30 junho 2020

A praia no verão


Jacques-Émile Blanche (1861-1942). La plage de Dieppe en août1893

Fonte da foto: Wikipedia.

29 junho 2020

Proximate and ultimate factors

Richard Brewer

When we ask a biological question with a ‘why’ in it – “Why do birds migrate?” or “Why do varying hares turn white in the winter?” – we are usually asking two separate questions with quite different answers. We are asking, on the one hand, what it is in the environment of the organism that make it migrate or turn white. That is, what features of the environment serve as cues for the organism to respond physiologically of behaviorally in this way? We are asking, secondly, an evolutionary question: what makes it advantageous or necessary for the organism to migrate or turn white? The answers to the first question are proximate factors, and to the second, ultimate factors. This terminology was first employed by the British biologist J. R. Baker in writing about a questiono of the same sort, “Why do birds breed when they do?”

Fonte: Brewer, R. 1979. Principles of ecology. Philadelphia, Saunders.

26 junho 2020

Tornamos a empacar?


Felipe A. P. L. Costa [*]

Ministério da Saúde acaba de divulgar as estatísticas de hoje (26): 46.860 casos e 990 mortes. No cômputo geral, já seriam 1.274.974 casos e 55.961 mortes.

A escalada nas estatísticas ao longo desta semana mostra como foram precipitadas as medidas de afrouxamento adotadas pelos governantes nas duas semanas anteriores (8-21/6). No ritmo atual, parece inevitável que o número de casos chegue bem perto de 1,5 milhão até o dia 30/6, como eu havia estimado (de modo otimista) no início do mês (ver artigo ‘O país irá contabilizar entre 1,5 milhão e 2,2 milhões de casos até o fim de junho’).

O que há por trás dessa escalada?

No âmbito deste artigo, a resposta à pergunta acima é mais ou menos óbvia: a taxa de crescimento no número de novos casos.

Mas o que foi que houve? O que houve foi que a média semanal da taxa de crescimento, cujo valor já poderia estar próximo ou até abaixo de 1% [1], parou de declinar e estagnou. O que nos permite imaginar que a próxima semana será igual ou ainda pior que a atual [2].

Relembrando.

Em 31/5, após sete semanas chafurdando entre 6% e 8% (ver a figura que ilustra este artigo), eis que a média semanal caiu para 5,1% (25-31/5), o menor valor até então.

Daí por diante, a média seguiu declinando, ainda que na semana passada tenha emitido sinais de que poderia encalhar de novo. Vejamos os resultados: caiu de 4,3% (1-7/6) para 3,3% (8-14/6) e daí para 3,2% (15-21/6). A média da semana em curso (a ser computada no domingo, 28) deverá ficar entre 3% e 3,2%.

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FIGURA. A figura que ilustra este artigo mostra a variação na taxa de crescimento diário no número de novos casos da Covid-19 na população brasileira (eixo vertical; β expresso em porcentagem), entre 21/3 e hoje (26/6). Doze agregados de pontos podem ser identificados (A-L) e um 13º (M) ainda está em formação (para detalhes, ver nota 1). As setas estariam a representar algo como a direção e o sentido da força dominante dentro de cada agregado: setas pretas empurram para baixo e as vermelhas, para cima. (A ausência de seta indica a falta de uma direção definida.) A linha tracejada representa algo como a trajetória média de todos os pontos. (Em termos de análise estatística, basta dizer que os resultados são significativos.) Em vermelho escuro, os resultados de março; em rosa claro, os de abril; em azul claro, os de maio; em marro claro, os de junho; os quadrados em azul escuro correspondem a domingos. O gráfico menor no canto superior direito ilustra a variação no tempo de duplicação (TD) no número de casos, ao longo do mesmo intervalo de tempo do gráfico maior. (O eixo vertical indica o valor de TD, em dias.) Os valores extremos da série foram 3,1 (31/3) e 42,7 (21/6), indicando que (a) mantido o valor de β obtido para 31/3, seriam necessários 3,1 dias para dobrar o número de casos; e (b) mantido o valor de 21/6, seriam necessários 42,7 dias para dobrar o número de casos. Em meio a sucessivas oscilações, é possível notar uma lenta escalada da curva.

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Ouso dizer que nós estamos empacados. De novo.

E repito aqui o que escrevi em artigo anterior – Que os governantes atentem para o seguinte: assim como era possível que a nossa média semanal já estivesse em um patamar próximo a 1% (ver aqui), com um número bem inferior de casos e, por extensão, de mortes, é perfeitamente possível permanecer em banho-maria até dezembro.

Trocando em miúdos, é perfeitamente possível arrastar e aprofundar o sofrimento da população até dezembro. Até lá, não custa lembrar, não haverá qualquer recuperação econômica duradoura. Apenas pilhagens e algumas golfadas.

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Notas.

[*] Para detalhes e informações sobre o livro mais recente do autor, O que é darwinismo (2019), inclusive sobre o modo de aquisição por via postal, faça contato pelo endereço meiterer@hotmail.com. Para conhecer outros livros e artigos, ver aqui.

[1Monitorando a pandemia. Para avaliar a disseminação da Covid-19 (em qualquer escala geográfica – mundial, nacional ou estadual), sigo calculando uma taxa de crescimento diário no número de novos casos (i.e., no número de indivíduos infectados com o SARS-CoV-2). Esta taxa (simbolizada aqui pela letra grega minúscula β) tem sido definida como β = ln {Y(t+1) / Y(t)}, onde Y(t+1) é o número de casos no dia (t+1), Y(t) é o número de casos no dia anterior, e ln indica logaritmo natural.

A taxa de crescimento não é uma constante, de sorte que o valor de β pode oscilar de um dia para o outro. Se a oscilação é de cima para baixo, dizemos que o parâmetro declinou; se é de baixo para cima, dizemos que o parâmetro escalou. Caso não haja oscilação ou caso a oscilação seja inexpressiva, rotulamos momentaneamente o valor de estacionário. Para exemplos de como calcular o valor de β e o tempo de duplicação, ver a compilação A pandemia e a longa agonia de um país desgovernado.

