27 fevereiro 2023

Basta de anarquia e ilusionismo, o combate à pandemia exige rigor e precisão

Felipe A. P. L. Costa [*].

RESUMO. – Este artigo atualiza as estatísticas (mundiais e nacionais) a respeito da pandemia divulgadas em artigo anterior (aqui). Em escala planetária, já foram registrados 675 milhões de casos e 6,87 milhões de mortes; em escala nacional, 37,02 milhões de casos e 698,93 mil mortes. Máscaras e vacinas seguem sendo as melhores armas que nós temos para (i) manter as estatísticas em declínio; e (ii) impedir o surgimento de novidades evolutivas que venha a promover uma nova e repentina escalada dos números.

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1. ESTATÍSTICAS MUNDIAIS: ALGUMAS CONSIDERAÇÕES.

Levando em conta as estatísticas obtidas na manhã de hoje (27/2) [1], eis um resumo da situação mundial.

(A) – Em números absolutos, os 20 países mais afetados [2] estão a concentrar 74% dos casos (de um total de 675.053.621) e 68% das mortes (de um total de 6.870.341) [3].

(B) – Nesses 20 países, 484 milhões de indivíduos receberam alta, o que corresponde a 96% dos casos. Em escala global, 653 milhões de indivíduos já receberam alta.

(C) – Olhando apenas para as estatísticas das últimas quatro semanas (= mês), eis um resumo da situação: (a) Em números absolutos, a lista segue a ser liderada pelos Estados Unidos, agora com 1,097 milhão de casos/mês; (b) Entre os cinco primeiros da lista, estão ainda o Japão (721 mil), Taiwan (488), Alemanha (372) e Coreia do Sul (346); o Brasil (226) segue na sétima colocação. Em todos esses países, com exceção da Alemanha, os números caíram em relação aos da semana anterior; e (c) A lista dos países com mais mortes segue a ser liderada pelos Estados Unidos (11,8 mil); em seguida aparecem Japão (4,63 mil), Alemanha (2,37), Brasil (2,17) e Taiwan (1,43). Nos três primeiros países, os números caíram em relação aos da semana anterior; nos dois últimos, subiram. (Lembrando ainda que houve um recrudescimento na China, meses atrás: nas últimas quatro semanas, foram anotadas por lá 3.399 mortes.)

2. ESTATÍSTICAS BRASILEIRAS: SEMANA 20-26/2.

Ontem (26/2), de acordo com o Conselho Nacional de Secretários de Saúde, foram registrados em todo o país mais 952 casos e 1 morte. Teríamos chegado assim a um total de 37.024.417 casos e 698.934 mortes.

Na semana encerrada ontem (20-26/2), foram registrados 36.735 casos e 887 mortes. Em relação aos números da semana anterior, a primeira estatística caiu e a segunda subiu (13-19/2: 54.852 casos e 373 mortes).

3. QUATRO ANOS DE ANARQUIA E ILUSIONISMO.

A suspensão na divulgação das estatísticas diárias é, por si só, uma ideia ruim e inoportuna. Como comentei no boletim da semana passada (aqui), o Ministério da Saúde estaria disposto a suspender a divulgação diária das estatísticas brasileiras, já a partir dos primeiros dias de março.

O argumento usado – compreensível, mas nem um pouco justificável – é que apenas nove estados estão a divulgar suas estatísticas diariamente. (Tem governo estadual fazendo corpo mole há muito tempo, incluindo MG, DF e RJ, como chamei a atenção em inúmeros boletins anteriores.)

O governo federal não deveria se dobrar aos preguiçosos (leia-se: governadores dos estados que decidiram suspender a divulgação diária das estatísticas). Ao contrário, o Ministério da Saúde deveria fazer com que todos trabalhassem juntos em prol de uma política sanitária verdadeiramente integrada e consistente.

Chega de inércia. Chega de anarquia e ilusionismo. Pois foi isso o que o governo federal promoveu (entre outras coisas) nos últimos quatro anos. O reino da inércia administrativa precisa ser deixado para trás.

Além da volta de uma consistente campanha de vacinação em escala nacional (ver aqui), o governo federal deveria exigir rigor e precisão na divulgação das estatísticas por parte de todos os governos estaduais – de MG, o maior dos preguiçosos, a RR, o menor deles.

4. CODA.

Enquanto isso, nós, o povo, devemos ter em mente dois princípios: Máscaras e vacinas seguem sendo as melhores armas que nós temos para (i) manter as estatísticas em declínio; e (ii) impedir o surgimento de novidades evolutivas que venham a promover uma nova e repentina escalada dos números. (Lembrando que a vacina combate a doença, mas não impede o contágio. O que pode impedir o contágio é o uso correto de máscara facial.)

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NOTAS.

[*] Há uma campanha de comercialização envolvendo os livros do autor – ver o artigo Ciência e poesia em quatro volumes. Para mais informações ou para adquirir (por via postal) os quatro volumes (ou algum volume específico), faça contato pelo endereço meiterer@hotmail.com. Para conhecer outros artigos e livros, ver aqui.

[1] Como comentei em ocasiões anteriores, as estatísticas de casos e de mortes estão a seguir o painel Mapping 2019-nCov (Johns Hopkins University, EUA), enquanto as de altas estão a seguir o painel Worldometer: Coronavirus (Dadax, EUA).

