumes (ou algum volume específico), faça contato pelo endereço meiterer@hotmail.com. Para conhecer outros artigos e livros, ver aqui.

[1] Vale notar que certos países atualizam suas estatísticas uma única vez ao longo do dia; outros atualizam duas vezes ou mais; e há uns poucos que estão a fazê-lo de modo mais ou menos errático. Acompanho as estatísticas mundiais em dois painéis, Mapping 2019-nCov (Johns Hopkins University, EUA) e Worldometer: Coronavirus (Dadax, EUA).

[2] Os 20 primeiros países da lista podem ser arranjados em sete grupos: (a) Entre 44 e 46 milhões de casos – Estados Unidos; (b) Entre 34 e 36 milhões – Índia; (c) Entre 20 e 22 milhões – Brasil; (d) Entre 8 e 10 milhões – Reino Unido; (e) Entre 6 e 8 milhões – Rússia, Turquia e França; (f) Entre 4 e 6 milhões – Irã, Argentina, Espanha, Colômbia, Itália, Alemanha e Indonésia; e (g) Entre 2 e 4 milhões – México, Polônia, África do Sul, Ucrânia, Filipinas e Malásia.

Analisando as estatísticas (casos e mortes) das últimas quatro semanas, eis como está a situação mundial: (i) em números absolutos, os EUA seguem na liderança, com 2,839 milhões de novos casos; (ii) a lista dos cinco primeiros tem ainda os seguintes países: Reino Unido (1,024 milhão de casos), Turquia (783 mil), Rússia (700 mil) e Índia (603 mil). O Brasil está em sexto (405 mil); e (iii) a lista dos países com mais mortes segue sendo encabeçada pelos EUA (49,6 mil); em seguida aparecem Rússia (24,7 mil), México (12,9 mil), Brasil (12,5 mil) e Índia (7,2 mil).

[3] Para detalhes e discussões a respeito do comportamento da pandemia desde março de 2020, tanto em escala mundial como nacional, ver qualquer um dos três primeiros volumes da coletânea A pandemia e a lenta agonia de um país desgovernado, vols. 1-5 (aqui, aqui, aqui, aqui e aqui).

[4] Como comentei em ocasiões anteriores, fui levado a promover a seguinte mudança metodológica: as estatísticas de casos e mortes continuam a seguir o painel Mapping 2019-nCov, enquanto as de altas estão agora a seguir o painel Worldometer: Coronavirus.

[5] Ouso dizer que a pandemia chegará ao fim sem que a imprensa brasileira se dê conta de que está a monitorar a pandemia de um jeito, digamos, desfocado – além de burocrático e superficial. Para capturar e antever a dinâmica de processos populacionais, como é o caso da disseminação de uma doença contagiosa, devemos recorrer a um parâmetro que tenha algum poder preditivo. Não é o caso da média móvel. Mas é o caso da taxa de crescimento – seja do número de casos, seja do número de mortes. Para detalhes e discussões a respeito do comportamento da pandemia desde março de 2020, em escala mundial e nacional, ver a referência citada na nota 3.