Construindo um gráfico. Quando os valores de β são colocados em um gráfico (ver a figura que acompanha este artigo), 12 agregados de pontos (elipses A-I) podem ser identificados (e um 13º parece estar em formação), a saber:

(A) Entre 21 e 30/3, intervalo durante o qual a taxa de crescimento declinou desde β = 24,8% até β = 7,6% (houve um excepcional 37,1%, em 22/3, mas aí se trata de um ponto fora da curva);

(B) Entre 31/3 e 6/4, quando, após uma inesperada e significativa escalada (30-31/3), a taxa tornou a declinar, dessa vez desde β = 24,8% até β = 8,3%;

(C) Entre 7 e 14/4, quando, após uma segunda e significativa escalada (6-7/4), a taxa tornou a declinar uma terceira vez, desde β = 16,1% até β = 5,5%;

(D) Entre 15 e 21/4, quando, após uma terceira escalada (14-15/4), a taxa tornou a declinar uma quarta vez, variando desde β = 12,1% até β = 5%;

(E) Entre 22 e 30/4, intervalo durante o qual – pela primeira vez! – a taxa oscilou para cima, variando entre β = 5,8% e β = 10,4%;

(F) Entre 1 e 9/5, quando, após uma queda expressiva (30/4-1/5), a taxa tornou a oscilar para cima uma segunda vez, variando entre β = 4,9% e β = 9,2%;

(G) Entre 10 e 16/5, quando, após uma queda significativa (9-10/5), a taxa oscilou para cima uma terceira vez, agora variando entre β = 3,5% e β = 7,5%;

(H) Entre 17 e 22/5, quando, após mais uma queda significativa (16-17/5), a taxa oscilou para cima uma quarta vez, agora variando entre β = 3,4% e β = 7,3%;

(I) Entre 23 e 30/5, quando, após uma pequena queda (22-23/5), a taxa oscilou para cima uma quinta vez, variando entre β = 3,2% e β = 7,2%;

(J) Entre 31/5 e 6/6, quando, após uma queda bem expressiva (30-31/5), a taxa oscilou para cima uma sexta vez, agora variando entre β = 2,4% e β = 5,5%;

(K) Entre 7 e 13/6, quando, após uma pequena queda (6-7/6), a taxa variou (mas sem direção definida) entre β = 2,4% e β = 4,5%; e

(L) Entre 14 e 20/6, quando, após uma semana de aparente estagnação (7-13/6), a taxa tornou a oscilar para cima uma sétima vez, variando entre β = 2% e β = 5,6%.

[2] Os governantes precisam sinalizar de que lado eles estão. Ou eles estão ao lado da sociedade ou eles estão preocupados com os negócios. É inconcebível, por exemplo, que o governador de SP, em uma vã (e tola) tentativa de querer agradar a gregos e troianos, fique a anunciar – quase que diariamente – que vai relaxar esta ou aquela medida, abrir este ou aquele setor da economia. Cansa, desanima, desmobiliza. Ele já deveria saber: assentada a poeira da demagogia, a terra desolada que sobra é prontamente explorada por gaiatos ainda mais oportunistas. Dito de outro modo: o governador deveria parar de apertar a corda que ele próprio colocou em torno do pescoço.

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25 junho 2020

Como as aves sabem para onde estão voando?

Patrick Cooke

A melancólica aparição de gansos voando para o Sul sob o céu do começo de outono é um marco da passagem das estações, como o é também o canto do primeiro sabiá na primavera. Alguns de nós [prestamos] mais atenção a essas coisas do que outros, mas poucos se sentem tão atraídos pelo movimento sazonal das [aves] como os ornitólogos, que durante anos vêm tentando entender um dos enigmas mais difíceis dessa migração: como as [aves] sabem para onde estão indo?

Bilhões de [aves] no mundo todo migram a cada ano, alguns em viagens de milhares de quilômetros. Esses incansáveis viajantes já levaram, presos no corpo, aparelhos de emissão de ondas de rádio; já foram seguidos por aviões e até anéis foram colocados em milhões deles. Com a colocação dos anéis, os seres humanos podem até acompanhar vigorosos migradores como a [andorinha-do-ártico] – a campeã de longas distâncias, que viaja 35 mil quilômetros por ano. E, no entanto, não existe uma maneira de dizer que vistas, odores, sons e outros sinais servem para guiar uma [ave] para o mesmo local de inverno, ano após ano.

Fonte: Leigh, J. & Savold, D., orgs. 1991 [1988]. O dia em que o raio correu atrás da dona-de-casa... e outros mistérios da ciência. SP, Nobel.

23 junho 2020

Instantaneous and finite rates

Charles J. Krebs

rate is a numerical proportion between two sets of things. For example, the number of rotten apples per bushel might be measured to be six rotten apples per bushel. The number of students failing an examination might be 27 of 350, a failure rate of 7.7 percent. In ecological usage, a rate is usually expressed with a standard time base. Thus if 8 seedlings of 12 die within a year, the mortality rate will be 66.7 percent per year. If a population grows from 100 to 150 within a month, the rate of population increase will be 50 percent per month.

Fonte: Krebs, C. J. 1988. Ecology, 3th ed. NY, Harper.

20 junho 2020

Mlle Vaughan


Paul-César Helleu (1859-1927). Mademoiselle Vaughan. 1905.

Fonte da foto: Wikipedia.