[2] Os 20 primeiros países da lista podem ser arranjados em 11 grupos: (a) Entre 100 e 110 milhões de casos – Estados Unidos; (b) Entre 40 e 45 milhões – Índia; (c) Entre 35 e 40 milhões – França, Alemanha e Brasil; (d) Entre 30 e 35 milhões – Japão e Coreia do Sul; (e) Entre 25 e 30 milhões – Itália; (f) Entre 20 e 25 milhões – Reino Unido e Rússia; (g) Entre 15 e 20 milhões – Turquia (estatísticas congeladas); (h) Entre 12 e 15 milhões – Espanha; (i) Entre 10 e 12 milhões – Vietnã, Austrália e Argentina; (j) Entre 8 e 10 milhões – Taiwan e Países Baixos; e (k) Entre 6 e 8 milhões – Irã, México e Indonésia.

[3] Nessas estatísticas (casos e mortes) estão computados os números da China. Para detalhes e discussões a respeito do comportamento da pandemia desde março de 2020, tanto em escala mundial como nacional, ver os volumes da coletânea A pandemia e a lenta agonia de um país desgovernado, vols. 1-5 (aqui, aqui, aqui, aqui e aqui). Sobre o cálculo das taxas de crescimento, ver qualquer um dos três primeiros volumes.

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25 fevereiro 2023

As esponjas

Michelle Klautau

As esponjas (filo Porifera, do latim porus = ‘poro’; ferre = ‘possuir’) são animais sésseis e filtradores que utilizam células flageladas (coanócitos) para bombear água pelo seu corpo e, assim, obter alimento, realizar trocas gasosas e excretar. Não possuem órgãos, células sensoriais ou nervosas, nem linhagens germinativas pré-determinadas. São os metazoários mais antigos ainda existentes, sendo que seus fósseis mais antigos datam do Cambriano (cerca de 500 milhões de anos) [...]. Desde então as esponjas se diversificaram enormemente e, atualmente, existem cerca de 8.000 espécies conhecidas, sendo que há estimativas de que ainda existam, pelo menos, mais 7.000 esécies para serem descobertas.

Fonte: Klautau, M. 2016. In: Fransozo, A. & Negreiros-Fransozo, M. L., orgs. Zoologia dos invertebrados. RJ, Roca.

22 fevereiro 2023

Sentado, sóbrio, sereno

Poh Pin Chin

O pai de minha mãe, avô querido,
morreu ontem. Sentado, sóbrio, sereno.

Contava quase 99 anos de idade.
Gastou as horas da vida a estudar.

Nunca teve tempo de amealhar bens.
Jamais se ajuntou para fazer mal a alguém.

20 fevereiro 2023

O Ministério da Saúde não deve fazer como os estados preguiçosos

Felipe A. P. L. Costa [*].

RESUMO. – Este artigo atualiza as estatísticas (mundiais e nacionais) a respeito da pandemia divulgadas em artigo anterior (aqui). Em escala planetária, já foram registrados 674 milhões de casos e 6,86 milhões de mortes; em escala nacional, 36,99 milhões de casos e 698,05 mil mortes. Máscaras e vacinas seguem sendo as melhores armas que nós temos para (i) manter as estatísticas em declínio; e (ii) impedir o surgimento de novidades evolutivas e uma nova e repentina escalada dos números.

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1. ESTATÍSTICAS MUNDIAIS: ALGUMAS CONSIDERAÇÕES.

Levando em conta as estatísticas obtidas na manhã de hoje (20/2) [1], eis um resumo da situação mundial.

(A) – Em números absolutos, os 20 países mais afetados [2] estão a concentrar 74% dos casos (de um total de 674.064.499) e 68% das mortes (de um total de 6.863.186) [3].

(B) – Nesses 20 países, 483 milhões de indivíduos receberam alta, o que corresponde a 96% dos casos. Em escala global, 651 milhões de indivíduos já receberam alta.

(C) – Olhando apenas para as estatísticas das últimas quatro semanas, eis um resumo da situação: (a) Em números absolutos, a lista passou a ser liderada pelos Estados Unidos, agora com 1,12 milhão de casos; (b) Entre os cinco primeiros da lista, estão ainda o Japão (1,05 milhão), Taiwan (582 mil), Coreia do Sul (425) e Alemanha (334), o Brasil (269,6) está agora na sétima colocação; e (c) A lista dos países com mais mortes segue a ser liderada pelos Estados Unidos (13,3 mil); em seguida aparecem Japão (6,32 mil), Alemanha (2,60), Brasil (1,79) e Taiwan (1,42). Sem esquecer que houve um recrudescimento na China e que as estatísticas de lá deram um salto: nas últimas quatro semanas, foram anotadas 9.970 mortes.

2. ESTATÍSTICAS BRASILEIRAS: SEMANA 13-19/2.

O Ministério da Saúde e o Conselho Nacional de Secretários de Saúde divulgaram as estatísticas diárias da pandemia pela última vez na sexta-feira (17/2).

A julgar pelos avisos que encontrei por lá, a divulgação diária só deverá ser retomada na próxima quarta-feira (22). Serão quatro dias de voo cego (18, 19, 20 e 21/2). É preocupante.

Levando em conta as estatísticas parciais relativas à semana passada, o país chegou a um total de 36.987.682 casos e 698.047 mortes.

Nos cinco primeiros dias (13-17/2) da semana encerrada ontem (13-19/2), foram registrados 54.852 casos e 373 mortes. Não há como negar que o ‘vazio carnavalesco’ nos dois últimos dias da semana passada (18-19/2) atrapalha a análise. As estatísticas disponíveis, no entanto, já indicam que o número de mortes subiu em relação ao da semana anterior (6-12/2: 63.884 casos e 313 mortes).

3. ALGUNS TRABALHAM, OUTROS EMBROMAM.

A suspensão na divulgação das estatísticas diárias é, por si só, uma ideia ruim e inoportuna. Mas nada é tão ruim que não possa piorar.