[6] Entre 19/10/2020 e 17/10/2021, as médias semanais exibiram os seguintes valores: (1) casos: 0,43% (19-25/10), 0,40% (26/10-1/11), 0,30% (2-8/11), 0,49% (9-15/11), 0,50% (16-22/11), 0,56% (23-29/11), 0,64% (30-6/12), 0,63% (7-13/12), 0,68% (14-20/12), 0,48% (21-27/12), 0,47% (28/12-3/1), 0,67% (4-10/1), 0,66% (11-17/1), 0,59% (18-24/1), 0,57% (25-31/1), 0,49%(1-7/2), 0,46% (8-14/2), 0,48% (15-21/2), 0,53% (22-28/2), 0,62% (1-7/3), 0,59% (8-14/3), 0,63% (15-21/3), 0,63% (22-28/3), 0,50% (29/3-4/4), 0,54% (5-11/4), 0,48% (12-18/4), 0,4026% (19-25/4), 0,4075% (26/4-2/5), 0,4111% (3-9/5), 0,4114% (10-16/5), 0,4115% (17-23/5), 0,38% (24-30/5), 0,37% (31/5-6/6), 0,39% (7-13/6), 0,4174% (14-20/6), 0,39% (21-27/6), 0,27% (28/6-4/7), 0,2419% (5-11/7), 0,21% (12-18/7), 0,23% (19-25/7), 0,1802% (26/7-1/8), 0,1621% (2-8/8), 0,14% (9-15/8), 0,1444% (16-22/8), 0,1183% (23-29/8), 0,1023% (30/8-5/9), 0,0744% (6-12/9), 0,1625% (13-19/9), 0,0753% (20-26/9), 0,0775% (27/9-3/10), 0,0715% (4-10/10) e 0,0454% (11-17/10); e (2) mortes: 0,3% (19-25/10), 0,26% (26/10-1/11), 0,21% (2-8/11), 0,3% (9-15/11), 0,29% (16-22/11), 0,3% (23-29/11), 0,34% (30-6/12), 0,36% (7-13/12), 0,42% (14-20/12), 0,33% (21-27/12), 0,36% (28/12-3/1), 0,51% (4-10/1), 0,47% (11-17/1), 0,48% (18-24/1), 0,48% (25-31/1), 0,44%(1-7/2), 0,47% (8-14/2), 0,43% (15-21/2), 0,48% (22-28/2), 0,58% (1-7/3), 0,68% (8-14/3), 0,79% (15-21/3), 0,86% (22-28/3), 0,86% (29/3-4/4), 0,91% (5-11/4), 0,80% (12-18/4), 0,66% (19-25/4), 0,60% (26/4-2/5), 0,51% (3-9/5), 0,45% (10-16/5), 0,43% (17-23/5), 0,40% (24-30/5), 0,35% (31/5-6/6), 0,4171% (7-13/6), 0,4175% (14-20/6), 0,33% (21-27/6), 0,30% (28/6-4/7), 0,23% (5-11/7), 0,23% (12-18/7), 0,20% (19-25/7), 0,1785% (26/7-1/8), 0,1613% (2-8/8), 0,1492% (9-15/8), 0,1367% (16-22/8), 0,1185% (23-29/8), 0,1062% (30/8-5/9), 0,07870% (6-12/9), 0,0947% (13-19/9), 0,0890% (20-26/9), 0,0840% (27/9-3/10), 0,0730% (4-10/10) e 0,0539% (11-17/10).

Não custa lembrar: Os valores acima são as médias semanais de uma taxa que, por razões metodológicas, está a oscilar ao longo da semana. Para fins de monitoramento, é importante ficar de olho nas taxas de crescimento (casos e mortes), não em valores absolutos. Considere uma taxa de crescimento de 0,5%. Se o total de casos no dia 1 está em 100.000, no dia 2 estará em 100.500 (= 100.000 x 1,005) e no dia 8 (sete dias depois), em 103.553 (= 100.000 x 1,0057; um acréscimo de 3.553 casos em relação ao dia 1); se o total no dia 1 está em 4.000.000, no dia 2 estará em 4.020.000 e no dia 8, em 4.142.118 (acréscimo de 142.118); se o no dia 1 o total está em 10.000.000, no dia 2 estará em 10.050.000 e no dia 8, em 10.355.294 (acréscimo de 355.294). Como se vê, embora os valores absolutos dos acréscimos referidos acima sejam muito desiguais (3.553, 142.118 e 355.294), todos equivalem ao mesmo percentual de aumento (~3,55%) em relação aos respectivos valores iniciais.

[7] Sobre o cálculo das taxas de crescimento, ver referência citada na nota 3.

[8] O ritmo da campanha de vacinação caiu muitíssimo. Levamos 34 dias (24/8-27/9) para ir de 60% a 70% da população com ao menos uma dose da vacina. Antes disso, porém, levamos 25 dias (9/7-3/8) para ir de 40% a 50% e apenas 21 dias (3-24/8) para ir de 50% a 60%. Sobre os percentuais, ver ‘Coronavirus (COVID-19) Vaccinations’ (Our World in Data, Oxford, Inglaterra).