17 junho 2020

Como entramos e como iremos sair da crise. IV. Sobre a heterogeneidade estadual e o afrouxamento



RESUMO. Este artigo atualiza e estende as análises feitas em dois artigos anteriores (aqui e aqui). A média semanal na taxa de crescimento diário (β) no número de novos casos da Covid-19 caiu de 5,1% (25-31/5) para 4,3% (1-7/6) e agora para 3,3% (8-14/6). Mas a média nacional é uma colcha de retalhos. E por baixo dela há uma significativa variação regional no ritmo de expansão da doença. Foi o que revelou um exame de 12 unidades federativas (AM, BA, CE, DF, GO, MA, PA, PE, RJ, RS, SC e SP). Levando em conta o valor e o comportamento de duas variáveis (β e a taxa de letalidade), sustento a ideia de que algumas unidades estão se saindo melhores do que outras. Nenhuma delas, porém, reúne uma combinação minimamente segura a ponto de se afrouxar as medidas de mitigação.

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1. Breve contextualização.

Em 1/6, em artigo publicado no Jornal GGN (‘Como entramos e como iremos sair da crise. III. Acorda, ó gigante entorpecido’), registrei que a média semanal na taxa de crescimento diário no número de novos casos da Covid-19 estava em 5,1%. Era o valor mais baixo para a média nacional desde o início da pandemia.

Dias depois, em meio a uma tentativa explícita de fraude, o painel do Ministério da Saúde saiu do ar. Por um instante, imaginei que havíamos perdido o guia a nos conduzir para fora da casa mal-assombrada em que estamos... Mas a reação foi ampla e ágil. Dentro e fora do país. E painéis alternativos não demoraram a surgir (e.g., aqui).

Em 9/6, o painel do MS (aqui), que havia saído do ar na noite de 5/6, passando desde então a exibir estatísticas parciais, foi restaurado. E, por suposto, tornou a funcionar como antes – i.e., o painel estaria a divulgar estatísticas não adulteradas e minimamente confiáveis.

2. Monitorando a pandemia.

Para avaliar a disseminação da Covid-19 (em qualquer escala geográfica), sigo calculando uma taxa de crescimento diário no número de novos casos (i.e., no número de indivíduos infectados com o SARS-CoV-2) [1].

Esta taxa (simbolizada aqui pela letra grega minúscula β) tem sido definida como β = ln {Y(f) / Y(i)} / {t(f) – t(i)}, onde Y(f) é o número de casos no dia (f), Y(i) é o número de casos no dia (i), {t(f) – t(i)} é o intervalo transcorrido entre os dias (i) e (f), e ln indica logaritmo natural [2].

3. A taxa de crescimento segue declinando.

Os valores de β assim obtidos estão a seguir uma trajetória declinante, tanto em âmbito mundial como nacional (Fig. 1).

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FIGURA 1. O comportamento da taxa de crescimento no número de casos da Covid-19 (eixo vertical; β expresso em porcentagem), tanto em âmbito nacional (pontos em rosa claro) como mundial (pontos em vermelho escuro), entre 21/3 e 14/6. Em âmbito nacional, há muita oscilação nos valores diários (refletindo inércia e desarranjos metodológicos). Para reduzir os ruídos de tal oscilação, calculei uma média semanal na taxa de crescimento (pontos em azul escuro). E comparei os resultados dessa análise (linha tracejada em azul escuro) com os resultados da análise das estatísticas mundiais (linha tracejada em vermelho escuro). Os dois conjuntos de pontos estão distribuídos de modo claramente declinante, embora a taxa brasileira esteja a variar em um patamar nitidamente superior. Em âmbito mundial, o valor de β está abaixo de 3,3% desde 25/4. Em âmbito nacional, estamos com um atraso de 50 dias – acabamos de chegar a 3,3%, o menor valor desde o início da série.

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Em âmbito nacional, especificamente, a média semanal caiu de 5,1% (25-31/5) para 4,3% (1-7/6) e agora para 3,3% (8-14/6).

São resultados auspiciosos, sem dúvida. No entanto, β = 3,3% ainda é um valor relativamente alto. A média mundial, por exemplo, está abaixo de 2%. E nenhum país europeu iniciou o afrouxamento das medidas de mitigação ostentando percentuais superiores a 1% [3]. Diria então que este não é o momento mais oportuno para se revogar ou sequer relaxar as medidas de mitigação, como muitos governantes (governadores e prefeitos) já estão a fazer [4].

A média nacional é uma colcha de retalhos. Por baixo dela há uma significativa variação regional no ritmo de expansão da doença. No que segue, apresento e discuto os resultados de um estudo que conduzi a respeito da crise no plano estadual.

4. Examinando o país por dentro.

Para examinar a expansão da pandemia nas cinco regiões geográficas do país (Norte, Nordeste, Sudeste, Sul e Centro-Oeste), analisei as estatísticas de 12 unidades da federação. As estatísticas se referem ao intervalo entre 19/4 e 14/6.

As unidades escolhidas foram as seguintes: Amazonas (AM) e Pará (PA); Bahia (BA), Ceará (CE), Maranhão (MA) e Pernambuco (PE); Rio de Janeiro (RJ) e São Paulo (SP); Rio Grande do Sul (RS) e Santa Catarina (SC); Distrito Federal (DF) e Goiás (GO).

A lista não abriga as 12 unidades mais afetadas pela Covid-19. Em vez disso, abriga as oito mais afetadas (os oito estados citados das regiões Norte, Nordeste e Sudeste) e mais as duas unidades mais afetadas nas outras duas regiões (Sul e Centro-Oeste) [5].

Em 14/6, estas 12 unidades respondiam por 76% do total de casos (660.555 de 867.624) e 86% do total de mortes (37.397 de 43.332) registrados no país.

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FIGURA 2. Variação nas médias semanais de β em 12 unidades federativas (eixo vertical; expresso em porcentagem), ao longo das sete semanas compreendidas entre 26/4 e 14/6. As cinco unidades federativas que chegam ao final da série acima da média nacional (3,3%; linha tracejada em preto) estão indicados por linhas tracejadas (DF, GO, BA) ou pontilhadas (PA, MA); as sete que chegam ao final abaixo da média estão indicadas por linhas contínuas (SP, RS, CE, RJ, SC, AM, PE). Levando em conta o comportamento e o baixo valor de β (ver texto), os destaques positivos seriam PE e AM. (A média do PA em 26/4, 15,4%, foi omitida.)