A julgar pelo noticiário da semana passada, o Ministério da Saúde planeja suspender a divulgação diária das estatísticas brasileiras. O argumento usado – compreensível, mas não de todo justificável – é que apenas nove estados estão a divulgar suas estatísticas como manda o figurino – i.e., diariamente. (Tem governo estadual fazendo corpo mole há muito tempo, incluindo MG, DF e RJ, como chamei a atenção em inúmeros boletins anteriores.)

As estatísticas da pandemia de fato seguem a cair em escala planetária, mas ainda é cedo para empurrar tudo para a gaveta do esquecimento ou para debaixo do tapete. Como uma indicação algo arbitrária para uma linha de corte, eu sugeriria o seguinte: As estatísticas devem continuar a ser divulgadas todos os dias – incluindo fins de semana, feriados etc. – até que a média semanal no número diário de mortes por Covid-19 em todo o país fique abaixo do número equivalente de mortes provocadas por outras doenças contagiosas afins (e.g., gripe). Ou até que essa média fique abaixo de 10. O número que for mais baixo.

O governo federal não deveria se dobrar aos preguiçosos. Ao contrário, deveria fazer com que os preguiçosos, a começar pelo maior de todos, o governo do meu estado (Minas Gerais), embromasse menos e trabalhasse mais.

4. CODA.

Enquanto isso, nós, o povo, devemos ter em mente dois princípios: Máscaras e vacinas seguem sendo as melhores armas que nós temos para (i) manter as estatísticas em declínio; e (ii) impedir o surgimento de novidades evolutivas e uma nova e repentina escalada dos números. (Lembrando que a vacina combate a doença, mas não impede o contágio. O que pode impedir o contágio é o uso correto de máscara facial.)

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NOTAS.

[*] Há uma campanha de comercialização envolvendo os livros do autor – ver o artigo Ciência e poesia em quatro volumes. Para mais informações ou para adquirir (por via postal) os quatro volumes (ou algum volume específico), faça contato pelo endereço meiterer@hotmail.com. Para conhecer outros artigos e livros, ver aqui.

[1] Como comentei em ocasiões anteriores, as estatísticas de casos e de mortes estão a seguir o painel Mapping 2019-nCov (Johns Hopkins University, EUA), enquanto as de altas estão a seguir o painel Worldometer: Coronavirus (Dadax, EUA).

[2] Os 20 primeiros países da lista podem ser arranjados em 11 grupos: (a) Entre 100 e 110 milhões de casos – Estados Unidos; (b) Entre 40 e 45 milhões – Índia; (c) Entre 35 e 40 milhões – França, Alemanha e Brasil; (d) Entre 30 e 35 milhões – Japão e Coreia do Sul; (e) Entre 25 e 30 milhões – Itália; (f) Entre 20 e 25 milhões – Reino Unido e Rússia; (g) Entre 15 e 20 milhões – Turquia (estatísticas congeladas); (h) Entre 12 e 15 milhões – Espanha; (i) Entre 10 e 12 milhões – Vietnã, Austrália e Argentina; (j) Entre 8 e 10 milhões – Taiwan e Países Baixos; e (k) Entre 6 e 8 milhões – Irã, México e Indonésia.

[3] Nessas estatísticas (casos e mortes) estão computados os números da China. Para detalhes e discussões a respeito do comportamento da pandemia desde março de 2020, tanto em escala mundial como nacional, ver os volumes da coletânea A pandemia e a lenta agonia de um país desgovernado, vols. 1-5 (aqui, aqui, aqui, aqui e aqui). Sobre o cálculo das taxas de crescimento, ver qualquer um dos três primeiros volumes.

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17 fevereiro 2023

Gôndolas


Nadir Afonso (1920-2013). Gôndolas. 2007.

Fonte: Fundação Nadir Afonso.

14 fevereiro 2023

A pandemia estaria a perder força em todo o mundo?

Felipe A. P. L. Costa [*].

RESUMO. – Este artigo atualiza as estatísticas (mundiais e nacionais) a respeito da pandemia divulgadas em artigo anterior (aqui). Em escala planetária, já foram registrados 673 milhões de casos e 6,85 milhões de mortes; em escala nacional, 36,93 milhões de casos e 697,67 mil mortes. Máscaras e vacinas seguem sendo as melhores armas que nós temos para (i) manter as estatísticas em declínio; e (ii) impedir o surgimento de novidades evolutivas e uma nova e repentina escalada dos números.

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1. ESTATÍSTICAS MUNDIAIS: ALGUMAS CONSIDERAÇÕES.

Levando em conta as estatísticas obtidas na manhã de hoje (13/2) [1], eis um resumo da situação mundial.

(A) – Em números absolutos, os 20 países mais afetados [2] estão a concentrar 74% dos casos (de um total de 672.906.429) e 68% das mortes (de um total de 6.853.985) [3].

(B) – Nesses 20 países, 482 milhões de indivíduos receberam alta, o que corresponde a 96% dos casos. Em escala global, 650 milhões de indivíduos já receberam alta.

(C) – Olhando apenas para as estatísticas das últimas quatro semanas, eis um resumo da situação: (a) Em números absolutos, a lista segue a ser liderada pelo Japão, agora com 1,53 milhão de novos casos; (b) Entre os cinco primeiros da lista, estão ainda os Estados Unidos (1,2 milhão), Taiwan (600), Coreia do Sul (534 mil) e o Brasil (305); e (c) A lista dos países com mais mortes segue a ser liderada pelos Estados Unidos (14,3 mil); em seguida aparecem Japão (8,02 mil), Alemanha (2,99), Brasil (2,33) e Itália (1,56). Sem esquecer que houve um recrudescimento na China e que as estatísticas de lá deram um salto: nas últimas quatro semanas, foram anotadas 22.835 mortes.

