Homens que nunca tiveram a experiência de, no meio de uma epidemia, tentar permanecer calmos e manter as condições experimentais, não se dão conta, na segurança de seus laboratórios, do que se tem de enfrentar.
– Sinclair Lewis (1885-1951), Arrowsmith (1925) [**].
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RESUMO. Este artigo ajusta e detalha as projeções feitas a respeito dos números da pandemia em todo o país até o último domingo de agosto (ver ‘No ritmo atual, o país irá contabilizar ao menos 3 milhões de casos e 105 mil mortes até 30 de agosto’). Após sete quedas sucessivas, a média semanal da taxa de crescimento diário no número de novos chegou a 1,7% (13-19/7). É o menor valor desde o início da crise. Caso a trajetória declinante persista até 30/8 (a uma razão de –0,3% por semana), calculo que até lá serão contabilizados 2.992.530 casos (e não os 3.033.726 previstos anteriormente). Calculo ainda que, mantida a taxa de letalidade das últimas quatro semanas (2,9%), os casos adicionais previstos implicarão em mais 25.545 mortes. Chegaríamos assim a 105.033 mortes até 30/8. (Segundo o Ministério da Saúde, o país chegou ontem [19/7] a 2.098.389 casos e 79.488 mortes.) Os números estão em um patamar muito elevado, não há dúvida. Todavia, ao contrário do que alardeiam alguns observadores, as estatísticas não estão a escalar de modo desenfreado nem a pandemia está fora de controle.
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1. BREVE RECAPITULAÇÃO.
A doença do coronavírus 2019 (Covid-19) pode ser descrita como um tipo bastante agressivo de pneumonia [1]. O primeiro registro da doença ocorreu em Wuhan, capital da província chinesa de Hubei. Isso foi em 12/12/2019. Dias depois, ocorreu um primeiro surto na cidade, o que chamou a atenção das autoridades sanitárias. O agente etiológico da Covid-19 é o coronavírus da síndrome respiratória aguda grave 2 (SARS-CoV-2; referido anteriormente como 2019-nCoV ou WHCV) [2].
O vírus e a doença logo se disseminaram pelo mundo.
Em 1/3, além da China, já havia registros em outros 58 países, em todos os continentes (excetuando-se apenas a Antártida). Em 11/3, diante da rápida disseminação e da escalada nos números, o que até então estava sendo referido como uma emergência de saúde pública de interesse internacional, passou a ser tratado pela Organização Mundial da Saúde como uma pandemia [3].
2. A PANDEMIA CHEGA AO BRASIL.
A pandemia teria chegado ao país no início de fevereiro, ao menos duas semanas antes do Carnaval (21-25/2). De acordo com as estatísticas do Ministério da Saúde, no entanto, o primeiro caso só foi identificado na Quarta-feira de Cinzas (26/2)! Ainda segundo o MS, a primeira morte foi registrada três semanas depois, em 17/3.
Até meados de março, os números da pandemia permaneceram em patamares relativamente modestos. Em 5/3, havia sete casos confirmados. Em 13/3, eram 98. Oito dias depois, coincidindo com o fim do verão, ultrapassamos a marca de 1 mil casos (1.128, em 21/3). Mais duas semanas e ultrapassamos os 10 mil casos (10.278, em 4/4).
A partir de então o ritmo arrefeceu. Levamos quatro semanas para bater em 100 mil casos (101.147, em 3/5). O ritmo tornou a acelerar e, em menos de duas semanas, o país ultrapassou a barreira dos 200 mil casos (202.918, em 14/5) e, uma semana depois, a dos 300 mil (310.087, em 21/5).
A partir de então, a um ritmo médio de mais de 150 mil casos/semana, levamos cinco semanas para ultrapassar o primeiro 1 milhão de casos (1.032.913, em 19/6). O segundo milhão veio logo depois. Entre abril e maio, o país saltou de 10 mil para 100 mil casos em quatro semanas; pois entre maio e junho, também em quatro semanas, o país saltou de 1 milhão para 2 milhões de casos (2.012.151, em 16/7).