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5. Escolhendo uma amostra.

Em 11/6, quando selecionei a amostra, os oito estados mais afetados pela pandemia eram os seguintes (entre parêntesis, o número de casos naquela data e em 14/6): SP (162.520, 178.202), RJ (75.775, 79.572), CE (73.879, 76.748), PA (64.126, 66.328), MA (55.680, 59.850), AM (53.989, 56.506), PE (42.994, 45.261) e BA (33.891, 36.401).

As quatro unidades restantes ocupavam as seguintes posições no ranking nacional (entre parêntesis, o número de casos em 11 e 14/6): DF (20.507, 22.871), 11º colocado; RS (14.168, 14.661), 15º; SC (12.953, 13.360), 17º; e GO (7.657, 7.944), 23º [6].

No que segue, chamo a atenção para certos padrões numéricos que detectei durante a realização do trabalho, alguns dos quais poderiam ser úteis na hora de se pensar em afrouxar (ou não) as medidas de mitigação.

6. Padrões numéricos e conjecturas.

Os principais padrões numéricos que detectei foram os seguintes.

(1) As unidades federativas com o maior número de casos não são necessariamente aquelas que ostentam hoje os valores mais altos de β. Isso porque nem todas as regiões do país foram tomadas pela pandemia ao mesmo tempo ou com a mesma intensidade. Em alguns casos, notadamente AM e PA, o número de casos – e o de hospitalizações requeridas – teria extrapolado a capacidade de suporte dos respectivos sistemas de saúde. Nas últimas semanas, porém, o ritmo de expansão da pandemia arrefeceu, tanto no PA como, sobretudo, no AM. O número de novos casos vem caindo e os sistemas de saúde estão tendo a chance de se recompor.

(2) Sete unidades federativas (SC, CE, RJ, GO, RS, BA, DF) chamam a atenção pelo sobe e desce nas médias semanais (Fig. 2). Oscilações bruscas podem refletir a pronta resposta das autoridades sanitárias a uma ocasional aceleração da epidemia. Ou podem refletir as hesitações e o faz de conta das medidas tomadas pelos governantes [7]. A julgar tão somente pelo comportamento oscilante de β, três estados seriam particularmente ágeis ou volúveis: SC, CE e RJ.

(3) Em termos de trajetória descendente, três estados se destacam pela consistência (= i.e., a média semanal declinou em ao menos seis das últimas sete semanas). São eles: AM e PA (em 6 das 7) e PE (em todas as 7). No PA, a média caiu de inacreditáveis 15,4% (20-26/4) para 3,5% (8-14/6); no AM, no mesmo intervalo, a média caiu de 9,4% para 1,98% e, em PE, de 10,3% para 1,7%. A julgar pelo comportamento e pelo valor de β, PE e AM seriam hoje os dois principais destaques positivos.

(4) Em termos de trajetória ascendente, três unidades federativas chamam a atenção: DF, GO e BA. Embora tenha um atenuante importante (o menor número de casos), GO foi a mais consistente das três unidades: em 4 das 7 últimas semanas, a tendência no estado foi de alta. (Quaisquer que sejam as causas a promover uma ascensão da média, elas teriam sido particularmente influentes em GO.) Assim, a julgar pelo comportamento e pelo valor de β, DF (4,7%), GO (4,6%) e BA (3,7%) seriam hoje os maiores destaques negativos [8].

(5) A taxa de letalidade (TL) – definida aqui como a relação entre o número de mortes e o número de casos – pode ser usada como um indicador para fins comparativos. Em condições ideais, a taxa de letalidade estaria a refletir a proporção de indivíduos infectados que morrem em decorrência da doença. Mas não vivemos em um mundo ideal [9] e, nas atuais circunstâncias, as estatísticas usadas para calcular a taxa de letalidade estariam a ser afetadas por ao menos outros três fatores (ou por uma combinação entre eles): o nível de testagem, a definição do que vem a ser óbito por Covid-19 e a qualidade do sistema de saúde.

Adotando a premissa de que, no cômputo final, a taxa de letalidade pode ser usada como um indicador da mobilização do sistema (visando, em última análise, proteger a população), eu calculei três valores para cada uma das 12 unidades federativas: no início (19/4), no meio (17/5) e no fim (14/6) da série examinada. Os resultados são mostrados na figura 3.

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FIGURA 3. Variação na taxa de letalidade (eixo vertical; em porcentagem) em 12 unidades federativas, em três datas: no início (19/4), no meio (17/5) e no fim (14/6) da série. A situação piorou (i.e., valor final > v. inicial) em três estados: PA, CE e RJ. Em 14/6, por exemplo, a letalidade no RJ era o dobro da letalidade no AM; esta, por sua vez, era o triplo da letalidade no DF ou em SC. A situação melhorou (i.e., valor final foi o menor dos três) no RS, MA, SP e PE. E a situação melhorou sucessivamente (i.e., valor inicial > v. intermediário > v. final) no DF, SC, GO, BA e AM.

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Cinco das 12 unidades se destacam pela consistência na queda sucessiva da letalidade: DF, SC, GO, BA e AM. No DF, a letalidade sempre esteve abaixo de 2%. No AM, a letalidade caiu de 8,9% (19/4) para 4,4% (14/6). Este último ainda é um valor relativamente alto, mas já está abaixo da média nacional (5%, em 14/6).

A julgar tão somente pelo valor da TL, os sistemas que estão a proteger melhor as suas populações seriam os seguintes: DF (TL = 1,3%, em 14/6), SC (1,6%), RS (2,39%) e MA (2,45%). Em contraposição, os destaques negativos seriam RJ (TL = 9,6%, em 14/6), PE (8,5%), CE (6,3%), PA (6,1%) e SP (6%).