2. ESTATÍSTICAS BRASILEIRAS: SEMANA 6-12/2.

Ontem (12/2), de acordo com o Conselho Nacional de Secretários de Saúde, foram registrados em todo o país mais 298 casos e 0 morte. Teríamos chegado assim a um total de 36.932.830 casos e 697.674 mortes.

Na semana encerrada ontem (6-12/2), foram registrados 63.884 casos e 313 mortes. Ambas as estatísticas caíram em relação aos números da semana anterior (30/1-5/2: 74.685 casos e 602 mortes).

3. CODA.

Salvo alguma novidade evolutiva muito impressionante, as estatísticas (nacionais e mundiais) sugerem que a pandemia está a perder força. Tanto aqui como em escala planetária.

É uma notícia auspiciosa. Mas ainda não é o fim da pandemia.

Máscaras e vacinas seguem sendo as melhores armas que nós temos para (i) manter as estatísticas em declínio; e (ii) impedir o surgimento de novidades evolutivas e uma nova e repentina escalada dos números. (Lembrando que a vacina combate a doença, mas não impede o contágio. O que pode impedir o contágio é o uso correto de máscara facial.)

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NOTAS.

[*] Há uma campanha de comercialização envolvendo os livros do autor – ver o artigo Ciência e poesia em quatro volumes. Para mais informações ou para adquirir (por via postal) os quatro volumes (ou algum volume específico), faça contato pelo endereço meiterer@hotmail.com. Para conhecer outros artigos e livros, ver aqui.

[1] Como comentei em ocasiões anteriores, as estatísticas de casos e de mortes estão a seguir o painel Mapping 2019-nCov (Johns Hopkins University, EUA), enquanto as de altas estão a seguir o painel Worldometer: Coronavirus (Dadax, EUA).

[2] Os 20 primeiros países da lista podem ser arranjados em 11 grupos: (a) Entre 100 e 110 milhões de casos – Estados Unidos; (b) Entre 40 e 45 milhões – Índia; (c) Entre 35 e 40 milhões – França, Alemanha e Brasil; (d) Entre 30 e 35 milhões – Japão e Coreia do Sul; (e) Entre 25 e 30 milhões – Itália; (f) Entre 20 e 25 milhões – Reino Unido e Rússia; (g) Entre 15 e 20 milhões – Turquia (estatísticas congeladas); (h) Entre 12 e 15 milhões – Espanha; (i) Entre 10 e 12 milhões – Vietnã, Austrália e Argentina; (j) Entre 8 e 10 milhões – Taiwan e Países Baixos; e (k) Entre 6 e 8 milhões – Irã, México e Indonésia.

[3] Nessas estatísticas (casos e mortes) estão computados os números da China. Para detalhes e discussões a respeito do comportamento da pandemia desde março de 2020, tanto em escala mundial como nacional, ver os volumes da coletânea A pandemia e a lenta agonia de um país desgovernado, vols. 1-5 (aqui, aqui, aqui, aqui e aqui). Sobre o cálculo das taxas de crescimento, ver qualquer um dos três primeiros volumes.

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13 fevereiro 2023

History of materialism and critique of its present importance

Friedrich Albert Lange

All teleology has its root in the view that the builder of the universe acts in such a way that man must, on the analogy of human reason, call his action purposeful. This is essentially even Aristotle’s view, and even the Pantheistic doctrine of an immanent purpose holds to the idea of a purposefulness corresponding to human ideals, even though it gives up the extramundane person who in human fashion first conceives and then carries out this purpose. It can now, however, be no longer doubted that nature proceeds in a way which has no similarity with human purposefulness; nay, that her most essential means is such that, measured by the standard of human understanding, it can only be compared with the blindest chance. On this point we need wait for no future proof; the facts speak so plainly and in the most various provinces of nature so unanimously, that no view of things is henceforth admissible which contradicts these facts and their necessary meaning.

Fonte (em port.): Hardin, G., org. 1967. População, evolução & controle da natalidade. SP, Nacional & Edusp. Excerto de obra originalmente publicada em alemão (1866). Tradução para o inglês (3 vols.) apareceu em 1877-1881.

12 fevereiro 2023

16 anos e quatro meses no ar

F. Ponce de León

Neste domingo, 12/2, o Poesia Contra a Guerra completa 16 anos e quatro meses no ar.

Desde o balanço anterior – ‘16 anos e três meses no ar’ – foram publicados aqui pela primeira vez textos dos seguintes autores: A. John de Boer, Daniel Mazza, Galeno, George Herbert, Kenneth I. Taylor e Thomas H. Huxley. Além de textos de autores que já haviam sido publicados antes.

Cabe ainda registrar a publicação de imagens de obras dos seguintes artistas: Pierre Adolphe Valette e Wynford Dewhurst.

10 fevereiro 2023

Éramos sete – Lembrando Alpina Begossi e a turma de 1981

Felipe A. P. L. Costa [*] [**].

APRESENTAÇÃO. – Na última quarta-feira (8/2), recebi a notícia do falecimento de Alpina Begossi (1958-2023). Foi um susto imenso. E uma grande tristeza. Não sabia que ela estava a lutar contra um câncer – “Ela teve câncer no útero, depois... [alastrou]”, foi o que me relatou uma amiga. Não nos víamos há muitos anos. Às vezes, porém, trocávamos um ‘oi’ pelo correio eletrônico. O mais recente deles, em 23/10/2022. Em resposta a uma mensagem minha, falando do aniversário de 80 anos de Milton Nascimento (ver aqui), Alpina escreveu: “Como vai? Gostei sim! Bela homenagem!! Abraço”.

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I. O PRIMEIRO ENCONTRO.

A primeira vez que conversei com Alpina Begossi foi durante um encontro de estudantes de graduação em Biologia, no Rio de Janeiro. Isso foi em 1979. (Acho que o encontro ocorreu em uma faculdade particular, mas não lembro exatamente qual.) Eu estava lá como representante da minha universidade (UFJF), ao lado de duas colegas de curso.