Como escrevi em ocasiões anteriores, uma saída rápida para a crise (minimizando o número de novos casos e, sobretudo, o de mortes) dependeria de dois fatores: (i) a adoção de medidas efetivas de proteção e confinamento; e (ii) uma massiva e acelerada campanha de vacinação.

* * *

17 outubro 2021

Fazendo nada

José Geraldo

De estar à toa não me atrapalho;
Que coisa boa não ter trabalho...

Não me atrapalho de estar à toa;
Não ter trabalho, que coisa boa...

Fico cismando comigo mesmo,
Sem compromisso, sem hora certa,
Desocupado, vagando a esmo,
E nada pede que eu fique alerta...

Vem-me a vontade de fazer versos...
Pena a paineira não ’star florida...
E eu faço versos como quem brinca,
Que isso faz parte da minha vida...

Ficar à toa tem mil facetas...
Para que a todas vá-me entregando,
Me entrego a uma, me entrego a outra,
E assim vario de vez em quando...

Sem rumo certo, vou nos meus passos
E entre outras vozes pelo arvoredo,
Eu ouço os melros, ouço os sanhaços.
O Sol se esconde; são mil estilos,
São mil toadas que se entrelaçam,
Em que ouço os sapos, em que ouço os grilos.

Entre as estrelas, dois luminares
Vejo brilhando, muito serenos:
Pelo Oriente Júpiter brilha,
Pelo Ocidente quem brilha é Vênus...
Inda co’os olhos no firmamento,
Em descuidada contemplação,
Eu vejo a Lua quarto crescente
Dentro das presas do Escorpião...

Se durmo, durmo, se acordo, acordo,
Sem que me importe se é cedo ou tarde
E algumas vezes já estou de fora
Quando as estrelas inda cintilam,
Quando inda dormem os passarinhos,
Quando inda é tempo de ver a Aurora...

Recorro aos livros, escolho um deles,
Faço a leitura do meu agrado,
Leio o que quero, nem mais nem menos,
E deixo o livro se estou cansado...

Eu ando ausente de ver as horas,
O meu relógio pouco interessa,
Que o Sol me indica quanto me basta
E a vida mansa não me dá pressa...

Fazendo apenas o que dá gosto,
Eu sinto o voo do beija-flor
E esqueço as penas que há neste mundo,
Nos braços quentes do meu amor...

Não me perturba viver assim...
Seja bem cedo, de madrugada,
Seja de dia, seja de noite,
Que coisa boa que é fazer nada...

Fonte: Horta, A. B. 2016. Do que é feito o poeta. Brasília, Thesaurus. Poema publicado em livro em 1981.

15 outubro 2021

Anticorpos

Ana Paula Ferreira & Henrique Couto Teixeira

Os efeitos protetores da imunidade humoral são mediados por uma família de glicoproteínas estruturalmente afins chamadas anticorpos. [...]

Apesar da grande semelhante entre os diferentes tipos ou classes de anticorpos, as classe e subclasses de anticorpos podem ser divididas com base em diferentes características físico-químicas, como tamanho, carga e solubilidade, e também dependendo de suas características funcionais. No homem, as classes de anticorpos são chamadas IgM, IgD, IgG, IgE e IgA. Os isótipos de IgA e IgG podem ser ainda subdivididos em subclasses ou subtipos intimamente relacionados chamados IgA1, IgA2, e IgG1, IgG2, IgG3 e IgG4, respectivamente.

Fonte: Ferreira, A. P. & Teixeira, H. C. 2005. Tópicos de imunologia básica. Juiz de Fora, Edição do Autor.

13 outubro 2021

O balde azul


José Júlio de Souza Pinto (1856-1939). O balde azul. 1907.

Fonte da foto: Wikipedia.

12 outubro 2021

Aniversário de 15 anos

F. Ponce de León

Nesta terça-feira, 12/10, o Poesia contra a guerra completa 15 anos no ar (2006-2021).