7. Balanço final.

Levando em conta o valor e o comportamento das duas variáveis (taxa de crescimento e letalidade), eu chamaria a atenção para quatro estados.

PE e AM são destaques positivos e, a depender da continuidade do que foi feito até aqui pelos governantes e pelas autoridades sanitárias, a pandemia deve continuar arrefecendo nos dois estados. PE precisa baixar a taxa de letalidade, a exemplo do que fez o AM. Para isso, precisaria reforçar o sistema de saúde ou elevar o nível de testagem da população, o que por ora parece ser mais factível [10].

SC é outro destaque positivo. A rigor, talvez seja o estado que melhor combina valores simultaneamente baixos das duas variáveis, com β = 2,1% (o 3º mais baixo, atrás apenas de PE e AM) e TL = 1,6% (o 2º mais baixo, atrás apenas do DF).

Na outra ponta do espectro temos o RJ, cuja situação é alarmante. O estado é um dos que estão a afrouxar as frouxas medidas de mitigação. No âmbito deste artigo, o desempenho do RJ não sustenta o afrouxamento. Em primeiro lugar, embora o valor de β (3,5%, 8-14/6) esteja abaixo da média nacional (4,3%), ainda se trata de um percentual relativamente alto. E mais: ao longo das últimas sete semanas, o comportamento de β tem sido algo oscilante, o que sugere a presença de um número expressivo de casos escondidos no armário [11]. Esta suspeita só é reforçada pelo elevado valor da TL. Em vez de afrouxar, o certo seria o estado conseguir mais uma ou duas semanas de queda nos valores de β e na TL [12].

PA e SP não estão em situação muito melhor que o RJ. De modo que os cuidados sugeridos acima se aplicariam igualmente aos dois.

8. Coda.

Antes de afrouxar as medidas de mitigação, todo e qualquer governante que esteja de fato preocupado com o bem-estar da população deveria se perguntar: “Se houver necessidade, eu terei força e cacife político que me permitam recuar?”

Recuar de um afrouxamento é mais difícil e pode ser muito pior (em vários sentidos) do que estender e sustentar as medidas de mitigação por mais algum tempo.

Quando e como suspender o confinamento? A OMS já divulgou algumas diretrizes gerais (ver, por exemplo, aqui). Visam uma saída exitosa, minimizando as perdas humanas e os custos materiais. Mas não há uma resposta pronta e acabada. Em certo sentido, estamos todos (ou quase todos) tateando no escuro, tentando achar uma saída. Todavia, mesmo cercados de tantas incertezas, é possível dizer o que os governantes não deveriam fazer.

No âmbito estritamente técnico, sou de opinião que as medidas de mitigação não deveriam ser afrouxadas sem que antes fossem alcançadas ao menos duas metas: (1) conseguir semanas sucessivas de queda no valor de β (ao menos até que valor caía para algo abaixo de 1%, como PE parece estar a caminho de conseguir); e (2) promover baixas sucessivas no valor da taxa de letalidade (ao menos até que o valor caia para algo próximo a 1%, como o DF e SC estão a caminho de conseguir).

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Notas.

[*] Para detalhes e informações sobre o livro mais recente do autor, O que é darwinismo (2019), inclusive sobre o modo de aquisição por via postal, faça contato pelo endereço meiterer@hotmail.com. Para conhecer outros livros e artigos, ver aqui.

[1] Estou a acompanhar as estatísticas mundiais em dois painéis, ‘Mapping 2019-nCov’ (Johns Hopkins University, EUA) e ‘Worldometer: Coronavirus’ (Dadax, EUA). E continuo a extrair as estatísticas nacionais do painel do Ministério da Saúde (aqui).

[2] A taxa de crescimento não é constante, de sorte que o valor de β pode oscilar de um dia para o outro. Se a oscilação é de cima para baixo, dizemos que o parâmetro declinou; se é de baixo para cima, dizemos que o parâmetro escalou. Caso não haja oscilação ou caso a oscilação seja inexpressiva, rotulamos momentaneamente o valor de estacionário. Para exemplos de como calcular o valor de β, ver a compilação A pandemia e a longa agonia de um país desgovernado.

[3] Os países europeus que estão a afrouxar as medidas de mitigação ostentam valores de β bem inferiores a 1%. Em 28/5, por exemplo, a média semanal de países como Espanha, Itália, França, Alemanha e Bélgica estava entre 0,1 e 0,4%. A média do Reino Unido girava em torno de 1% e o assunto por lá ainda estava na ordem do dia. (Na Suécia, o patinho feio do norte da Europa, o valor era de 1,5%.)

[4] A rigor, o que tivemos até agora no país foi um falso confinamento. Na prática, portanto, relaxar agora as medidas de mitigação significará suspendê-las. A expansão da doença, em vez de continuar cedendo, deverá recrudescer nos próximos dias. E os governantes, ao contrário do que estão a anunciar, terão muita dificuldade para recuar. A experiência indica que a resistência a uma retomada das medidas de mitigação é sempre maior que na primeira vez (exceto, talvez, em casos de calamidade pública).

[5] A respeito dos 15 estados que ficaram de fora (AC, AP, RO, RR e TO; AL, PB, PI, RN e SE; ES e MG; PR; MS e MT), cabem aqui os seguintes comentários: (1) na região Sul, com 9.716 casos e 334 mortes (15/6), o PR já é o segundo estado em número de mortes (atrás apenas do RS), embora continue em terceiro lugar (atrás do RS e de SC) em número de casos; e (2) na região Centro-Oeste, as estatísticas do MT (6.185 casos e 216 mortes, em 15/6) estão a escalar rapidamente, de sorte que, hoje (16) ou amanhã, o estado deverá se tornar o segundo em número de mortes, ficando atrás apenas do DF.

[6] Atrás de GO, em números absolutos de casos, estavam – e ainda estão – quatro estados (entre parêntesis, o número de casos em 11 e 15/6): RR (6.594, 6881), TO (6.529, 7.137), MT (5.092, 6.185) e MS (2.853, 3.551).