Na época, ela e Jader (ver adiante) eram namorados. Acho que os dois ajudaram nos preparativos do evento e estavam lá meio que recepcionando o pessoal que chegava para o encontro. Veio gente de longe.

Por exemplo, um amigo que fiz nesse encontro, e com quem troco figurinhas até hoje, era um dos representantes da Biologia da UFRGS. Marcos (professor recém-aposentado da UFSJ) e eu defendíamos ideias e posições bem parecidas. Mas diferentes, por exemplo, das dos nossos anfitriões cariocas.

Na verdade, durante os poucos anos em que Alpina e eu convivemos mais de perto, discussões políticas e ideológicas (e.g., MDB vs. PT, MR-8 vs. Democracia Socialista, Stalin vs. Trotsky) sempre fizeram parte do cardápio. Sempre foram motivos para uma troca de farpas. Farpas minhas e farpas dela. Quase sempre por pura provocação ou pura palhaçada. Nunca brigamos.

II. ESTUDANDO ECOLOGIA NA UNICAMP.

Nós nos reencontramos no segundo semestre de 1980, quando ela e Jader foram se inscrever para o exame de seleção (mestrado) do Programa de Pós-Graduação em Ecologia da Unicamp (PPG-Ecologia). (Eu já morava em Campinas desde março de 1980 e estava a cursar algumas disciplinas isoladas.)

Um parêntesis. O mestrado em ecologia na Unicamp teve início em 1976. (O doutorado teria início em 1980.) Em 1979, quando me graduei, os estudantes brasileiros que quisessem fazer pós-graduação em ecologia tinham quatro opções: Inpa, UFRGS, UnB e Unicamp [1]. Eu havia trocado correspondências e estava razoavelmente informado a respeito dos quatro programas. Escolhi a Unicamp. Nunca tive dúvidas de que foi uma escolha acertadíssima.

Olhando em retrospecto, posso dizer que alguns dos professores com quem convivi em Campinas fizeram toda a diferença. De resto – e isso talvez tenha sido o mais importante –, ao contrário da apatia que vejo nos estudantes de hoje, havia muita efervescência entre nós, tanto em torno de questões técnicas (metodológicas, conceituais etc.) como em torno de questões filosóficas ou políticas. (Alguns de nós – mas não todos – havíamos participado do movimento estudantil. E isso nos fez muito bem. Aprendemos a falar, discutir e trabalhar em grupo, por exemplo, algo que a maioria dos jovens de hoje parece desconhecer.)

III. A TURMA DE 1981.

O exame de seleção foi no final de 1980. Aprovados, integramos a turma de 1981. (A Unicamp era – e continuou a ser por muitos anos – o melhor lugar para se estudar no país. E não só na área de ecologia [2].)

A turma de 1981 era particularmente inquieta e barulhenta. Mais do que as anteriores, eu diria. Éramos sete (entre parêntesis, a instituição em que cada um ingressaria posteriormente): Alpina (Unicamp), Ana (UFSM), Jader (UnB), Silvia (MCT), Tânia (UFSC), Waldir (Esalq) e o autor destas maltraçadas. (Eu era o caçula. O mais velho, salvo engano, era o Waldir, detentor de outras três comendas: era o único casado, o único que não era biólogo e o único que já era professor universitário.)

Tivemos ainda dois agregados. O querido e saudoso Elias Pacheco Coelho (1950-1987), aluno do doutorado, já então professor da UFRJ e que fez ao menos uma disciplina básica conosco; e a querida Dulce (UnB), da Biologia Vegetal e que foi fazer o curso de Manaus com a gente, no inverno de 1981 [3].

IV. A CONEXÃO UFRJ-UNICAMP.

Havia em nossa turma um claro predomínio de estudantes oriundos da UFRJ – Jader, Silvia e Tânia, além da própria Alpina. Todos cariocas, todos graduados no UFRJ. Não era um erro de amostragem nem era uma distorção iniciada em 1981. A rigor, desde o início do PPG-Ecologia, havia uma fartura de estudantes cariocas, quase todos graduados no Fundão. Não foi difícil de entender o motivo.

Embora a UFRJ já tivesse tido uma primeira experiência com pós-graduação nessa área, na época o programa estava desativado. O que de fato havia ali era um bom bacharelado em ecologia, algo ainda relativamente incomum [4]. Razão pela qual meus colegas cariocas haviam lido e estudado coisas que eu até então desconhecia por completo. (Sem contar o fato de que o ensino de ecologia na UFJF era uma nulidade – e assim continuou a ser por muitos anos.) Neste sentido, o que li e estudei em Campinas ao longo de 1980 fez toda a diferença.

V. DE VAQUINHAS A PESCADORES.

No mestrado, Alpina estudou e pesquisou o ‘drama da vida’ de alguns insetos fitófagos conhecidos popularmente como vaquinhas [5]. O grupo e o assunto escolhidos para a tese (i.e., hábitos alimentares dos insetos e o aposematismo que eles exibem), arrisco dizer, foram frutos de um arranjo momentâneo e provisório.

Não há dúvidas de que ela se envolveu com os crisomelídeos, com a ecologia das interações inseto-planta e com a teoria do mimetismo (entre outras coisas), mas era mais ou menos óbvio que não era isso o que ela planejava fazer ao longo de sua vida como pesquisadora científica.

A rigor, como outros biólogos que conheci naquela época, Alpina pretendia combinar a formação acadêmica com o ativismo social e a militância política. Veja, por exemplo, o que ela escreveu como uma dedicatória em sua tese de mestrado (1984): “A todos os que conseguiram aliar seu trabalho à luta pela evolução das relações humanas, em direção a uma sociedade sem diferenças sociais”.