No domingo (19), chegamos a 2.098.389 casos e 79.488 mortes.
3. UM GUIA SIMPLES, ÁGIL E CONFIÁVEL.
Para tentar descrever a dinâmica de uma pandemia, em qualquer escala geográfica (mundial, continental, nacional etc.), não basta examinar números absolutos nem fazer comparações arbitrárias (para um exemplo, ver aqui). O que necessitamos é de um guia. Um guia confiável, como um cão farejador a nos apontar o rumo que as coisas estão a tomar [4].
Desde março, quando comecei a acompanhar a pandemia em curso (ver aqui), adotei um cão farejador: a taxa de crescimento diário no número de novos casos. É um parâmetro simples e bastante ágil, visto que é extraído diretamente das estatísticas. E o mais importante: a julgar por todas as projeções até aqui bem-sucedidas (ver os vols. 1 e 2 da compilação ‘A pandemia e a lenta agonia de um país desgovernado’, aqui e aqui), é acessível e bastante confiável.
4. CALCULANDO A TAXA DE CRESCIMENTO.
Simbolizada aqui pela letra grega minúscula β [5], a taxa de crescimento tem sido definida como β = ln {Y(f) / Y(i)} / {t(f) – t(i)}, onde Y(f) é o número de casos no dia (f), Y(i) é o número de casos no dia (i), {t(f) – t(i)} é o intervalo transcorrido entre os dias (i) e (f), e ln indica logaritmo natural.
Refletindo o que se passa com as estatísticas, há muita oscilação no valor de β ao longo da semana. (A origem do problema está relacionada a certos desarranjos metodológicos, inerentes ao modo como as autoridades sanitárias coletam, organizam e divulgam as estatísticas.) Para contornar esses ruídos, eu passei a calcular também uma média semanal.
Quando os valores diários e as médias semanais de β são colocados em um gráfico (ver a Fig. 1), alguns padrões podem ser identificados.
O resultado mais evidente está a indicar que o cálculo da média semanal foi suficiente para remover os ruídos embutidos nos valores diários. (Examine a figura 1 e compare o alinhamento dos pontos correspondentes às médias semanais com o dos pontos correspondentes aos valores diários.)
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FIGURA 1. O comportamento da taxa de crescimento diário (pontos em rosa claro) no número de casos da Covid-19 em todo o país (eixo vertical; β expresso em porcentagem), entre 21/3 e 19/7. Há muita oscilação nos valores diários (refletindo inércia e desarranjos metodológicos). Para reduzir os ruídos de tal oscilação, calculei uma média semanal na taxa de crescimento (pontos em azul escuro). Os resultados (linha tracejada em azul escuro) são altamente significativos, indicando que a gradativa redução na taxa de crescimento (e.g., 4,3% ..., 3,1% ..., 1,7%) não foi um simples acidente de amostragem.
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Mas há mais. Examinando o comportamento das médias semanais, por exemplo, podemos inferir algumas coisas a respeito dos rumos que as coisas estão a tomar. Vejamos.
Em 31/5, após sete semanas oscilando entre 6% e 8% (11/4-24/5), eis que a média semanal da taxa de crescimento no número de novos casos em todo o país caiu para 5,1% (25-31/5). Era o menor valor desde o início da pandemia. De lá para cá, nós tivemos sete quedas sucessivas, quatro delas mais significativas – de 5,1% para 4,3%; de 4,3% para 3,3%; de 3,1% para 2,5% e de 2,2% para 1,7%.
Eis as quedas observadas nas últimas semanas: de 5,1% o valor caiu para 4,3% (1-7/6) e daí para 3,3% (8-14/6); de 3,3% caiu para 3,2% (15-21/6) e daí para 3,1% (22-28/6), 2,5% (29/6-5/7), 2,2% (6-12/7) e, por fim, para o 1,7% da semana passada (13-19/7).