[7] Não é por falta de assessoria técnica qualificada que os governantes (governadores e prefeitos) estão a tomar medidas equivocadas. Sei de governantes que estão muito bem-assessorados e, ainda assim, optam pelo caminho mais tortuoso.

[8] No caso específico do DF, vale atentar para duas variáveis relevantes, uma técnica e outra política. A variável técnica: Brasília abriga o terceiro mais movimentado aeroporto do país (atrás apenas de Guarulhos e Congonhas, em SP) (ver aqui). Em escala planetária, há uma relação direta entre a movimentação (e.g., fluxo de passageiros) e a intensidade dos surtos epidêmicos. A variável política: Brasília abriga aquele que é tido hoje como o pior presidente do mundo (ver aqui). Abriga também algumas seitas de extrema direita. Essa turma reúne funcionários públicos, empresários sonegadores e militantes profissionais. Um pessoal que quer se fazer passar por ‘gente comum’. A preocupação deles, no entanto, é tão somente defender a manutenção de benesses e privilégios, para si e para os seus. Não são militantes políticos no sentido usual da palavra. Fato é que, nas últimas semanas, pequenos bandos a vagar por logradouros públicos (contrariando assim determinações do governador do DF – ver aqui) não se limitaram a bradar contra a decência, o bem comum e a razão. Pois esse pessoal também está a distribuir perdigotos. E em quantidade suficiente a ponto de provocar vários episódios de superdisseminação (ver aqui).

[9] Nas condições atuais do país, a letalidade tem sido muito afetada por outras variáveis, como o baixo nível de testagem e a adoção de critérios restritos para calcular as mortes por Covid-19. (Há quem insista em esconder as mortes.) Sem falar nas limitações inerentes ao nosso sistema hospitalar, como as precárias condições de trabalho para os profissionais de saúde (ver aqui). Não tive como analisar separadamente cada um desses fatores. Portanto, os resultados apresentados aqui devem ser vistos com uma dose extra de cautela.

[10] O CE é (ou já foi) líder em testagem da população (ver aqui), mas ainda tem uma letalidade de 6,3%, um valor relativamente alto (o estado ficou em 10º lugar entre as 12 unidades investigadas – ver Fig. 3). O que sugere que o sistema de saúde precisaria ser reforçado.

[11] Abrir e fechar sucessivas vezes, sem monitorar a população, eleva as chances de guardar no armário (i.e., confinar) indivíduos já infectados. De acordo com as circunstâncias, esses indivíduos poderão vir a contagiar a família ou mesmo a vizinhança. Assim, quando as medidas de confinamento são novamente suspensas, um número crescente de infectados entra em contato com o restante da população, acelerando a disseminação da doença.

[12] Cabe frisar que o RJ é (ou já foi) o derradeiro em testagem da população, logo atrás de MG (ver aqui).

* * *

15 junho 2020

Happy is England now

John Freeman

There is not anything more wonderful
Than a great people moving towards the deep
Of an unguessed and unfeared future; nor
Is aught so dear of all held dear before
As the new passion stirring in their veins
When the destroying Dragon wakes from sleep.

Happy is England now, as never yet!
And though the sorrows of the slow days fret
Her faithfullest children, grief itself is proud.
Ev’n the warm beauty of this spring and summer
That turns to bitterness turns then to gladness
Since for this England the beloved ones died.

Happy is England in the brave that die
For wrongs not hers and wrongs so sternly hers;
Happy in those that give, give, and endure
The pain that never the new years may cure;
Happy in all her dark woods, green fields, towns,
Her hills and rivers and her chafing sea.

Whate’er was dear before is dearer now.
There’s not a bird singing upon his bough
But sings the sweeter in our English ears:
There’s not a nobleness of heart, hand, brain
But shines the purer; happiest is England now
In those that fight, and watch with pride and tears.

Fonte (v. 7 e 19): Carpeaux, O. M. 2011. História da literatura ocidental, vol. 4. Brasília, Senado Federal. Poema publicado em livro em 1920.

13 junho 2020

Treze anos e oito meses no ar

F. Ponce de León

Ontem, 12/6, o Poesia contra a guerra completou 13 anos e oito meses no ar.

Desde o balanço anterior – ‘Treze anos e sete meses no ar’ – foram publicados aqui pela primeira vez textos dos seguintes autores: Colin R. Townsend, Edward S. Deevey Jr., John L. Harper, Lourdes Teodoro, Michael Begon, Sergio Antônio Vanin, Shyima Hall e Thomas Burton Bottomore. Além de outros que já haviam sido publicados antes.

Cabe ainda registrar a publicação de imagens de obras dos seguintes pintores: Félicien Rops, Karl Wilhelm Diefenbach e Max Klinger.

10 junho 2020

A legação


Max Klinger (1857-1920). Eine Gesandtschaft. 1882.

Fonte da foto: Wikipedia.

08 junho 2020

Elegia moderna

Lourdes Teodoro

meu verso
tem a tristeza justa
do nordestino brasileiro
ante a fonte
ora seca... ou... seca... e seca.

no poema que faço
mulheres dançam
sentimentos
entre os mistérios da carne
e os mistérios da fé.

minha poesia
tem o ardor impiedoso do sol
ao queimar as costas dos meninos
nus
nos cacauais...

no verso que faço
vadiam mundos
sem letras, sem alimentos
em meu verso dorme
um amazonas violento.

harmonizando as estrofes
a esperança de um outro brasil
luta para sobreviver.

Fonte (v. 2, v. 19-23): Horta, A. B. 2003. Sob o signo da poesia. Brasília, Thesaurus. Poema publicado em livro em 1978.

06 junho 2020

The rebel


When I
die
I’m sure
I will have a
Big Funeral...

Curiosity
seekers...
coming to see
if I
am really
Dead...
or just
trying to make
Trouble...

