F. Ponce de León
O filósofo e poeta
Antônio Cícero mantém um blogue literário, ‘Acontecimentos’,
no qual reproduz obras suas e de outrem. Em visita ao blogue, na última
sexta-feira (22/1), encontrei o seguinte poema (postagem ‘Matthew Rohrer:
‘Poem’/’Poema’: trad. de Sylvio Fraga’, de 17/1):
Poem
Matthew Rohrer
You called, you’re on
the train, on Sunday,
I have just taken a
shower and await
you. Clouds are
slipping in off the ocean,
but the room is gently
lit by the green
shirt you gave me. I
have been practicing
a new way to say hello
and it is fantastic.
You were so sad:
goodbye. I was so sad.
All the shops were
closed but the sky
was high and blue. I
tried to walk it off
but I must have walked
in the wrong direction.
O autor, como o título da
postagem já indica, é o poeta estadunidense Matthew Rohrer.
Na postagem, o original vem acompanhado da seguinte versão em português:
Poema
Matthew Rohrer
Você ligou, está no ônibus, no domingo,
acabei de tomar banho e espero você
chegar. Nuvens vêm deslizando do mar,
mas o quarto é delicadamente aceso pela camisa
verde que você me deu. Tenho praticado
uma nova forma de dizer oi e é fantástica.
Você estava tão triste: tchau: eu estava tão triste.
Todas as lojas estavam fechadas mas o céu
era alto e azul. Fui dar uma volta para ver se passava,
mas devo ter andado na direção errada.
Esta versão, do poeta e
compositor Sylvio Fraga Neto,
está no livro O andar ao lado: Três novos
poetas norte-americanos [sic] –
Matthew Rohrer, Jon Woodward, Matthew Zapruder, publicado pela editora
7Letras, em 2013. (Assim como Rohrer, Woodward e Zapruder
nasceram nos Estados Unidos – os três, portanto, são estadunidenses.) Além da
tradução, Fraga foi responsável pela seleção dos poemas que integram a obra.
Uma versão alternativa
Confesso que eu ainda não
conhecia o autor nem a sua obra – a qual, a rigor, continuo desconhecendo,
excetuando um ou outro poema que li nos últimos dias. O restante deste artigo,
portanto, pode vir a se revelar um grande equívoco.
O ponto de partida do
poema é o iminente reencontro de um casal (homem/mulher ou qualquer outro). Há
uma única estrofe, mas os seus 10 versos podem ser divididos em três partes, a
saber: “o reencontro e a esperança de um futuro melhor” (v. 1-5), “a mudança de
comportamento do narrador” (v. 5-6) e o “passado doloroso e frustrante” (v.
7-10).
Na primeira parte, o
narrador descreve as suas expectativas. O mundo é grande e não faltam problemas
(Clouds are slipping in off the ocean),
mas há motivos para ter esperança (gently
lit by the green shirt). Na segunda, o narrador dá a entender que está
empenhado em mudar (a new way to say
hello), algo que parece empolgá-lo (it
is fantastic). Na parte final, ele relembra a separação, triste e dolorosa.
As promessas de felicidade (the sky was
high and blue) não se realizaram – o narrador não foi feliz após a separação
(in the wrong direction). O
reencontro, portanto, seria uma renovada oportunidade de um futuro melhor.
A versão em português
parece preocupada em realçar o coloquialismo presente no original (oi, v. 6, e tchau, v. 7), a ponto de tomar algumas liberdades (ônibus, v. 1, e dar uma volta para ver se passava, v. 9). Penso que certas escolhas
do tradutor subverteram o significado original, a ponto de atrapalhar a
compreensão do poema. Entre os ruídos que me chamaram a atenção, citaria ainda
os trechos “o quarto é delicadamente aceso” (v. 4) e “o céu era alto e azul” (v.
8 e 9).
Não pretendo ensinar o
Pai-Nosso ao vigário, mas resolvi preparar uma versão alternativa. Eis a minha
sugestão:
Poema
Matthew Rohrer
Você telefonou, do trem onde está – é domingo;
acabei de tomar um banho e aguardo
você. Nuvens chegam do oceano,
a sala, porém, está vagamente iluminada pelo verde
da camisa que você me deu. Tenho exercitado
um novo modo de dizer olá – é fantástico.
Você estava tão triste: adeus. Eu estava tão triste.
Todas as lojas estavam fechadas, o céu, porém,
era alegre e azul. Tentei ir embora,
mas eu devo ter ido na direção errada.
Comentários adicionais em
português sobre a vida e obra de Rohrer podem ser encontrados no artigo ‘Caseiro e estranho’,
de Eucanãa Ferraz, publicado na revista piauí,
em fevereiro de 2013.