3. Progressões.
O ensino de matemática no ensino médio envolve o estudo de dois tipos especiais de sequências numéricas, as progressões aritméticas e as p. geométricas.
Já era assim na minha época e, até onde sei, é assim ainda hoje [1].
3.1. Progressões aritméticas.
Progressões aritméticas [2] são sequências nas quais o aumento de cada termo para o seguinte é sempre o mesmo. Esse aumento é chamado de razão da progressão (representada pela letra r) [3].
As sequências (1, 5, 9, 13, ...) e (1, – 3, – 7, – 11, ...) são exemplos de progressões aritméticas cujas razões são 4 e – 4, respectivamente.
Em uma progressão aritmética (a1, a2, a3, a4, ...), para avançar um termo, basta somar a razão (ak + 1 = ak + r); para avançar dois termos, basta somar a razão duas vezes (ak + 2 = ak + 2r); para avançar três termos, basta somar a razão três vezes (ak + 3 = ak + 3r); e assim por diante.
O termo geral de uma progressão aritmética é dado pela fórmula
an = a0 + nr,
onde an representa o termo de ordem n; a0 é o termo inicial; n é o número de posições que separam a0 de an; e r é a razão.
Vejamos um exemplo.
Uma cidade tem 12.500 habitantes e está a ganhar 250 novos habitantes a cada ano. Qual será o tamanho da população daqui a 4 anos?
O tamanho da cidade daqui a n anos é an. Temos a0 = 12.500 e queremos achar a4. Como o número de habitantes que a cidade ganha a cada ano é constante, estamos diante de uma progressão aritmética. A razão dessa progressão é r = 250. Façamos as contas: a4 = a0 + 4r = 12.500 + 1.000. Resposta: a cidade terá 13.500 habitantes daqui a 4 anos.
Um segundo exemplo. Em 10 anos, a população de uma cidade passou de 5.000 para 8.000 habitantes. Admitindo que o crescimento anual tenha sido em progressão aritmética, calcule o número de habitantes que a cidade ganhou a cada ano.
Temos a0, n e an. Admite-se que o número de habitantes que a cidade ganhou a cada foi constante. Trata-se de uma progressão aritmética cuja razão r nós devemos descobrir. Da fórmula geral, obtemos: r = (a10 – a0) / n = (8.000 – 5.000) / 10. Resposta: a cidade ganhou 300 habitantes a cada ano.
3.2. Progressões geométricas.
Progressões geométricas são sequências nas quais a taxa de crescimento i de cada termo para o seguinte é sempre a mesma. Cada termo é igual ao anterior multiplicado por (1 + i). Este fator de multiplicação é chamado de razão da progressão (representada pela letra q).
As sequências (1, 2, 4, 8...) e (1, ½, ¼, 1/8...) são exemplos de progressões geométricas cujas razões são 2 e ½, respectivamente.
Em uma progressão geométrica (a1, a2, a3, a4...), para avançar um termo, basta multiplicar pela razão (ak + 1 = akq); para avançar dois termos, basta multiplicar pela razão duas vezes (ak + 2 = ak x q x q = akq2); para avançar três termos, basta multiplicar pela razão três vezes (ak + 3 = ak x q x q x q = akq3); e assim por diante.
O termo geral de uma progressão geométrica é dado pela fórmula
an = a0qn,
onde an representa o termo de ordem n; a0 é o termo inicial; n é o número de posições que separam a0 de an; e q é a razão.
Exemplo. Criado em cativeiro, um filhote de elefante passou de 500 kg para 800 kg em 6 meses. Qual foi o crescimento médio mensal? Vejamos.
Temos a0 = 500 kg, n = 6 e a6 = 800 kg, e queremos achar a razão q. Achando a razão, descobrimos a taxa de crescimento i, visto que i = q – 1. Há dois motivos para tratarmos a questão como um caso de progressão geométrica: (1) O crescimento do corpo é um processo essencialmente multiplicativo, não aditivo [4]; e (2) Como a questão fala em taxa média, nós podemos admitir que a razão q permaneceu constante no intervalo em questão. Façamos as contas. Da fórmula geral, obtemos: q = (a6 / a0)1/6 = (800 / 500)1/6 = (1,6)1/6. Usando uma calculadora, descobrimos que q = 1,081484. Resposta: a taxa de crescimento mensal (i = q – 1) foi equivalente a uns 8,15%.
Comentário adicional. Note a diferença entre crescimento aditivo e c. multiplicativo. No exemplo acima, o filhote de elefante ganhou 300 kg em 6 meses. Se o ganho tivesse ocorrido em progressão aritmética, a sequência seria (500, 550, 600, 650, 700, 750, 800). Em progressão geométrica, no entanto, a sequência foi (500, 541, 585, 632, 684, 740, 800) [5]. No primeiro caso, estamos somando uma mesma quantidade; no segundo, estamos multiplicando por uma mesma taxa.