Fonte: Pereira, E. A., org. 2010. Um tigre na floresta de signos. BH, Maza Edições.

04 junho 2020

O país irá contabilizar entre 1,5 milhão e 2,2 milhões de casos até o fim de junho



RESUMO. Este artigo reitera e estende as análises presentes em artigo anterior (aqui). Levando em conta os números oficiais (584.016 casos, em 3/6) e admitindo duas trajetórias (a pessimista, a média semanal permanece em 5,1%; e a otimista, a média declina 0,5% por semana), este artigo oferece projeções para o comportamento da pandemia em território brasileiro. De hoje (4) até o fim de junto, as estatísticas nacionais deverão totalizar entre 1,543 milhão e 2,232 milhões de casos e entre 92,6 mil e 133,9 mil de mortes. Como escrevi em outro lugar, projeções como estas devem ser vistas como advertências, não como palpites de loteria ou chutes contáveis. Para frear essa escalada (ou uma escalada ainda pior), as medidas de mitigação deveriam ser mantidas ou endurecidas, não afrouxadas.

*

Em 31/5, após sete (7) semanas chafurdando entre 6% e 8%, eis que a taxa de crescimento no número de novos casos caiu para 5,1%, o menor valor desde o início da pandemia. É uma boa notícia, claro, mas ainda não é o suficiente para justificar qualquer afrouxamento nas medidas de mitigação contra a pandemia da Covid-19.

Ontem (3), alegando falha técnica, os camuflados que estão a ocupar o Ministério da Saúde postergaram o anúncio das estatísticas até por volta de 22h00 [1]. (No início da crise, é bom lembrar, houve dias em que a divulgação chegou a ocorrer no final da tarde.)

No fim das contas, a ‘falha técnica’ veio a público – um novo recorde no número de mortes em um só dia (1.349). Chegamos ontem a 584.016 casos e 32.548 mortes.

1. Monitorando a pandemia.

Para avaliar a disseminação da Covid-19 (tanto em escala mundial como nacional), sigo calculando uma taxa de crescimento diário no número de novos casos (i.e., no número de indivíduos infectados com o SARS-CoV-2).

Esta taxa (simbolizada aqui pela letra grega minúscula β) tem sido definida como β = ln {Y(t+1) / Y(t)}, onde Y(t+1) é o número de casos no dia (t+1), Y(t) é o número de casos no dia anterior, e ln indica logaritmo natural [2].

2. Construindo um gráfico.

Quando os valores de β assim obtidos são colocados em um gráfico (ver a figura que acompanha este artigo), nove agregados de pontos (elipses A-I) podem ser identificados e um décimo (J) parece estar em formação, a saber:

(A) Entre 21 e 30/3, intervalo durante o qual a taxa de crescimento declinou desde β = 24,8% até β = 7,6% (houve um excepcional 37,1%, em 22/3, mas aí se trata de um ponto fora da curva);

(B) Entre 31/3 e 6/4, quando, após uma inesperada e significativa escalada (30-31/3), a taxa tornou a declinar, dessa vez desde β = 24,8% até β = 8,3%;

(C) Entre 7 e 14/4, quando, após uma segunda e significativa escalada (6-7/4), a taxa tornou a declinar uma terceira vez, desde β = 16,1% até β = 5,5%;

(D) Entre 15 e 21/4, quando, após uma terceira escalada (14-15/4), a taxa tornou a declinar uma quarta vez, variando desde β = 12,1% até β = 5%;

(E) Entre 22 e 30/4, intervalo durante o qual – pela primeira vez! – a taxa oscilou para cima, variando entre β = 5,8% e β = 10,4%;

(F) Entre 1 e 9/5, quando, após uma queda expressiva (30/4-1/5), a taxa tornou a oscilar para cima uma segunda vez, variando entre β = 4,9% e β = 9,2%;

(G) Entre 10 e 16/5, quando, após uma queda significativa (9-10/5), a taxa oscilou para cima uma terceira vez, agora variando entre β = 3,5% e β = 7,5%;

(H) Entre 17 e 22/5, quando, após uma queda significativa (16-17/5), a taxa oscilou para cima uma quarta vez, agora variando entre β = 3,4% e β = 7,3%; e

(I) Entre 23 e 30/5, quando, após uma queda expressiva (22-23/5), a taxa oscilou para cima uma quinta vez, agora variando entre β = 3,2% e β = 7,2%.

*

FIGURA. A figura que ilustra este artigo mostra a variação na taxa de crescimento diário no número de novos casos da Covid-19 na população brasileira (eixo vertical; β expresso em porcentagem), entre 21/3 e 3/6. Nove agregados de pontos podem ser identificados (A-I) e um décimo (J) ainda está em formação (para detalhes, ver o texto). As setas estariam a representar algo como a direção e o sentido da força dominante dentro de cada agregado: setas pretas empurram para baixo e as vermelhas, para cima. A linha tracejada representa algo como a trajetória média de todos os pontos. (Em termos de análise estatística, basta dizer que os resultados são bastante significativos.) Em vermelho escuro, os resultados de março; em rosa claro, os de abril; em azul claro, os de maio; em marro claro, os de junho; os quadrados em azul escuro correspondem a domingos. O gráfico menor no canto superior direito ilustra a variação no tempo de duplicação (TD) no número de casos, ao longo do mesmo intervalo de tempo do gráfico maior. (O eixo vertical indica o valor de TD, em dias.) Os valores extremos da série foram 3,1 (31/3) e 29,4 (1/6), indicando que (a) mantido o valor de β obtido para 31/3, seriam necessários 3,1 dias para dobrar o número de casos; e (b) mantido o valor de 1/6, seriam necessários 29,4 dias para dobrar o número de casos. Em meio a sucessivas oscilações, é possível notar uma lenta escalada da curva.

*

3. Projeções para junho.

Para fins operacionais, vou adotar – não sem alguma dose de otimismo – duas premissas (uma pessimista e outra otimista) para a trajetória do valor de β até o fim de junho.