Nos últimos 12 meses, foram publicados aqui pela primeira vez textos de 87 novos autores, além de textos de autores que já haviam sido publicados antes – ver ‘Aniversário de 14 anos’ e balanços anteriores.

Eis a lista dos estreantes:

Ada Negri, Alan Viggiano, Alcy Gomes da Fonseca, Alda do Espírito Santo, Angelus Silesius, Anibal Alves de Carvalho Jr., Antônio Carlos Santini & Arthur H. Nethercot;

Benjamin Disraeli & Brian Huntley;

Claus G. Keidel, Clifford C. Furnas & Colin Clark;

David A. Humphries, David Krech, David M. Raup & Donald P. Bennett;

Edson Guedes de Morais, Eneas Salati & Enric Mompó Martinez;

Fernanda Bered, Fernando Dias de Ávila-Pires, Francis Thompson & Frederick E. Flynn;

George Gordon Byron, Gerald Durrell, Gerôncio Albuquerque Rocha & Gideon Sjoberg;

Harrison Brown, Henri Laborit & Hermann Flohn;

Isaac Watts, Ivan Sazima & Ives Gandra Martins;

J. Z. Young, Jofre Rocha, John Gribbin, John Hedgecoe, John O. Browder, John Taylor, Jon C. Herron, José Albertino Rafael, Joseph Dietzgen, Joseph Weizenbaum & Jurema S. A. Dias;

Kenneth E. Boulding & Kingsley Davis;

Lewis Hill, Lewis R. Binford & Luís Paulo Piassi;

Manuel Leote Esquível, Marcel Hicter, Maria Braga Horta, Maria de Nazaré Góes Ribeiro, Maria Tereza, Mark Ridley, Mauricio Salazar Yepes & Morse Peckham;

Oskar Morgenstern;

Paul-Jean Toulet, Paulo D. Ferreira Jr., Per Christian Braathen, Peter H. Raven, Pierre Reverdy & Platão;

R. J. Palacio, Ray F. Evert, René Millon, Ricardo Hirata, Robert Hayden, Rodrigo Dias Társia & Roy A. Rappoport;

Sade Adu, Sally R. Binford, Salvador Luria, Samuel Johnson, Scott Freeman, Siegfried Wiechowski, Stanley Coren & Susan E. Eichorn;

Tânia Andrade Lima & Tetê Espíndola;

Umberto G. Cordani;

Valdeir Del Conti & Valéria S. Bezerra; e

Werner Altmann & Wilton S. Dias.

Cabe ainda registrar a publicação de imagens de obras de 31 pintores, a saber: Alessandro Allori, Alonso Sánchez Coello & Anthonis Mor van Dashorst; Dosso Dossi; Charles Chaplin, Claude Déruet & Cristófano Allori; Edwin Landseer, Étienne Dinet & Eva Gonzalès; Francesco Guardi & François Clouet; Giambattista Tiepolo & Giorgio Vasari; Henry Raeburn & Hubert von Herkomer; Jacopo Bassano, John Russell, Joseph Farington, Lorenzo Lotto & Louise Jopling; Marie Spartali Stillman; Paul Sandby, Phoebe Anna Traquair & Prospero Fontana; Richard Wilson & Rosalba Carriera; Thomas Girtin. Thomas Lawrence & Thomas Phillips; e William Bell Scott.

10 outubro 2021

¡Aleluya!

Rubén Darío

A Manuel Machado.

Rosas rosadas y blancas, ramas verdes,
corolas frescas y frescos
ramos, ¡Alegría!

Nidos en los tibios árboles,
huevos en los tibios nidos,
dulzura, ¡Alegría!

El beso de esa muchacha
rubia, y el de esa morena,
y el de esa negra, ¡Alegría!

Y el vientre de esa pequeña
de quince años, y sus brazos
armoniosos, ¡Alegría!

Y el aliento de la selva virgen,
y el de las vírgenes hembras,
y las dulces rimas de la Aurora,
¡Alegría, Alegría, Alegría!