5. POR QUE O VALOR DE β SEGUE A DECLINAR?
Quedas no valor de β são uma boa notícia, visto que toda e qualquer queda indica que a pandemia está a perder força. Além disso, o tamanho da queda (i.e., a diferença entre dois valores consecutivos) nos permite estimar a velocidade com que a pandemia estaria a perder força.
Os resultados referidos neste artigo são uma continuação e estão em conformidade com os resultados de artigos anteriores. Assim, ainda que em meio a diversos desarranjos metodológicos (responsáveis, entre outras coisas, pelas oscilações nos valores diários de β), o que a figura 1 está a mostrar são duas curvas em trajetórias nitidamente declinantes.
Trocando em miúdos, os valores de β estão sendo puxados para baixo, indicando que alguma coisa estaria a refrear a disseminação da doença.
O que seria esta alguma coisa? Como escrevi em artigo anterior, tenho alguns palpites, mas ainda não sei ao certo [6]. Em todo caso, o propósito deste artigo não é explicar o que se passa. A rigor, assim como em ocasiões anteriores (ver ‘A pandemia e a lenta agonia de um país desgovernado’, vol. 1 e vol. 2), as pretensões aqui seriam outras: oferecer um instantâneo da situação; costurar o instantâneo atual com os anteriores, tentando obter um quadro mais amplo da situação (Fig. 1); e, por fim, identificar padrões e sugerir generalizações que sejam minimamente consistentes (ver adiante).
6. PREMISSAS E PROJEÇÕES.
No que segue, retifico e detalho as projeções feitas em artigo anterior (ver aqui) a respeito dos números da pandemia em todo o país até o último domingo de agosto.
Para isso, adoto duas premissas – otimistas! – a respeito de dois parâmetros, a taxa de crescimento no número de novos casos e a taxa de letalidade.
Em primeiro lugar, vou admitir que, nas próximas seis semanas (20/7-30/8), os valores de β seguirão declinando a uma razão de –0,3% por semana. (Foi mais ou menos este o declínio médio computado nas últimas quatro semanas.) Assim, repetindo os valores usados no artigo anterior, os valores esperados para esta e para as próximas semanas seriam os seguintes: 1,6% (20-26/7), 1,3% (27/7-2/8) e assim por diante, até chegarmos a 0,1% (24-30/8).
Em segundo lugar, vou admitir que, nas próximas semanas, o valor da taxa de letalidade (TL) permanecerá constante e igual a 2,9% (média das últimas quatro semanas). Tal premissa difere da que adotei no artigo anterior, quando supus que o valor da TL seguiria uma trajetória declinante, a uma razão de –0,2% por semana. (A justificativa aqui, como eu já havia comentado antes, é que o valor da TL não tem declinado de modo tão regular como β.)
7. COLOCANDO AS PROJEÇÕES EM UM GRÁFICO.
Levando em conta as duas premissas acima, o total de casos no país deverá saltar de 2.098.389 para 2.992.530 (e não para os 3.033.726 previstos anteriormente) (ver Fig. 2).
Estimo ainda que, com uma taxa de letalidade de 2,9%, os casos adicionais previstos implicariam em mais 25.545 mortes. Chegaríamos assim a 105.033 mortes até 30/8. Este último número, claro, pode ser menor, caso a TL oscile para baixo. (Como pode ser maior, caso a TL oscile para cima.)
A figura 2 mostra as projeções para as próximas semanas. Se elas estiverem corretas, daqui para frente nós devemos observar um progressivo declínio nas estatísticas da pandemia, tanto no número de casos como no de mortes (não mostrado).
No que diz respeito ao número de casos, especificamente, os números esperados para as próximas seis semanas seriam os seguintes (total acumulado na semana [corrige as projeções feitas no artigo anterior] e a média aritmética diária [parâmetro não apresentado anteriormente]): 2.344.995 e 35.230 (para a semana encerrada em 26/7), 2.566.895 e 31.700 (2/8), 2.752.059 e 26.452 (9/8), 2.889.775 e 19.674 (16/8), 2.971.666 e 11.699 (23/8) e, por fim, 2.992.530 e 2.981 (30/8).