No doutorado, decidiu então trabalhar com ecologia humana – mais especificamente, a economia e a ecologia da pesca e dos pescadores. Tornou-se uma referência na área, da qual nunca arredou pé [6].

VI. CODA.

Alpina foi casada com o físico Luiz Eduardo Oliveira (Unicamp). O casal teve duas filhas. Além das filhas, ela deixou dois netos.

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NOTAS.

[*] Sou grato a SGE, amiga de longa data, pela cuidadosa leitura de uma versão inicial deste artigo. Erros e omissões que o leitor venha a observar são de minha inteira responsabilidade, evidentemente.

[**] Para informações sobre como adquirir os livros do autor – Ecologia, evolução & o valor das pequenas coisas (2ª ed., 2014), Poesia contra a guerra (2015), O evolucionista voador & outros inventores da biologia moderna (2017) e O que é darwinismo (2019) –, ver o artigo Ciência e poesia em quatro volumes. Para adquirir algum volume em particular ou para mais detalhes, faça contato pelo endereço meiterer@hotmail.com. Para conhecer outros artigos ou obter amostras dos livros, ver aqui.

[1] Havia um curso afim na UFSCar. A rigor, porém, não era bem um curso de ecologia, era um programa de pós-graduação em limnologia. (Naquela época, eu classificaria o curso da UFSCar como ‘biologia de barragens’.)

[2] O curso de pós-graduação em Biologia Vegetal, por exemplo, oferecia disciplinas na área de sistemática que eram tidas como as melhores do mundo. Em tempo: Ironicamente, o colega que me alertou para o falecimento da Alpina, na mesma postagem me alertou também para o falecimento de Peter Edward Gibbs (1938-2023), botânico britânico que trabalhou na Unicamp e, mesmo após a sua saída da instituição, ainda manteve contato com colegas e alunos durante muitos anos.

[3] 1981 foi o ano da última edição de um curso de campo (Ecologia de Campo I ou III) que era ministrado em consórcio com o Inpa. Os alunos da Unicamp tinham de fazer dois cursos de campo, o de Manaus (no inverno), e o da Campininha (no verão). Não vou a Campinas desde 2005. A julgar pelas notícias que chegam até mim, no entanto, as coisas por lá mudaram muito. Nem sempre para melhor, infelizmente. Assim como ocorreu em outros programas e em outras universidades brasileiras, o PPG-Ecologia não passou incólume à degradação acadêmica que há mais de duas décadas vem sendo imposta pelos órgãos financiadores – estou a me referir aqui principalmente à política suicida do ‘Quanto mais rápido o aluno concluir o mestrado [doutorado], melhor’. Assim é que os cursos de campo – disciplinas intensivas com quatro semanas de duração –, por exemplo, se converteram em uma espécie de ‘passeio no parque’ de sete dias. Ou nem isso. Formalmente, os cursos de campo eram disciplinas obrigatórias (no mestrado, Ecologia de Campo I e II; no doutorado, Ecologia de Campo III e IV), mas hoje não é mais assim. É preocupante. Não há pressa nem falta de verba que justifique tamanho enxugamento e tamanha pobreza curricular. Não estranha observar o quão frágil é o nível médio dos novos mestres e doutores. Frágil e em declínio.

[4] O corpo docente da UFRJ contava com professores notáveis, como o saudoso Johann Becker (1932-2004), pioneiro no ensino de ecologia evolutiva entre nós, assim como Ricardo Iglesias Rios
 e John Du Val Hay – apenas para citar três dos que eu conheci pessoalmente. Não soa estranho, portanto, constatar que a UFRJ era – e continuou a ser por muitos anos ainda – uma exportadora de talentos para a Unicamp. Assim de pronto, sem pesquisar, consigo me lembrar de ao menos outros sete colegas cariocas que entraram em alguma das cinco turmas anteriores (1976-1980), a saber: Débora, Flávio, Fred, Paulo, Ricardo, Sérgio e Thomas. Além do saudoso Alfredo Luiz da Rocha Barreto (1954-2010), embora este último não tenha se graduado no Fundão.

[5] Vaquinhas são besouros crisomelídeos agrupados hoje em uma única tribo (Chrysomelidae: Galerucinae: Alticini). Na época, o nível do agrupamento era o de subfamília (Alticinae). Para ler ou capturar a tese, ver aqui.
Dois comentários adicionais. (i) Alguns autores preferem distinguir entre dissertação (mestrado) e tese (doutorado). No contexto deste artigo, adoto apenas ‘tese’ e por um motivo bem simples: Muitas das teses de mestrado defendidas por colegas meus, sobretudo ao longo da década de 1980, equivaleriam hoje a duas ou três teses de doutorado (em termos de abrangência conceitual, esforço de amostragem, revisão da literatura, consistência textual etc.). Não vou aqui entrar em detalhes, mas, trabalhando como revisor crítico, eu já li teses (inclusive de doutorado) que não deveriam ter sido aceitas (dentro e fora da biologia) sequer como trabalho de conclusão de curso. (ii) Sobre aposematismo, ver ainda O evolucionista voador & outros inventores da biologia moderna (Edição do Autor, 2017), de F. A P. L. Costa.

[6] Ver, por exemplo, Ecologia de pescadores da mata atlântica e da Amazônia (RiMa, 2013, 2ª edição), livro que foi organizado por ela. Uma entrevista de 2021 pode ser lida aqui; uma fala de 2022 pode ser vista e ouvida aqui.

* * *

09 fevereiro 2023

Animais vorazes

Galeno

Animais vorazes... tanto comem continuamente como eliminam sem cessar, levando uma vida de fato inimiga da filosofia e da música, como disse Platão, ao passo que animais mais nobres e mais perfeitos nem comem nem eliminam continuamente.