Fonte (último verso): Carpeaux, O. M. 2011. História da literatura ocidental, vol. 4. Brasília, Senado Federal. Poema publicado em livro em 1905.

08 outubro 2021

Fio de cabelo

Tetê Espíndola

Fio de cabelo ao lado do rio
É como um rio de cabelos que toca o fio
Da corda acorda
Toca fio corda fio
Balança com o vento o fio de cabelo
O dedo que toca na nota do fio

Fonte: álbum Pássaros na garganta (1982), de Tetê Espíndola.

06 outubro 2021

Como o ritmo lento da vacinação e a liberação precipitada estariam a prolongar a pandemia

Felipe A. P. L. Costa [*].

RESUMO. – Este artigo atualiza as estatísticas mundiais a respeito da pandemia da Covid-19 divulgadas em artigo anterior (aqui). No caso específico do Brasil, o artigo também atualiza os valores das taxas de crescimento (casos e mortes). Entre 27/9 e 3/10, essas taxas ficaram em 0,0775% (casos) e 0,0840% (mortes). Tais valores estão acima do esperado – ambos já deveriam ter caído para algo em torno de 0,05% (ver aqui). A estagnação atual seria resultado de uma combinação envolvendo ao menos dois fatores: queda (acentuada) no ritmo da vacinação e suspensão (precipitada) das medidas restritivas.

*

1. UM BALANÇO DA SITUAÇÃO MUNDIAL.

Levando em conta as estatísticas obtidas no fim da tarde de ontem (3/10) [1], eis um balanço da situação mundial.

(A) Em números absolutos, os 20 países [2] mais afetados estão a concentrar agora 76% dos casos (de um total de 234.858.305) e 76% das mortes (de um total de 4.800.518) [3].

(B) Entre esses 20 países, a taxa de letalidade segue em 2%. A taxa brasileira segue em 2,8%. (Outros dois países da América do Sul que seguem no topo da lista têm as seguintes taxas: Argentina, 2,2%; e Colômbia, 2,5%.)

(C) Nesses 20 países, receberam alta 162 milhões de indivíduos, o que corresponde a 90% dos casos. Em escala global, 212 milhões de indivíduos já receberam alta [4].

2. O RITMO DA PANDEMIA NO PAÍS.

Ontem (3/10), de acordo com o Ministério da Saúde, foram registrados em todo o país mais 9.004 casos e 225 mortes. Teríamos chegado assim a um total de 21.468.121 casos e 597.948 mortes.

Na semana encerrada ontem (27/9-3/10), foram registrados 116.149 novos casos – um aumento de 3,5% em relação ao total (112.189) da semana anterior.

Desgraçadamente, porém, ainda foram registradas 3.505 mortes – uma queda de 5% em relação ao total (3.691) da semana anterior.

3. TAXAS DE CRESCIMENTO.

Os percentuais e os números absolutos referidos acima ajudam a descrever a situação. Mas eles pouco ou nada informam sobre o ritmo e o rumo da pandemia [5]. Para tanto, sigo a usar as taxas de crescimento no número de casos e de mortes.

Vejamos os resultados mais recentes.

A taxa de crescimento no número de casos subiu de 0,0753% (20-26/9) para 0,0775% (27/9-3/10) [6].

A taxa de crescimento no número de mortes, por sua vez, caiu de 0,0890% (20-26/9) para 0,0840% (27/9-3/10) [6, 7].

*

FIGURA. Comportamento das médias semanais das taxas de crescimento no número de casos (pontos em azul escuro) e no número de óbitos (pontos em vermelho escuro) em todo o país (valores expressos em porcentagem), entre 28/6/2020 e 3/10/2021. (Valores acima de 2% não são mostrados.) Uma primeira sucessão prolongada de médias baixas nas duas séries (casos e mortes) foi observada entre 11/10 e 8/11, razão pela qual o período é referido aqui como o melhor mês. Logo em seguida, porém, note como as duas nuvens de pontos experimentaram rupturas e mudaram de rumo. E note como o apagão que houve na divulgação das estatísticas, na segunda quinzena de dezembro, rebaixou artificialmente as duas trajetórias. A campanha de vacinação teve início em 17/1. Os percentuais em azul escuro (1%, 10% etc.) ao longo do eixo horizontal indicam a parcela da população brasileira vacinada com ao menos uma dose [8]. A chamada CPI da Covid foi oficialmente instalada em 27/4.