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FIGURA 2. Comparação entre os números de casos diários observados em todo o país (linha azul) vs. os números ajustados (linha vermelha). Como na figura 1, há muita oscilação de um dia para o outro nos números observados. Para minimizar o ruído, eu calculei uma média semanal (βSEMANAL) na taxa de crescimento diário no número de novos casos; usei então essa média para calcular os números ajustados dentro de cada semana [7]. A comparação vai de 23/3 a 19/7. Entre 20/7 e 30/8, a curva de números ajustados passa a exibir os números esperados. Estes foram calculados do mesmo modo como os números ajustados [7], respeitando-se a premissa citada no texto: a partir de 19/7, o valor de βSEMANAL diminui 0,3% por semana, declinando assim de 1,6% (20-26/7) a 0,1% (24-30/8).
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8. CODA.
Os números da pandemia estão em um patamar muito elevado, não há dúvida. Todavia, ao contrário do que alardeiam alguns observadores, as estatísticas não estão a escalar de modo desenfreado nem a pandemia está fora de controle.
Há uma luz no fim do túnel. Ainda que seja uma luz fraca e bruxuleante.
Saindo do túnel, temos de ir correndo para a estação ferroviária. O trem está atrasado, mas vai chegar. Resta ver se nós, brasileiros, estaremos lá, prontos e dispostos a embarcar. Ou se vamos perdê-lo, de novo...
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Notas.
[*] Para detalhes e informações sobre o livro mais recente do autor, O que é darwinismo (2019), inclusive sobre o modo de aquisição por via postal, faça contato pelo endereço meiterer@hotmail.com. Para conhecer outros livros e artigos, ver aqui.
[**] Tradução livre. No original: “Men who never have had the experience of trying, in the midst of an epidemic, to remain calm and keep experimental conditions, do not realize in the security of their laboratories what one has to contend with” – extraído do capítulo 36 do livro.
[1] Um bom exemplo de material informativo a respeito dos aspectos médicos da doença: a entrevista com o pneumologista russo Aleksandr Chuchalin. Eis um resumo da entrevista:
A evolução da infecção pelo tipo de coronavírus denominado SARS-CoV-2 pode chegar a apresentar quatro fases distintas. A primeira fase assemelha-se a um resfriado comum, com coriza, mal-estar e estado subfebril. Justamente por ela não ser distinguível de um resfriado comum, a medicina ocidental não leva esta fase em conta, caracterizando a infecção por coronavírus apenas a partir da segunda fase (a da tosse e febre).
A segunda fase já é a da pneumonia. Ao contrário das gripes e resfriados, em que a tosse não é nada demais, nos casos de infecção por coronavírus a presença de tosse significa que as células epiteliais que revestem todo o trato respiratório inferior (desde a traqueia até os alvéolos pulmonares) estão sendo danificadas — e isso já é a pneumonia. [...]
A terceira fase, a da falta de ar, é a do agravamento da pneumonia, quando passa a ser necessária hospitalização para ventilação mecânica (intubação).
E a quarta fase é a da septicemia, com grave risco de morte.
Publicada no sítio Outras Palavras, em 17/3, a entrevista completa pode ser lida aqui.
[2] Em 2002-2003, outro coronavírus (SARS-CoV) já havia provocado uma epidemia de síndrome respiratória aguda grave (SARS, na sigla em inglês). A pandemia atual seria o terceiro caso em 20 anos de transbordamento (spillover, na terminologia em inglês) envolvendo um coronavírus capaz de infectar seres humanos. O termo é usado quando um patógeno (vírus, bactéria etc.) transborda de um hospedeiro para outro, o que em geral ocorre via consumo (e.g., o novo hospedeiro se alimenta ou passa a se alimentar do antigo). Estudos e alertas a respeito do fenômeno não são novos nem são raros – ver A próxima peste (Nova Fronteira, 1995), de Laurie Garrett; para detalhes técnicos, ver Microbiologia de Brock (Artmed, 2010, 12ª ed.), de M. T. Madigan et al.; para uma revisão recente, ver Plowright, R. K. et al. 2017. Pathways to zoonotic spillover. Nature Reviews Microbiology 15: 502-10.