Fonte: Wrangham, R. 2010. Pegando fogo. RJ, Jorge Zahar. O filósofo e médico grego Galeno (129-c. 216 dC) foi um autor prolixo cujas obras influenciaram o desenvolvimento de várias áreas do conhecimento.

06 fevereiro 2023

Piquenique


Wynford Dewhurst (1864-1941). The picnic. 1908.

Fonte da foto: Wikipedia.

04 fevereiro 2023

O que mata mais – o frio, o calor ou as instituições?

F. Ponce de León

[I]f the misery of our poor be caused not by the laws
of nature, but by our institutions, great is our sin [1].
– Charles Darwin (1836).

O que você, protegido, alimentado e prezado leitor mais detesta, o frio do inverno ou o calor do verão?

O frio mata a gente de fome.

O calor mata a gente de sede.

No noroeste de Roraima, muitos ianomâmis morreram de fome nos últimos anos. E outros ainda correm risco. Sobretudo crianças (ver aqui).

O que soa estranho. Muito estranho.

Afinal, eles moram nos trópicos. Nas proximidades do Equador.

Chove muito na terra deles. Mas nunca neva.

Os ianomâmis nascem, crescem e vivem sem saber direito o que é passar frio.

Como é possível então que eles estejam a morrer de fome?

*

Nota.

[1] Em português (tradução livre): “Se a miséria dos nossos pobres não é causada pelas leis da natureza, mas sim pelas nossas instituições, grande é o nosso pecado.”


* * *

01 fevereiro 2023

Contra o senso comum: Usando a ciência e a Receita do Fogo Fantasma para cozinhar e economizar energia


Felipe A. P. L. Costa [*].

1. INTRODUÇÃO.

Caro leitor, permita-me uma advertência inicial: Embora este artigo tenha sido escrito pensando em brasileiros que cozinham em casa, o uso racional das fontes de energia é um assunto de interesse público em todos os países do mundo. Minimizar o consumo de energia (gás, eletricidade etc.) toca de imediato no bolso de quem vive com um orçamento apertado, assim como deveria tocar na consciência e, sobretudo, nas decisões políticas dos capitães de indústria que se movimentam contra as iniciativas que visam reduzir a queima e o desperdício de combustíveis fósseis.

Na hipótese de que o leitor vá prosseguir a leitura, seja-me permitida uma provocação: Tendo passado os olhos nos parágrafos a seguir, compare as minhas sugestões com a sua experiência pessoal, reflita e, por fim, pondere se o roteiro que ora proponho lhe parece factível. A julgar pelas pesquisas preliminares que fiz, estou particularmente impressionado com o fato de que o tempo de cozimento adotado por muitos brasileiros (com a panela sobre fogo aceso, diga-se) é absurda e desnecessariamente prolongado [1].

2. MATERIAL E MODO DE FAZER.

Eis a receita.

Material necessário: feijão (500 g), água (~2,5 L ou o necessário para cobrir o feijão e ocupar 10 dos 14 cm de altura do volume interno da panela – ver a imagem que acompanha este artigo) e uma fonte de calor (fogão a gás, no caso). Além, claro, de uma panela de pressão (a capacidade do modelo que tenho aqui é de ~4,2 L) [2].

Modo de fazer. São quatro etapas, a saber:

(1) Catar o feijão. (Para quem compra feijão empacotado: Pedras, torrões de terra e grãos mofados não são exatamente raros.) Despejar os grãos selecionados em uma vasilha. Lavar e escorrer. Cobrir os grãos com água. Manter a vasilha (coberta, de preferência) em um lugar sombreado por um período de 8-12 horas. Vistorie e, se necessário, adicione água para manter os grãos submersos [3].

(2a) Concluído o período de molho, escorra a água e despeje os grãos na panela. Cubra o feijão com uma água nova, observando as recomendações do fabricante. (As instruções, salvo melhor juízo, recomendam nunca encher até a tampa. A rigor, deve-se manter uma distância mínima entre a superfície da água e a tampa. No meu caso, as medidas foram citadas anteriormente.) Leve a panela ao fogo.

(2b) Coloque a tampa sobre a panela, mas não tranque. O truque aqui é simples, mas de duplo efeito: Leve a panela ao fogo, mas com a tampa ainda sem trancar. Aguarde alguns minutos. (Como a tampa não está trancada, a água tende a ferver mais depressa – i.e., a uma temperatura próxima de 100 °C.) Pouco antes de a água começar a ferver, haverá a formação de uma espuma sobrenadante; remova a espuma com uma colher; feche e agora tranque a tampa.

(3) Um pouco mais e a válvula começará a se movimentar. Mais alguns minutos e a válvula começará a expelir vapor (apitar); marque o tempo; aguarde 1-3 minutos e desligue. (O tempo exato de espera pode variar de acordo com o tipo ou a idade do feijão. Faça os ajustes necessários, para mais ou para menos, de acordo com as suas preferências. Eu mesmo, porém, já estou acostumado a obter um feijão cozido e extremamente macio com apenas 1 minuto de válvula apitando [4].)

Nos primeiros experimentos, eu aguardava 4-5 minutos de apito. O resultado foi sempre o mesmo: Um grão cozido e macio – para todos os tipos de feijão, Carioca, Preto, Vermelho e Manteiga. (Obtive o mesmo resultado com o grão-de-bico.)

Refiz as contas e me dei conta de que 4-5 minutos ainda era tempo demais. Reduzi para 1 minuto. Funcionou. E funcionou em todos os casos que já consegui testar (feijão Carioca e grão-de-bico; ainda vou testar com o Vermelho, que tem fama por aqui de ser um feijão mais duro) [5].