Premissa pessimista: até 30/6, a média semanal de β permanecerá igual ao valor da semana passada (5,1%, entre 25-31/5). Premissa otimista: até 30/6, a média semanal de β seguirá declinando a um ritmo de 0,5% por semana [3]. Cada uma das premissas, por sua vez, dará suporte a uma projeção (pessimista e otimista, respectivamente).

A projeção otimista. A uma média semanal declinante (4,6%, 4,1% e assim por diante, até 2,6%), o total de casos no país chegaria a 1.543.009. (Lembre-se: chegamos ontem [3/6] a 584.016 casos e de ontem até o fim de maio o intervalo é de 27 dias.) Este número resultaria em 92.581 mortes, admitindo que a letalidade permaneça nos atuais 6% [4].

A projeção pessimista. A uma média semanal constante e igual a 5,1%, o total de casos no país chegaria a 2.232.284 até o dia 30/6. Admitindo a mesma letalidade de antes, este número resultaria em 133.937 mortes [5].

4. Coda.

Como escrevi em artigos anteriores, projeções como as que são apresentadas neste artigo devem ser vistas como advertências, não como palpites de loteria ou chutes contáveis.

Sou de opinião que, para frear a escalada em curso nas estatísticas (ou uma escalada ainda pior), as medidas de mitigação (e.g., distanciamento espacial e uso obrigatório de máscaras faciais em locais públicos) deveriam ser mantidas ou endurecidas, não afrouxadas.

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Notas.

[*] Para detalhes e informações sobre o livro mais recente do autor, O que é darwinismo (2019), inclusive sobre o modo de aquisição por via postal, faça contato pelo endereço meiterer@hotmail.com. Para conhecer outros livros e artigos, ver aqui.

[1] Ontem (3), mesmo com a divulgação postergada, o ministério seguiu deixando de fora alguns números estaduais. Uma praxe que tem sido vista desde o início da crise. A partir de determinado horário, ao que parece, as atualizações promovidas pelas secretarias estaduais são empurradas pelo Ministério da Saúde (aqui) para o dia seguinte. O mesmo descompasso está a ocorrer entre municípios e estados. É de se supor que haja alguma limitação técnica a justificar tudo isso, mas imagino também que esses descompassos tenham muito de ineficiência e, sobretudo, de má vontade. Tanto por parte da burocracia como dos próprios governantes.

[2] A taxa de crescimento não é uma constante, de sorte que o valor de β pode oscilar de um dia para o outro. Se a oscilação é de cima para baixo, dizemos que o parâmetro declinou; se é de baixo para cima, dizemos que o parâmetro escalou. Caso não haja oscilação ou caso a oscilação seja inexpressiva, rotulamos momentaneamente o valor de estacionário. Para exemplos de como calcular o valor de β e o tempo de duplicação, ver a compilação A pandemia e a longa agonia de um país desgovernado.

[3] Nas sete semanas compreendidas entre 13/4 e 31/5, a média caiu de 8,3% para 5,1%, o que daria uma queda média (aritmética) de 0,46%. Arredondando este valor para 0,5% e tomando 5,1% como ponto de partida, as médias esperadas para esta e para as próximas semanas seriam então as seguintes: 4,6% (1-7/6), 4,1% (8-14), 3,6% (15-21), 3,1% (16-28) e 2,6% (para os dois últimos dias do mês, 29 e 30).

[4] Detalhando minhas projeções otimistas para cada uma das próximas semanas (número de casos e de mortes): 698.892 e 41.934 (1-7/6), 925.374 e 55.522 (8-14), 1.184.639 e 71.078 (15-21), 1.466.040 e 87.962 (22-28) e 1.543.009 e 92.581 (29-30).

[5] Detalhando minhas projeções pessimistas para cada uma das próximas semanas (número de casos e de mortes): 712.353 e 42.741 (1-7/6), 1.008.482 e 60.509 (8-14), 1.427.714 e 85.663 (15-21), 2.021.223 e 121.273 (22-28) e 2.232.284 e 133.937 (29-30).

* * *

03 junho 2020

Filogenia e classificação

Sergio Antônio Vanin

Os insetos, também denominados de hexápodes por alguns autores, constituem o clado do reino animal com maior riqueza de espécies. Em geral, Hexapoda é o termo mais abrangente, que abrange todos os artrópodes providos de três pares de pernas, incluindo os representantes entognatos (com peças bucais internas), como os colêmbolos, proturos e dipluros. O termo Insecta atualmente é reservado para o clado dos insectos ectognatos (com peças bucais externas), compreendendo os membros primariamente sem asas, como as lepismas, e todos os insetos alados ou secundariamente desprovidos de asas (Pterygota). O termo ‘inseto’, no entanto, às vezes ainda é aplicado para designar todos os membros do táxon Hexapoda, ao qual geralmente é associada a categoria taxonômica de superclasse.

Fonte: Vanin, S. A. 2012. In: Rafael, J. A. & mais 4, eds. Insetos do Brasil. Ribeirão Preto, Holos.

01 junho 2020

Se entrando no retrato a sobrancelha


Se entrando no retrato a sobrancelha
destoa da harmonia de um passado
e o brinco pendente de uma orelha
dorme tranquilo em estojo acolchoado,

se a cadeira ali nova agora é velha
e a névoa do peitilho foi bordado
nesse tempo que em pouco se assemelha
ao tempo que hoje em dia nos é dado,

não quer dizer que a vida tenha sido
inútil e perversa   ou desfocada
do retrato só visto e nunca lido

por quem da vida saiba a senha errada.
Terei apenas eu sobrevivido
para ler tal silêncio em voz calada.

Fonte: Silva, A. C. & Bueno, A., orgs. 1999. Antologia da poesia portuguesa contemporânea. RJ, Lacerda Editores. Poema publicado em livro em 1996.

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