[3] Em termos de disseminação, nós devemos distinguir entre endemias e epidemias. Diz-se que uma doença infecciosa é endêmica quando a sua manifestação é recorrente, mas de alcance limitado, ficando restrita a um dado local ou região. Se a disseminação da doença ultrapassa os limites habituais, falamos então em epidemias. Uma epidemia de alcance mundial, como é o caso da Covid-19, é referida como pandemia. Cerca de 2 milhões de seres humanos morrem todos os anos em razão e alguma doença infeciosa. Na maioria das vezes, a doença é endêmica, típica de regiões ou países podres. Muitas delas estão fora do radar das grandes companhias farmacêuticas. Afinal, se não há garantia de ganhos expressivos (e não há, visto que os portadores da doença são pobres), não haveria razão (do ponto de vista dessas companhias) para investir em pesquisa visando a obtenção de vacinas ou qualquer medicação contra tais doenças. Sobre o impacto das zoonoses (a maioria dos patógenos que causam doenças em seres humanos é de origem zoonótica), ver Taylor L. H. et al. 2001. Risk factors for human disease emergence. Philosophical Transactions of the Royal Society of London B 356: 983-89.; e sobre doenças esquecidas, ver Pisarski, K. 2019. The global burden of disease of zoonotic parasitic diseases: Top 5 contenders for priority consideration. Tropical Medicine and Infectious Disease 4 (1): doi:10.3390.
[4] Há mais de um jeito de monitorar epidemias, assim como há mais de um jeito de monitorar a dinâmica de populações. Para uma introdução ao assunto, ver Begon, M. et al. 2007. Ecologia, 4ª ed. Porto Alegre, Artmed.
[5] A taxa de crescimento não é uma constante, de sorte que o valor de β pode oscilar de um dia para o outro. Se a oscilação é de cima para baixo, dizemos que o parâmetro declinou; se é de baixo para cima, dizemos que o parâmetro escalou. Caso não haja oscilação ou caso a oscilação seja inexpressiva, rotulamos momentaneamente o valor de estacionário.
[6] Há mais de uma hipótese explicativa. Uma delas, defendida por um amigo de longa data que já trabalhou com a dengue durante muitos anos, seria a exaustão dos susceptíveis. Implicaria dizer, entre outras coisas, que as populações são heterogêneas, de tal modo que nem todos os indivíduos representam hospedeiros igualmente apropriados para o patógeno. Uma segunda hipótese, de alcance mais limitado, seria a imunização coletiva (ou i. de rebanho), que tem sido evocada para explicar a situação em cidades ou regiões que foram ‘arrasadas’ pela pandemia (e.g., Manaus). Uma terceira hipótese argumenta que as medidas de mitigação (e.g., o distanciamento espacial, o uso generalizado de máscaras faciais e a higienização frequente das mãos), ainda que adotadas de modo mais ou menos frouxo, estariam a dificultar a disseminação do vírus. Esta hipótese ajudaria a explicar não só o arrefecimento da pandemia em terras brasileiras, mas também o não arrefecimento nos EUA, sobretudo naqueles estados e cidades estadunidenses onde os governantes criticaram (ou ainda estão a criticar) o uso de máscaras. Não custa repetir: o uso correto de máscaras faciais reduz de maneira significativa a transmissão do SARS-CoV-2, sobretudo em espaços fechados – e.g., Prather, K. A. et al. 2020. Reducing transmission of SARS-CoV-2. Science 368: 1422-4. Além disso, não devemos (ou não podemos – ver aqui e aqui) esperar pela chegada de vacinas. Afinal, a adoção combinada de medidas não farmacológicas (e.g., distanciamento social e o uso de máscaras faciais) pode ser efetiva a ponto de inibir ou bloquear a disseminação do vírus – ver a figura 3; para uma análise técnica, ver Chu, D. K. et al. 2020. Physical distancing, face masks, and eye protection to prevent person-to-person transmission of SARS-CoV-2 and COVID-19: a systematic review and meta-analysis. Lancet 395: 1973-87.