(4) Depois que tiver desligado o fogo, mantenha a panela trancada até que ela esteja completamente fria [6]. O que seguramente irá demorar algumas horas, mesmo no inverno. Feito isso, destranque, abra e confira. Se julgar que o feijão está suficientemente macio, pronto, agora é só temperar [7].

3. CODA.

Como eu disse antes, a economia proposta aqui é de gás, não de tempo. Pensando nisso e tentando tornar o roteiro um pouco mais óbvio e exequível, deixo aqui uma sugestão de cronograma: (1) Coloque os grãos de molho na manhã do dia 1 (digamos, às 8h00); (2) Cozinhe o feijão na noite do dia 1 (por volta de 20h00); (3) Tendo desligado a chama, deixe a panela dormir no fogão do dia 1 para o dia 2; e (4) No dia 2, destranque, abra e confira o resultado [8].

Então, caro leitor, o que lhe parece a Receita do Fogo Fantasma [9]?

*

Notas.

[*] Trechos deste artigo integram o livro A força do conhecimento & outro ensaios: Um convite à ciência (em processo de finalização). Para informações sobre como adquirir os livros do autor – Ecologia, evolução & o valor das pequenas coisas (2ª ed., 2014), Poesia contra a guerra (2015), O evolucionista voador & outros inventores da biologia moderna (2017) e O que é darwinismo (2019) –, ver o artigo Ciência e poesia em quatro volumes. Para adquirir algum volume particular ou para mais detalhes, faça contato pelo endereço meiterer@hotmail.com. Para conhecer outros artigos ou obter amostras dos livros, ver aqui.

[1] Não custa ressaltar: A economia proposta aqui é de gás, não de tempo.

[2] A necessidade faz o sapo pular. Consumidor habitual de feijão e morando atualmente sozinho, tive de superar uma preocupação (e um trauma da minha adolescência): panelas de pressão podem explodir. Diferentemente das panelas comuns, a panela de pressão é capaz de reter o vapor que é produzido dentro dela (temporariamente, claro). É dotada para isso de uma válvula regulatória. O segredo da panela de pressão é que ela faz com que a temperatura de ebulição da água aumente, saltando dos tradicionais 100 °C para algo próximo de 120 °C. Qual o efeito prático disso? Acelerar o cozimento. Veja: Quanto mais alta a temperatura de ebulição da água, mais rápido será o cozimento. (O contrário é verdadeiro: Quanto mais baixa a pressão, mais baixa será a temperatura de ebulição e, por conseguinte, mais demorado será o cozimento. Quem vive em localidades acima de 3 mil m de altitude – não temos isso no país – sabe bem do que eu estou falando aqui. Esta foi, aliás, uma das motivações por trás da invenção e do desenvolvimento da panela de pressão: cozinhar em altitudes elevadas. Aliada, claro, ao desejo de reduzir o tempo de cozimento.) Quando a pressão interna da panela atinge o seu valor máximo, a válvula começa a apitar. A partir daí, enquanto o fogo estiver aceso, a válvula seguirá expelindo jatos de vapor, de tal modo que a pressão e a temperatura internas permanecerão inalteradas. Uma implicação prática disso é que, assim que a válvula começa a apitar, nós devemos colocar a chama no mínimo. Manter a chama no máximo implicaria apenas e tão somente em desperdício de gás, visto que a pressão e a temperatura lá dentro já estão no máximo.

[3] Leguminosas (feijão, grão-de-bico etc.) e cereais (arroz etc.) são ricos em fitatos (ácido fítico). Deixar o feijão de molho, a julgar pelos poucos artigos que consultei, já reduz muito a concentração dessa substância – 4 horas de molho já resulta em uma redução expressiva, mas 12 horas tem um impacto ainda mais expressivo. (Diminuir a concentração de fitatos aumenta a digestibilidade e o valor nutricional do alimento.) Mas não zera. De fato, a espuma que se forma por cima da água no início do cozimento tem a ver também com essa substância.

[4] O tempo médio de espera, levando em conta as consultas que fiz, incluindo aí quase 20 vídeos que assisti no YouTube (todos em português e quase todos com dicas de cozimento equivocadas ou até mesmo esdrúxulas), é bem superior: 20 minutos de válvula apitando, chegando a 40 minutos em casos extremos! Aguardar esse tempo todo (10-40 minutos) é puro desperdício de gás. Além, claro, de aumentar muito as chances de algum acidente (ver aqui).

[5] Inúmeras variedades de feijão (Phaseolus vulgaris L.) são consumidas diariamente em muitos países. A presença de feijão na mesa dos brasileiros, sobretudo na hora do almoço, é um dos nossos hábitos alimentares mais bem estabelecidos.

[6] Não tem mágica: O calor que vai terminar de cozinhar o feijão – o fogo fantasma – já está dentro da panela. Nós só precisamos aguardar. Forçar o esfriamento para abrir logo a panela, como muitas vezes acontece, é um duplo desperdício: de água e, sobretudo, de calor (e, claro, de gás).

[7] Vegetais (abóbora etc.) ou peças de carne (bacon, linguiça etc.) podem ser colocadas para cozinhar junto com o feijão, sem qualquer problema.

[8] Não se preocupe: O interior da panela foi esterilizado e o feijão, tendo dormido fora da geladeira, não corre nenhum risco de estragar.

[9] Caso o leitor de fato se disponha a testar a receita, gostaria muito de conhecer os resultados obtidos. (Meu endereço de correio-e aparece no início destas notas.) Principalmente na hipótese de que os resultados venham contradizer a minha previsão – 1 minuto de válvula apitando sinaliza tempo mais do que suficiente para cozinhar todo e qualquer tipo de feijão, sobretudo se este foi previamente colocado de molho em água.

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