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[FIGURA. A figura que acompanha este artigo ilustra o crescimento populacional de três cidades ao longo de 12 anos. No início, as três têm exatamente a mesma população, N(0) = 50. Mas seguem trajetórias distintas, visto que a cidade A (quadrado vazio) cresce em progressão aritmética, enquanto B (triângulo cheio) e C (triângulo vazio) crescem em progressão geométrica, a taxas anuais de 30 e 50%, respectivamente. (Eixo horizontal: tempo, em anos; eixo vertical, tamanho da população.)]
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4. Crescimento numérico de populações.
Populações biológicas são agrupamentos de indivíduos coespecíficos que vivem em um mesmo hábitat, ao menos temporariamente.
É pretensão da ecologia não só descrever os padrões numéricos encontrados na natureza (e.g., por que algumas espécies são numerosas, enquanto outras são raras?), mas também explicar os seus atributos dinâmicos (e.g., por que certas populações oscilam tanto de tamanho ao longo do ano, enquanto o de outras permanece mais ou menos inalterado?).
4.1. BIDE: Um ponto de partida.
O tamanho de uma população (representado por N) corresponde ao número total de indivíduos (imaturos, adultos etc.) presentes em um dado instante [6].
Trata-se de uma grandeza dinâmica, sujeita a altos e baixos. Assim é que o valor de N em um dado instante é um balanço momentâneo entre ganhos (nascimentos e imigrações) e perdas (mortes e emigrações) de indivíduos. Quando os ganhos superam as perdas, a população cresce; quando as perdas são maiores, a população diminui. Quando ganhos e perdas se equivalem, a população permanece estacionária.
Podemos expressar o que foi dito da seguinte maneira:
N(t + 1) = N(t) + B + I – (D + E), (eq. 4.1)
onde N(t + 1) representa o tamanho da população no momento (t + 1); N(t) é o tamanho da população no momento anterior (t); B é o número de nascimentos; I é o número de imigrantes (coespecíficos que, vindos de fora, passam a integrar a população em foco); D é o número de mortes; e o E indica o número de emigrantes (indivíduos que abandonam a população em foco).
A série (t), (t + 1), (t + 2), (t + 3), (t + 4) etc. pode ser vista como uma sucessão de momentos de amostragem ao longo do tempo. O intervalo entre eles é mantido constante, mas pode ser medido em diferentes escalas (dias, meses, anos etc.), a depender do interesse do pesquisador. Adotando uma escala mensal, por exemplo, N(0) seria o tamanho inicial da população (t = 0); N(1), o tamanho após um mês; N(2), o tamanho após dois meses; e assim por diante.
Em muitos casos, o tamanho da população só é afetado por B e D, visto que I e E são nulos ou quase nulos. Em tais circunstâncias, a população é dita fechada e, para ela, a eq. (4.1) se reduz a
N(t + 1) = N(t) + B – D. (eq. 4.2)
4.2. Taxa de crescimento per capita.
Para capturar e expressar de modo apropriado as flutuações populacionais, as variáveis B e D devem ser decompostas, revelando o que pode estar embutido em cada uma delas. Vejamos.
O número de nascimentos (B), por exemplo, pode ser visto como o resultado da multiplicação bN(t), onde b é a taxa de natalidade per capita (i.e., número de nascimentos por indivíduo vivo presente na população) e N(t) é o tamanho da população no instante (t).
O mesmo raciocínio se aplica ao número de mortes, D. A multiplicação neste caso seria dN(t), onde d é a taxa de mortalidade per capita (i.e., número de mortes por indivíduo vivo presente na população).
Substituindo estas duas igualdades na equação 4.2, fazemos
N(t + 1) = N(t) + bN(t) – dN(t) = (1 + b – d)N(t),
substituindo (b – d) por λ (letra grega minúscula lambda), obtemos
N(t + 1) = (1 + λ)N(t), (eq. 4.3)
onde λ seria a taxa de crescimento per capita [7].
Uma versão generalizada da eq. (4.3) seria a seguinte [8]
N(t) = N(0)(1 + λ)t, (eq. 4.4)
onde N(t) representa o tamanho da população em um momento qualquer (t); N(0) é o tamanho inicial (t = 0); t é o intervalo de tempo transcorrido desde t = 0; e λ é a taxa de crescimento.
Admitindo que o fator de crescimento (1 + λ) seja mantido constante, ao menos durante um intervalo suficientemente longo, não é difícil perceber que há um paralelo entre a equação (4.4) e o termo geral das progressões geométricas, an = a0qn – lembrando que q = (1 + i).
4.3. Calculando o tempo de duplicação.
Exemplo. Uma aldeia tem 100 habitantes. Quantos serão daqui a cinco anos, caso a população da aldeia cresça a uma taxa anual de 5%?