*

4. MÁSCARAS ESTÃO A SALVAR VIDAS.

Após semanas sucessivas de quedas, as trajetórias das duas taxas empacaram (ver a figura que acompanha este artigo). O que seria resultado de uma combinação envolvendo ao menos dois fatores: (1) queda (acentuada) no ritmo da vacinação; e (2) suspensão (precipitada) das medidas restritivas.

O ritmo da campanha caiu muitíssimo. Levamos 34 dias (24/8-27/9) para ir de 60% a 70% da população com ao menos uma dose da vacina. Antes disso, porém, levamos 25 dias (9/7-3/8) para ir de 40% a 50% e apenas 21 dias (3-24/8) para ir de 50% a 60%.

A suspensão das medidas restritivas, por sua vez, tem sido rápida e ampla demais. O que só tem favorecido a disseminação do vírus. Não surpreende que a taxa de crescimento no número de novo casos tenha recrudescido (ver a figura que acompanha este artigo).

De resto, ouso dizer que a situação brasileira só não está tão ruim como a dos Estados Unidos por causa do uso mais ou menos generalizado de máscaras por aqui (além de outras medidas não farmacológicas).

5. CODA.

Como eu ressaltei em artigos anteriores, entre as medidas que poderiam reverter a tendência declinante observada recentemente (ver a figura que acompanha este artigo), eu citaria três: (i) suspender ou afrouxar (ainda mais) as barreiras sanitárias impostas em aeroportos; (ii) suspender ou afrouxar (ainda mais) as medidas sanitárias internas (e.g., permitir grandes aglomerações e tornar facultativo o uso de máscara); e (iii) atrasar (ainda mais) a campanha de vacinação [9].

Não custa repetir: Quanto mais gente a circular ou quanto mais lenta for a vacinação, maior será o número de mortes. E mais: maiores serão as chances de que surjam variantes ainda mais infecciosas ou letais.

Em resumo, ainda não é hora de promover uma liberação ampla, geral e irrestrita.

*

NOTAS.

[*] Há uma campanha de comercialização em curso envolvendo os livros do autor – ver o artigo Ciência e poesia em quatro volumes. Para mais informações ou para adquirir (por via postal) os quatro volumes (ou algum volume específico), faça contato pelo endereço meiterer@hotmail.com. Para conhecer outros artigos e livros, ver aqui.

[1] Vale notar que certos países atualizam suas estatísticas uma única vez ao longo do dia; outros atualizam duas vezes ou mais; e há uns poucos que estão a fazê-lo de modo mais ou menos errático. Acompanho as estatísticas mundiais em dois painéis, Mapping 2019-nCov (Johns Hopkins University, EUA) e Worldometer: Coronavirus (Dadax, EUA).

[2] Os 20 primeiros países da lista podem ser arranjados em seis grupos: (a) Entre 42 e 44 milhões de casos – Estados Unidos; (b) Entre 32 e 34 milhões – Índia; (c) Entre 20 e 22 milhões – Brasil; (d) Entre 6 e 8 milhões – Reino Unido, Rússia, Turquia e França; (e) Entre 4 e 6 milhões – Irã, Argentina, Espanha, Colômbia, Itália, Alemanha e Indonésia; e (f) Entre 2 e 4 milhões – México, Polônia, África do Sul, Filipinas, Ucrânia e Malásia.

Analisando as estatísticas (casos e mortes) das últimas quatro semanas, eis como está a situação mundial: (i) em números absolutos, os EUA seguem na liderança, com 3,659 milhões de novos casos; (ii) a lista dos cinco primeiros tem ainda os seguintes países: Reino Unido (934 mil casos), Índia (825 mil), Turquia (703 mil) e Brasil (581 mil); e (iii) a lista dos países com mais mortes segue sendo encabeçada pelos EUA (52,3 mil); em seguida aparecem Rússia (22,2 mil), México (15,7 mil), Brasil (14,4 mil) e Irã (10,8 mil).