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FIGURA 3. Um modelo de como o uso de máscaras faciais e o distanciamento espacial podem estar a inibir a disseminação do SARS-CoV-2. Considere três caixas de paredes rígidas, dentro das quais nós colocamos um par de esferas de igual diâmetro. Cada esfera representa um indivíduo; as esferas grandes representam indivíduos desprovidos de máscaras e as pequenas, indivíduos providos de máscaras; colisões resultam em disseminação do vírus. As chances de colisão dentro de cada caixa variam em razão de dois fatores principais: o tamanho e o padrão de movimentação das esferas. O número de colisões aumenta (muito) com o diâmetro das esferas, razão pela qual as chances de colisão são (bem) maiores em A do que em B. E as colisões são mais frequentes quando as esferas se movimentam (indistintamente) por todos os setores da caixa, razão pela qual as chances de colisão são maiores em B do que em C.
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[7] O primeiro dia de cada semana foi sempre uma segunda-feira e o último, o domingo seguinte. Um primeiro exemplo. A média da semana 13-19/7 foi computada da seguinte maneira: βSEMANAL = ln {Y(f) / Y(i)} / {t(f) – t(i)}, onde Y(f) é o número de casos no último dia da semana em questão (19/7), Y(i) é o número de casos no último dia da semana anterior (12/7), {t(f) – t(i)} é o intervalo (7 dias) transcorrido entre 12 e 19/7, e ln indica logaritmo natural. Em números: sabendo que Y(19/7) = 2.098.389 e Y(12/7) = 1.864.681, fazemos β(13-19/7) = ln (2.098.389 / 1.864.681) / 7 = ln (1,12533...) / 7 = 0,1180799 / 7 = 0,01686... Para expressar este valor como um percentual, aplicamos (e0,01686 – 1) x 100 = 1,70116... ≈ 1,7%. Um segundo exemplo. Sabendo que Y(5/7) = 1.603.055, podemos aproveitar o exemplo anterior para calcular β(6-12/7). Para tanto, fazemos: β(6-12/7) = ln (1.864.681 / 1.603.055) / 7 = ln (1,1632...) / 7 = 0,15117... / 7 = 0,02159... Em percentual, este valor equivaleria a ~2,18%. Para mais exemplos de como calcular o valor de β, ver aqui ou aqui. Os números ajustados. A média semanal foi então usada para ajustar os valores ao longo da semana. Foi um ajuste retrospectivo, tendo como ponto de partida o número de casos correspondente ao domingo da semana anterior. Tomemos como exemplo a semana 13-19/7, cujo βSEMANAL = 0,01686. Em primeiro lugar, fazemos: Y(13/7) = Y(12/7) x e0,01686, Y(14/7) = Y(13/7) x e0,01686, Y(15/7) = Y(14/7) x e0,01686, e assim por diante, até Y(19/7). Em seguida, os números ajustados de casos para cada dia da semana foram calculados por meio de uma série de subtrações, a saber: Y(13/7) – Y(12/7), para o dia 13; Y(14/7) – Y(13/7), para o dia 14; Y(15/7) – Y(14/7), para o dia 15; e assim sucessivamente. Em números, sabendo que Y(12/7) = 1.864.681, fazemos Y(13/7) = 1.864.681 x e0,01686 = 1.864.681 x 1,01701... ≈ 1.896.402. De modo semelhante, obtemos Y(14/7) = 1.896.402 x 1,01701... ≈ 1.928.663; Y(15/7) = 1.928.663 x 1,01701... ≈ 1.961.473, e assim por diante. Por fim, os números ajustados para cada dia (arredondados para o inteiro mais próximo) seriam: 1.896.402 – 1.864.681 = 31.721, para o dia 13; 1.928.663 – 1.896.402 = 32.261 (14); 1.961.473 – 1.928.663 = 32.810 (15); e assim por diante. Ao final, os números obtidos foram então utilizados na confecção da linha vermelha da figura 2.
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