As divergências a respeito da filogenia dos artrópodes estão refletidas nos diferentes sistemas de classificação que têm sido propostos para o grupo. Neste livro, adotamos um sistema que trata os artrópodes como integrantes de um único filo, dividido, por sua vez, em dois grandes grupos, a saber: Quelicerados – artrópodes portadores de quelíceras, como ocorre com os aracnídeos e grupos menos conhecidos; e Mandibulados – artrópodes portadores de mandíbulas, incluindo mandibulados aquáticos (crustáceos) e m. traqueados (insetos e miriápodes).
Todos os integrantes desses táxons partilham de várias características distintivas, como o corpo segmentado, o exoesqueleto quitinoso, a presença de apêndices segmentares pares e um coração dorsal.
No que segue, serão destacadas as principais características dos artrópodes quelicerados e, em seguida, as dos mandibulados.
Quelicerados
Os quelicerados (Chelicerata) possuem o corpo dividido em duas regiões ou tagmas, o cefalotórax (ou prossoma) e o abdome (ou opistossoma).
O aparelho bucal possui dois pares de apêndices: um primeiro par de quelíceras e um segundo par de pedipalpos. Esses artrópodes são desprovidos de antenas. O cefalotórax em geral sustenta quatro pares de pernas, enquanto o abdome abriga vários órgãos e sistemas de órgãos, como os que estão envolvidos com os processos de respiração, reprodução e produção de seda.
Umas 70 mil espécies de quelicerados viventes já foram descritas. Todas essas espécies costumam ser arranjadas em três grupos: os picnogônidos, os xifosuros e os aracnídeos. Os picnogônidos, ao que parece, derivaram cedo do ramo ancestral que em seguida deu origem às outras duas linhagens.
Os picnogônicos (também chamados de aranhas-do-mar, em razão de o aspecto geral do corpo às vezes lembrar uma aranha) estão representados na fauna atual por cerca de mil espécies. Os xifosuros ou límulos, que em épocas remotas já foram muito mais abundantes e diversificados, estão representados hoje por apenas cinco espécies. Tanto os picnogônidos como os xifosuros são quelicerados exclusivamente marinhos.
No que segue, vamos examinar mais de perto o rico e diversificado grupo dos aracnídeos.
Aracnídeos
A classe Arachnida abriga uma ampla variedade de artrópodes quelicerados, incluindo ácaros, aranhas, escorpiões, opiliões e pseudoescorpiões, além de vários outros grupos menores e menos conhecidos. A classe abriga 98% de todas as espécies de quelicerados. Em número de espécies conhecidas, é a segunda classe do reino Animalia, ficando atrás apenas dos insetos.
Os aracnídeos vivem quase que exclusivamente terrestres, sendo encontrados nos mais diferentes tipos de hábitats. Várias características desses artrópodes estão associadas à vida em terra firme, incluindo a presença de um sistema excretório com túbulos de Malpighi, órgãos internos para troca de gases por respiração aérea e fecundação interna.
De resto, trata-se de um grupo heterogêneo e bastante diversificado, tanto em termos morfológicos como nos hábitos de vida. Neste sentido, vale ressaltar que, embora reúna um número menor de espécies, a variedade morfológica observada na classe Arachnida é maior do que a existente entre os integrantes da própria classe Insecta.
O corpo dos aracnídeos é dividido em duas regiões: cefalotórax e abdome. O cefalotórax está parcial ou inteiramente coberto por um escudo em forma de carapaça e sustenta um determinado número de apêndices. O abdome, por sua vez, pode ou não estar subdividido e é desprovido de apêndices, ou estes estão modificados em fiandeiras (aranhas) ou pentes (escorpiões). As trocas gasosas ocorrem em traqueias, pulmões foliáceos ou ambos, enquanto a excreção depende de túbulos de Malpighi ou de glândulas coxais.
A reprodução ocorre com fertilização interna. A transferência de espermatozoides, no entanto, pode ser direta ou indireta. Os rituais de corte podem ser bastante elaborados. A maioria dos aracnídeos é ovípara, embora os escorpiões e alguns ácaros sejam vivíparos.
Classificação
As 70 mil espécies viventes de aracnídeos estão arranjadas em uma série de grupos taxonômicos (ordens) bastante variados, alguns ainda pouco conhecidos. No que segue, destacam-se alguns desses grupos, a saber:
Escorpiões (ordem Scorpiones). São conhecidas aproximadamente 1,2 mil espécies em todo o mundo. O grupo, que já foi mais numeroso, é antigo, com registros fósseis que retrocedem até o Siluriano, há uns 420 milhões de anos. Os escorpiões do Siluriano eram espécies aquáticas, desprovidas de garras tarsais e com um porte de corpo bem maior do que o das espécies atuais. Todos os escorpiões viventes são predadores de hábitos carnívoros.
O corpo dos escorpiões se divide em cefalotórax e abdome. O cefalotórax está coberto dorsalmente por uma carapaça. No centro dessa carapaça há um par de olhos medianos, além de dois a cinco pares de olhos laterais, dependendo da espécie, ao longo da margem anterior. As quelíceras são pequenas e projetam-se para frente. Um caráter distintivo é a presença de pedipalpos hipertrofiados, formando um par de grandes pinças, com as quais o escorpião captura e manipula suas presas. Atrás do par de pedipalpos, há quatro pares de pernas locomotoras. O cefalotórax termina e o abdome começa sem que haja um estreitamento (pedicelo), pois ambos se prendem amplamente. O abdome consta de um pré-abdome, com sete segmentos largos, e de um pós-abdome (ou ‘cauda’), com cinco segmentos estreitos. O ânus e o aparelho de ferrão, o télson, tão característico desses animais, estão no último segmento do pós-abdome. O ferrão consiste de uma base e de um aguilhão afiado. A peçonha com a qual os escorpiões paralisam suas presas é produzida por um par de glândulas situadas na base do télson.
As trocas gasosas são feitas por quatro pares de pulmões foliáceos, que se abrem na face ventral do pré-abdome. A excreção é feita por dois pares de túbulos de Malpighi e um par de nefrídios (as chamadas glândulas coxais) que se abrem nas coxas do terceiro par de pernas locomotoras.
De todas as 1 200 espécies conhecidas de escorpiões, umas poucas dezenas (todas da mesma família) produzem uma peçonha cuja ação é potencialmente perigosa para seres humanos. No Brasil, ocorrem acidentes com certa gravidade, principalmente entre crianças e idosos, envolvendo duas espécies do gênero Tityus, T. serrulatus (escorpião-amarelo) e T. bahiensis (escorpião-preto). A ação neurotóxica da peçonha pode resultar em convulsões, dificuldades respiratórias e arritmia cardíaca. A aplicação de soro em pessoas que foram picadas neutraliza a ação da peçonha; por isso, em caso de acidente, deve-se procurar rapidamente um posto de saúde que tenha soro e profissionais capacitados.
Fonte: Costa, F. A. P. L. 2010. Projeto Eco: Biologia, vol. 2. Curitiba, Positivo,