[3] Para detalhes e discussões a respeito do comportamento da pandemia desde março de 2020, tanto em escala mundial como nacional, ver qualquer um dos três primeiros volumes da coletânea A pandemia e a lenta agonia de um país desgovernado, vols. 1-5 (aqui, aqui, aqui, aqui e aqui).

[4] Como comentei em ocasiões anteriores, fui levado a promover a seguinte mudança metodológica: as estatísticas de casos e mortes continuam a seguir o painel Mapping 2019-nCov, enquanto as de altas estão agora a seguir o painel Worldometer: Coronavirus.

[5] Ouso dizer que a pandemia chegará ao fim sem que uma boa parte da imprensa brasileira se dê conta de que está a monitorar a pandemia de um jeito, digamos, desfocado – além de burocrático e bastante superficial. Para capturar e antever a dinâmica de processos populacionais, como é o caso da disseminação de uma doença contagiosa, devemos recorrer a um parâmetro que tenha algum poder preditivo. Não é o caso da média móvel. Mas é o caso da taxa de crescimento – seja do número de casos, seja do número de mortes. Para detalhes e discussões a respeito do comportamento da pandemia desde março de 2020, em escala mundial e nacional, ver a referência citada na nota 3.

[6] Entre 19/10/2020 e 26/9/2021, as médias semanais exibiram os seguintes valores: (1) casos: 0,43% (19-25/10), 0,40% (26/10-1/11), 0,30% (2-8/11), 0,49% (9-15/11), 0,50% (16-22/11), 0,56% (23-29/11), 0,64% (30-6/12), 0,63% (7-13/12), 0,68% (14-20/12), 0,48% (21-27/12), 0,47% (28/12-3/1), 0,67% (4-10/1), 0,66% (11-17/1), 0,59% (18-24/1), 0,57% (25-31/1), 0,49%(1-7/2), 0,46% (8-14/2), 0,48% (15-21/2), 0,53% (22-28/2), 0,62% (1-7/3), 0,59% (8-14/3), 0,63% (15-21/3), 0,63% (22-28/3), 0,50% (29/3-4/4), 0,54% (5-11/4), 0,48% (12-18/4), 0,4026% (19-25/4), 0,4075% (26/4-2/5), 0,4111% (3-9/5), 0,4114% (10-16/5), 0,4115% (17-23/5), 0,38% (24-30/5), 0,37% (31/5-6/6), 0,39% (7-13/6), 0,4174% (14-20/6), 0,39% (21-27/6), 0,27% (28/6-4/7), 0,2419% (5-11/7), 0,21% (12-18/7), 0,23% (19-25/7), 0,1802% (26/7-1/8), 0,1621% (2-8/8), 0,14% (9-15/8), 0,1444% (16-22/8), 0,1183% (23-29/8), 0,1023% (30/8-5/9), 0,0744% (6-12/9), 0,1625% (13-19/9), 0,0753% (20-26/9) e 0,0775% (27/9-3/10).; e (2) mortes: 0,3% (19-25/10), 0,26% (26/10-1/11), 0,21% (2-8/11), 0,3% (9-15/11), 0,29% (16-22/11), 0,3% (23-29/11), 0,34% (30-6/12), 0,36% (7-13/12), 0,42% (14-20/12), 0,33% (21-27/12), 0,36% (28/12-3/1), 0,51% (4-10/1), 0,47% (11-17/1), 0,48% (18-24/1), 0,48% (25-31/1), 0,44%(1-7/2), 0,47% (8-14/2), 0,43% (15-21/2), 0,48% (22-28/2), 0,58% (1-7/3), 0,68% (8-14/3), 0,79% (15-21/3), 0,86% (22-28/3), 0,86% (29/3-4/4), 0,91% (5-11/4), 0,80% (12-18/4), 0,66% (19-25/4), 0,60% (26/4-2/5), 0,51% (3-9/5), 0,45% (10-16/5), 0,43% (17-23/5), 0,40% (24-30/5), 0,35% (31/5-6/6), 0,4171% (7-13/6), 0,4175% (14-20/6), 0,33% (21-27/6), 0,30% (28/6-4/7), 0,23% (5-11/7), 0,23% (12-18/7), 0,20% (19-25/7), 0,1785% (26/7-1/8), 0,1613% (2-8/8), 0,1492% (9-15/8), 0,1367% (16-22/8), 0,1185% (23-29/8), 0,1062% (30/8-5/9), 0,07870% (6-12/9), 0,0947% (13-19/9), 0,0890% (20-26/9) e 0,0840% (27/9-3/10).