Temos N(0), λ e t. Nosso problema é descobrir N(t), quando t = 5. Façamos as contas. Substituindo os valores que temos na equação geral, descobrimos que N(5) = N(0)(1 + λ)5 = 100 x (1 + 0,05)5 = 100 x 1,2763 = 127,63. Resposta: daqui a cinco anos, a aldeia terá aproximadamente 128 habitantes.
Um segundo exemplo. A população de um país está a crescer a uma taxa anual de 5%. Admitindo que esta taxa permaneça constante, quantos anos serão necessários para a população dobrar de tamanho?
Ao que parece, temos apenas λ. Mas o nosso problema é descobrir t, de tal modo que N(t) = 2N(0). Pois bem, substituindo o que temos na equação geral, vemos que 2N(0) = N(0)(1 + 0,05)t. Simplificando, obtemos (1 + 0,05)t = 2. Para ‘descer’ o expoente (nossa incógnita), aplicamos logaritmo nos dois lados da equação, e chegamos a t x ln 1,05 = ln 2, de onde fazemos t = ln 2 / ln 1,05 = 0,69315 / 0,04879 ≈ 14,2. Reposta: A população da cidade levaria pouco mais de 14 anos para dobrar de tamanho.
Por fim, ainda em relação à questão anterior: E se a taxa de crescimento fosse de 1% ao ano, quantos anos seriam necessários para a população dobrar de tamanho?
O procedimento é o mesmo. Podemos então abreviar caminho, indo direto para a última etapa. Temos (1 + 0,01)t = 2. Aplicando logaritmo, chegamos a t = ln 2 / ln 1,01 = 0,69315 / 0,00995 ≈ 69,66. Resposta: O tempo de duplicação agora seria de quase 70 anos.
Notas
[*] Para detalhes e informações sobre o livro mais recente do autor, O que é darwinismo (2019), inclusive sobre o modo de aquisição por via postal, faça contato pelo endereço meiterer@hotmail.com. Para conhecer outros livros e artigos, ver aqui.
[1] Para um panorama geral, ver Lima, EL & mais 3. 2006. A matemática do ensino médio, vol. 2, 6ª ed. RJ, Sociedade Brasileira de Matemática. O volume serviu de fonte e inspiração para a elaboração do item 3 (Progressões).
[2] Uma lembrança particularmente valiosa que tenho dos meus anos de ensino médio – e já lá se vão algumas décadas – é a do meu primeiro contato com a noção matemática de limite. Foi em uma aula sobre a soma dos termos de progressões (decrescentes) infinitas. Para mim, foi desconcertante. Fiquei muito intrigado com a possibilidade de se obter um resultado e enchi o professor com perguntas.
[3] Estou a me referir aqui às chamadas progressões aritméticas de primeira ordem.
[4] Ver a Parte I desta série de artigos (está aqui).
[5] Valores arredondados para o inteiro mais próximo.
[6] Há outros conceitos. Por exemplo, o de tamanho populacional efetivo (Ne). Este último costuma ser definido como o número de indivíduos que, em condições ideais, teria o seu fundo gênico exposto aos mesmos riscos de mudança aleatória (deriva) que uma população real. O conceito parte do princípio de que a estrutura reprodutiva de populações naturais nem sempre se ajusta com facilidade aos pressupostos dos modelos teóricos. Diversos fatores podem levar a desajustes, incluindo flutuações bruscas no tamanho da população, razão sexual aberrante e variações na estrutura demográfica. O valor de Ne em geral é inferior ao número de indivíduos presentes na população (N), ainda que a magnitude da diferença varie de acordo com as circunstâncias. Por exemplo, Ne é menor (ou bem menor) que N quando o número de machos e fêmeas é muito desigual. Para detalhes e referências, ver Costa, FAPL. 2017. O evolucionista voador & outros inventores da biologia moderna. Viçosa, Edição do autor.
[7] Quando a diferença entre os tamanhos populacionais é muito grande, λ é aproximadamente igual à razão entre N(t + 1) e N(t).
[8] Quanto t = 1, temos N(1) = N(0)(1 + λ). Prosseguindo, teríamos N(2) = N(1)(1 + λ); N(3) = N(2)(1 + λ); N(4) = N(3)(1 + λ); e assim por diante. Cada uma destas equações pode ser reescrita em função do tamanho inicial, N(0), a exemplo de N(1). Assim, após dois períodos de tempo (t = 2), temos N(2) = N(0)(1 + λ)(1 + λ) =.N(0)(1 + λ)2. Após três períodos, N(3) = N(2)(1 + λ) = N(0)(1 + λ)2(1 + λ) =.N(0)(1 + λ)3. Poderíamos prosseguir, mas já deve estar claro que a equação geral é N(t) = N(0)(1 + λ)t.
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