Não custa lembrar: Os valores acima são as médias semanais de uma taxa que, por razões metodológicas, está a oscilar ao longo da semana. Para fins de monitoramento, é importante ficar de olho nas taxas de crescimento (casos e mortes), não em valores absolutos. Considere uma taxa de crescimento de 0,5%. Se o total de casos no dia 1 está em 100.000, no dia 2 estará em 100.500 (= 100.000 x 1,005) e no dia 8 (sete dias depois), em 103.553 (= 100.000 x 1,0057; um acréscimo de 3.553 casos em relação ao dia 1); se o total no dia 1 está em 4.000.000, no dia 2 estará em 4.020.000 e no dia 8, em 4.142.118 (acréscimo de 142.118); se o no dia 1 o total está em 10.000.000, no dia 2 estará em 10.050.000 e no dia 8, em 10.355.294 (acréscimo de 355.294). Como se vê, embora os valores absolutos dos acréscimos referidos acima sejam muito desiguais (3.553, 142.118 e 355.294), todos equivalem ao mesmo percentual de aumento (~3,55%) em relação aos respectivos valores iniciais.

[7] Sobre o cálculo das taxas de crescimento, ver referência citada na nota 3.

[8] Fonte: ‘Coronavirus (COVID-19) Vaccinations’ (Our World in Data, Oxford, Inglaterra).

[9] Como escrevi em ocasiões anteriores, uma saída rápida para a crise (minimizando o número de novos casos e, sobretudo, o de mortes) dependeria de dois fatores: (i) a adoção de medidas efetivas de proteção e confinamento; e (ii) uma massiva e acelerada campanha de vacinação.

* * *

04 outubro 2021

Mágoa urbana III

Fátima Maldonado

Ruas encolhem
refervem
na barrela do sol,
cada vez mais liberto do ozono
o astro recrudesce
na ordália,
fogo e água,
maníacos
desventram rotas
apunhalando Ceres,
bosques trucidam,
broncos descosem
grifos à dentada,
incineram vinhas
mediatizam o sangue mais secreto,
cascos, asas, vaticínios
regressam a lugares inviolados,
de Gaia é a vingança.

Fonte: Silva, A. C. & Bueno, A., orgs. 1999. Antologia da poesia portuguesa contemporânea. RJ, Lacerda Editores. Poema publicado em livro em 1999.

02 outubro 2021

Pena de morte

Leila Míccolis

Eram bastante bons
aqueles tempos de ódio,
em que planejávamos nossos assassinatos,
pelo simples prazer de nos vingarmos:
eu te via com os dedos na tomada,
tu me vias sufocada pelo gás.
Tempos em que sorrias ao atravessar a rua,
e eu achava graça em ser atropelada;
tempos em que queríamos fazer um filho
para espancarmos juntos,
nos dias de ócio,
em que eu te servia de escarradeira,
em vez de cozinheira e passadeira.
Depois veio o amor,
que é como um lenço em que se assoa,
ou mãe que chicoteia e nos perdoa.
Hoje afago-te as corcovas
e lustro-te as botas novas.

Fonte: Hollanda, H. B., org. 2001 [1976]. 26 poetas hoje, 4ª ed. RJ, Aeroplano.

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